Mapas digitais ajudam historiadores a enxergar o passado - Por Patricia Cohen

Poucas vezes na história uma batalha foi estudada tão detalhadamente quanto a de Gettysburg, três dias cheios de sangue em julho de 1863 que representaram a virada na Guerra Civil americana. E ainda restam perguntas.


O que, por exemplo, o general Robert E. Lee viu de fato quando deu as ordens que fizeram a maré virar contra o exército confederado? Agora os historiadores contam com uma ferramenta nova, que pode ajudar. Uma nova geração de mapas digitais deu lugar a um campo acadêmico chamado de humanidades espaciais.


Historiadores, teóricos literários, arqueólogos e outros vêm usando o Geographic Information Systems, um software que exibe e analisa informações relacionadas a um local físico, como a região do "Dust Bowl" nos Estados Unidos, devastada por tempestades de areia durante a Grande Depressão, ou as tavernas do bairro londrino de Eastcheap, cenário das farras de Falstaff, personagem que aparece em peças de Shakespeare.


"O mapeamento de informações espaciais permite que você veja padrões e informações que são literalmente invisíveis", disse Anne Kelly Knowles, geógrafa do Middlebury College, no Vermont. Além disso, ele acrescenta camadas de informações a um mapa, que podem ser tiradas ou adicionadas de várias maneiras. Com o clicar de um mouse é possível ver o mesmo lugar ao longo do tempo.


Hoje as pessoas que vão a Gettysburg podem subir até a cúpula do seminário luterano onde o general Lee estava posicionado em 2 de julho, o segundo dia dos combates; ou passar pela elevação de Seminary Ridge, onde, no dia seguinte, Lee assistiu a milhares de seus homens avançando por campos agrícolas abertos para morrer na notória Investida de Pickett.


Com o passar do tempo, porém, o lugar ganhou o acréscimo de uma pedreira, um reservatório e várias árvores e plantas diferentes; mesmo as elevações mudaram em decorrência da erosão e aragem.


O Geographic Information Systems, ou GIS, permitiu que Knowles e seus colegas recriassem uma versão digital do campo de batalha original a partir de mapas históricos, descrições de posições das tropas e ilustrações de estradas, cercas, construções e vegetação históricos. Knowles explicou: "A única maneira que eu conhecia de responder à pergunta" sobre o que Lee viu "foi recriar o terreno digitalmente, usando o GIS, e então perguntar ao programa GIS: 'O que dá para ver desde uma determinada posição na paisagem digital e o que não dá?'."


Os líderes militares do século 19 dependiam principalmente de seus próprios olhos, e pequenas diferenças de elevação eram estrategicamente importantes. "Lee provavelmente não pôde enxergar o enorme contingente de forças federais que se acumulou no lado oriental do campo de batalha no segundo dia, durante o famoso ataque ao Little Round Top", disse Knowles.


O tenente-coronel James Longstreet foi criticado dentro das forças confederadas por sua decisão, em 2 de julho, de levar suas tropas em uma longa contramarcha, para evitar que elas fossem detectadas, em vez de atacar Little Round Top. Mas não havia maneira de ele ter visto que a região de Little Round Top estava indefesa. No momento, Anne Knowles trabalha em mapas digitais das conquistas territoriais dos nazistas e dos campos de concentração.


Geoff Cunfer, historiador da Universidade de Saskatchewan, fez uma revisão do Dust Bowl dos anos 1930 nos Estados Unidos, analisando dados dos 208 condados no Texas, Novo México, Colorado, Oklahoma e Kansas que foram afetados, um projeto que teria sido impossível sem este sistema.


Ele constatou que a explicação tradicional, segundo a qual as tempestades de areia foram causadas pela aragem extensiva da terra sem cuidado com as limitações ambientais, aplica-se apenas em alguns lugares. Condados que mal foram arados também sofreram a praga das tempestades de areia. Usando relatórios de precipitação anual, secas, direção dos ventos, censos agrícolas e relatórios sobre tempestades de areia, ele criou conjuntos de dados que podem ser marcados em mapas.


Cunfer constatou que tempestades de areia ocorriam regularmente no século 19 e eram parte da ecologia das pradarias antes de as terras serem aradas, mas sua ocorrência "não foi divulgada". David Bodenhamer, historiador da Universidade de Indiana, disse que a "virada espacial permite perguntas novas: 'Por que algo aconteceu aqui e não em outro lugar? O que há de especial aqui?'".

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