Aumentam controvérsias religiosas em campanha presidencial dos Estados Unidos – Por Scott Shepard e Ken Herman
O envolvimento do candidato presidencial democrata Barack Obama com um pastor exaltado é apenas a mais recente dentre um número incomum de controvérsias religiosas presenciadas até o momento na disputa de 2008 pela Casa Branca.
Na campanha presidencial de 2008, a religião foi o foco das atenções como em poucas ocasiões anteriores, com os democratas procurando reduzir a "lacuna de Deus", o republicano John McCain tentando se redimir perante a base evangélica do Partido Republicano, Mitt Romney ambicionando ser o primeiro presidente mórmon do país e um pastor batista, Mike Huckabee, sobrevivendo mais do que se esperava na disputa republicana devido ao apoio dos cristãos evangélicos. O tipo de política presidencial de 2008, baseada na fé, fez com que alguns políticos antigos sugerissem que pode ser o momento de se acabar com o debate político impregnado de religião.
"Acho que deveríamos parar com tanta discussão sobre políticas públicas baseadas em crenças religiosas" diz Roy Romer, ex-governador do Colorado, que foi diretor-geral do Comitê Nacional Democrata (DNC, na sigla em inglês) de 1997 a 2000. "Temos que ter cuidado com o fanatismo religioso". Mas poucos no Partido Democrata prestaram atenção no conselho de Romer, neste momento em que o partido tenta estreitar aquilo que é descrito por muitos como a "lacuna de Deus" entre democratas e republicanos, especialmente após a eleição de George W. Bush para a Casa Branca, em parte com base na força dos chamados "values voters" (eleitores que votam baseados em valores morais religiosos). De fato, na campanha pela indicação presidencial democrata de 2008, Obama e Clinton têm falado sobre a profunda influência que a fé pessoal teve na formação de suas políticas progressistas, de forma muito mais freqüente do que os candidatos de disputas democratas anteriores. Foram os vínculos religiosos de Obama que o conduziram ao centro da atual polêmica sobre alguns comentários anti-americanos incendiários nos sermões proferidos pelo reverendo Jeremiah Wright, o antigo pastor da igreja afro-cêntrica Trinity United Church of Christ, que Obama freqüentou durante mais de duas décadas. Porém, mesmo antes que irrompesse a controvérsia relativa a Wright, Obama professou com freqüência a fé cristã, indo algumas vezes um passo além ao declarar que "os secularistas estão errados quando pedem aos crentes que deixem a religião na porta de entrada antes de ingressarem no espaço público". Similarmente, em um fórum no verão do ano passado patrocinado pela organização evangélica liberal Sojourners/Call to Renewalk, Hillary Clinton defendeu a "inserção da fé na política". Muito antes do relacionamento de Obama com Wright criar uma tempestade política, Hillary Clinton chamou atenção no início da sua campanha ao contratar Burns Strider, um estrategista especializado em conquistar os eleitores que votam com base em valores morais religiosos, como diretor de operações baseadas na fé, e adotar agenda de idéias de seis páginas produzida por Strider para os membros do Comitê de Coordenação de Fé da sua campanha.
A agenda destacou "a intensidade metodista da família e da infância" de Hillary Clinton, a forma como os princípios da Igreja Metodista foram "a luz-guia" da vida da senadora, como ela "aprendeu o valor e o poder da oração" em tenra idade, como a sua fé é "profundamente pessoal e real" e como ela muitas vezes encontra "inspiração nas Escrituras". A atenção provocada pela fé religiosa de Hillary Clinton atingiu o seu ápice no fórum da Sojourners, quando lhe perguntaram como ela lidou com os seus problemas conjugais e com o escândalo sexual envolvendo Monica Lewinsky, que quase acabaram com a presidência do seu marido, Bill Clinton. "Eu tinha um embasamento na fé que me deu a coragem e a força para fazer o que achei que era o certo, independentemente do que o mundo pensasse", respondeu ela, acrescentando que o sucesso em superar aquele período deveu-se à "grande família de fé" que veio em seu socorro espiritual. Subseqüentemente, na edição de setembro de 2007, a revista liberal "Mother Jones" descreveu essa "família de fé" de Hillary Clinton como sendo uma confederação de "círculos conservadores de orações e estudo da Bíblia que fazem parte de um grupo secreto do Congresso conhecido como 'The Fellowship' ('A Sociedade')", uma conexão que foi abordada novamente nesta semana em um artigo com o título "Hillary's Nasty Pastorate" ("O Pastorado Asqueroso de Hillary") na "The Nation", uma revista liberal que apóia Obama. O grupo incluiria políticos conhecidos da direita como os ex-procuradores-gerais Ed Meese e John Ashcroft, o ex-senador da Pensilvânia, Rick Santorum, e os senadores Sam Brownback, do Kansas, e James Inhofe, de Oklahoma.
McCain irritou a base evangélica do Partido Republicano quando disputou a indicação republicana em 2000 com Bush, e chamou os pastores Jerry Falwell e Pat Robertson de "agentes da intolerância". Conseqüentemente, na sua outra tentativa de conquistar a indicação neste ano, ele tem procurado aproximar-se da direita religiosa e também tem contribuído com a sua dose de polêmica nesta área. O comitê de campanha de McCain está se empenhando em distanciar o candidato da retórica anti-muçulmana inflamada de Rod Parsley, um pastor de Ohio que controla uma mega-igreja e que prega na televisão. Parsley apóia o senador e apareceu junto a ele em um comício em Cincinnati no mês passado. Naquela ocasião, uma semana antes da eleição primária de Ohio, McCain elogiou Parsley como sendo um "guia espiritual". O comitê de campanha, preocupado com a retórica incendiária de Parsley, explica agora que o pastor não é nem nunca foi o guia espiritual de McCain, que freqüenta a Igreja Batista do Norte de Phoenix. Parsley usa o púlpito, livros, a televisão e a sua presença mundial na Internet para combater o islamismo, rotular a Europa de "uma vala sem Deus" e criticar o sistema de assistência social sob o qual "nascimentos fora do casamento são generosamente recompensados, enquanto as mulheres moralmente puras são penalizadas".
Parsley não discursou no comício de McCain em Cincinnati, mas mais tarde disse aos jornalistas que McCain não é o candidato perfeito para os evangélicos, sendo, entretanto, o melhor que está disponível. "Quando colocamos John McCain ao lado de Hillary Clinton e de Barack Obama, as diferenças ideológicas e filosóficas são gritantes", afirmou Parsley. Ele recomendou aos eleitores que votassem em McCain por este ser um "conservador forte, sincero e consistente". Apesar deste apoio, no site de McCain não há menção a Parsley. Na sua página de campanha, a única referência encontrada ao se fazer uma busca por "parsley" (que em inglês quer dizer "salsa") está incluída em uma receita de Cindy McCain para o preparo de espaguete de trigo integral com lagostins. O empenho do comitê de campanha do senador em distanciar o candidato de Parsley aconteceu após uma ação similar, depois que McCain recebeu o apoio do pastor John Hagee, do Texas, que chamou a Igreja Católica de "a grande prostituta" e "um sistema falso de culto". McCain declarou aos repórteres: "Quando (Hagee) me apóia, isto não significa que eu concorde com tudo o que ele defende e no que acredita. Repudio quaisquer comentários, incluindo os do pastor Hagee, caso estes sejam anti-católicos ou ofensivos aos católicos".
O comitê de campanha de McCain recusou-se a tecer comentários sobre declarações específicas de Parsley, incluindo uma passagem no seu livro de 2005, "Silent No More" (algo como "Chega de Silêncio"), na qual ele menciona "uma guerra entre o islamismo e a civilização cristã", uma guerra que, segundo ele, tem que ser concluída com a destruição do islamismo, que ele rotulou de "religião contrária a Cristo".
"O fato é que os Estados Unidos foram fundados, em parte, com a intenção de que essa falsa religião fosse destruída, e eu acredito que o 11 de setembro de 2001 foi um chamado de uma geração às armas, que não podemos mais ignorar", escreveu Parsley. O comitê do senador minimiza o vínculo McCain-Parsley, alegando que os dois encontraram-se pela primeira vez nas semanas que antecederam a eleição primária de Ohio, e que, ao todo, não se reuniram mais de quatro vezes. O comitê rejeita as tentativas de se passar a impressão de que Parsley é o guia espiritual de McCain. Os seus assessores dizem que o comentário "guia espiritual" tinha um sentido genérico, e não pessoal. Gene Pierce, porta-voz de Parsley, afirmou: "Essa relação é relativamente recente, tendo ocorrido nas últimas semanas da campanha pela eleição primária de Ohio". A versão de Pierce a respeito de Parsley ser supostamente o guia espiritual de McCain difere um pouco da explicação fornecida pelo comitê de campanha do senador.
"O discurso de apresentação do senador McCain em um comício em Ohio foi muito instrutivo, mostrando que o senador inclui o pastor Parsley na lista de seus guias, mas que ele não é o seu único guia", disse Pierce. "O senador McCain afirmou: 'Sinto-me muito honrado hoje por ter ao meu lado um dos verdadeiros grandes líderes dos Estados Unidos, uma bússola moral, um guia espiritual". Pierce disse que McCain jamais participou de um culto da Igreja World Harvest, de Parsley. Apesar dos esforços do comitê no sentido de marcar uma importante distinção entre ser "um" guia espirital e "o" guia espiritual de McCain, essa associação tem sido feita pelos detratores do senador republicano. Clipes no YouTube de alguns dos comentários mais polêmicos de Parsley foram publicados com comentários que o identificam incorretamente como o "guia espiritual anti-gay de McCain" e "o guia espiritual de John McCain". Um outro vídeo publicado no YouTube questiona, "Por que a mídia não fala sobre o assessor espiritual de McCain?".
Dois candidatos republicanos que agora estão fora da disputa, Romney e Huckabee, tiveram de lidar com questões religiosas envolvendo eles próprios, e não os seus assessores espirituais. Como mórmon, Romney, ex-governador de Massachusetts, admitiu que teve de superar os preconceitos das pessoas contra a sua religião. Para Huckabee, ex-pastor batista que também foi governador de Arkansas, a sua religião rendeu-lhe votos entre muitos evangélicos, garantindo-lhe vitórias em diversas primárias, mas também o atrapalhou, porque muita gente ficou preocupada com a possibilidade de um ex-clérigo ocupar a Casa Branca. Ele usou muitas vezes o humor para afastar as preocupações quanto ao seu passado religioso, recordando que um eleitor de Arkansas certa vez lhe perguntou se ele era "um daqueles pregadores batistas obtusos que acreditam que apenas os batistas irão para o céu". "Sou ainda mais obtuso que isso", respondeu Huckabee. "Não acredito sequer que todos os batistas irão para o céu".
Fonte: http://www.coxnews.com/
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