Monges reconstroem mosteiro espanhol na Califórnia - Por Norimitsu Onishi e Max Whittaker
O renascimento de um mosteiro
medieval cisterciense aqui em uma área rural do norte da Califórnia era, é
claro, improvável.
William Randolph Hearst, o magnata de jornais, comprou o
mosteiro desmontado de Santa Maria de Óvila da Espanha, mas não conseguiu restaurá-lo.
A cidade de San Francisco, após algumas tentativas de trazer o mosteiro de
volta à vida, deixou suas pedras por décadas no Golden Gate Park. A Grande
Depressão, a Segunda Guerra Mundial e a letargia ficaram em seu caminho.
Mas a ordem cada vez menor e mais
velha de monges cistercienses realizou o que grandes homens e cidades não
conseguiram: a reconstrução do prédio de arquitetura mais significativa de
Santa Maria de Óvila, uma sede gótica do século 12. Os monges atribuíram a
restauração à sua fé, apesar de anos de arrecadação tenaz de fundos e uma
recente aliança com uma cervejaria local terem ajudado.
"O significado disso para
nós é de um elo com a esperança, que pode levar gerações", disse o padre
Paul Mark Schwan, o abade do mosteiro New Clairvaux, sobre a restauração.
"O que parecia morto, ou quase morto, se ergue de novo." Com a conclusão de grande parte
das obras, a sede foi aberta ao público no ano passado.
"Nós temos a posse das
pedras e elas voltaram para casa, longe da Espanha, mas de volta a terras
cistercienses com monges cistercienses as devolvendo a um espaço sagrado",
disse Schwan em uma recente tarde fria, em pé sob uma das entradas em arco, com
sua voz ecoando nas paredes de pedra calcária e tetos abobadados. "Eu olho
para isto e é notável termos chegado tão longe, tudo isto ter sido de fato
remontado."
Com dois terços das pedras
originais e reforços modernos resistentes a terremotos, a sede de Óvila agora
fica, talvez de modo incongruente, em um campo aberto próximo da igreja modesta
da abadia e dos vinhedos, há duas horas ao norte de Sacramento.
Foi em 1.167 que o rei Afonso 8º
de Castela fundou Santa Maria de Óvila, na província de Guadalajara, uma área
que ele tinha reconquistado dos mouros e que esperava povoar com colonos cristãos.
Por séculos, o mosteiro prosperou como lar dos monges cistercienses, uma ordem
católica romana que seguia a Regra de São Bento do século 6, e sua ênfase em
autossuficiência, trabalho manual e oração.
Mas o mosteiro entrou em declínio
e quando foi fechado pelo governo espanhol em 1835, só restavam quatro monges.
O mosteiro começou a ficar em ruínas, a sede estava sendo usada como depósito
de estrume e foi esquecido até chamar a atenção de Arthur Byne, o marchand de
Hearst, em 1930.
Hearst, o magnata de jornais que
inspirou "Cidadão Kane", já tinha construído o Castelo Hearst na
Costa Central da Califórnia, completo com a fachada de um antigo templo romano,
que ele comprou na Itália para a Piscina Netuno de seu imóvel. Mas Hearst
queria construir algo ainda maior perto do Monte Shasta, na floresta a
aproximadamente 190 quilômetros ao norte de Vina, onde a casa de verão de sua
mãe, chamada Wyntoon, tinha sido recentemente destruída por um incêndio.
Hearst queria construir um
castelo medieval de oito andares de frente para o Rio McCloud, e partes do
mosteiro espanhol ficariam perfeitas nele. Segundo a revista "American
Heritage", agricultores e trabalhadores espanhóis dos vilarejos próximos
foram contratados para desmontar e transportar as edificações mais importantes
do mosteiro. Foram construídos trilhos de trem, estradas e uma ponte para o
transporte das pedras imensas. No final, 11 navios contendo grande parte do
mosteiro chegaram a San Francisco.
Mas Hearst, cuja fortuna foi
prejudicada pela Depressão, no final abandonou o projeto e doou o mosteiro para
San Francisco. Os planos da prefeitura de usá-lo como parte de um museu de arte
medieval no Golden Gate Park não deram em nada. Os caixotes contendo as pedras
pegaram fogo no parque algumas vezes e as pedras foram abandonadas ao relento.
Em 1979, uma historiadora da
arte, Margaret Burke, participou da última tentativa de San Francisco de
restaurar o mosteiro. Por quatro anos, Burke inspecionou as pedras para
determinar o que poderia ser salvo.
"Eu descobri que a sede era
o único prédio que seria viável de ser reconstruído", lembrou Burke. Mas a
prefeitura não conseguiu levantar o dinheiro para o projeto.
Por décadas, os monges daqui
assistiram a situação em crescente desespero. A sede serve como coração da
abadia, o local onde os monges se reúnem diariamente para leituras e reuniões.
Além disso, a arquitetura cisterciense, em sua simplicidade e austeridade, era
um reflexo da fé da ordem.
"Nossa arquitetura era
considerada parte de nossa oração e ainda é", disse Schwan. "Não é a
apenas a importância do prédio. Ele expressa a visão do que desejamos em nosso
relacionamento com Deus."
Após anos de lobby, os monges em
1994 persuadiram San Francisco a lhes dar as pedras, sob a condição de que
dariam início ao trabalho de restauração em uma década.
Não foi fácil. Como outras
abadias cistercienses nos países desenvolvidos, esta estava perdendo membros.
Quando Schwan, atualmente com 56 anos, entrou para o mosteiro aqui em 1980,
havia 35 a 37 monges. Agora há 22, com metade deles com 80 anos ou mais.
"Quando entrei, havia duas
pessoas enterradas no cemitério", ele disse. "Atualmente temos 16 ou
17 no cemitério. Eu ajudei a enterrar cada um desses monges, com exceção de
um."
Os operários deram início à
reconstrução em 2004 e os monges acabaram conseguindo arrecadar US$ 7 milhões
para o projeto. Há dois anos, os monges também se uniram à Sierra Nevada
Brewing, na vizinha Chico, para produzir uma série de cervejas premium estilo
trapista chamadas Óvila. Para baixar os custos, os monges optaram por comprar
pedra calcária do Texas em vez da Europa para complementar as pedras originais.
Apesar dos monges estarem
trabalhando para levantar US$ 2 milhões adicionais para dar os toques finais na
restauração, eles já podem usar a sede da forma como seus antecessores
espanhóis faziam.
Esse não foi o destino do outro
mosteiro cisterciense do século 12 que Hearst, um colecionador voraz, desmontou
e trouxe da Espanha em 1925. Esse mosteiro, São Bernardo de Clairvaux, acabou
acumulando poeira em um depósito no Brooklyn por causa do declínio da fortuna
de Hearst.
Após a morte de Hearst em 1951, as pedras de São Bernardo de
Clairvaux mudaram de mãos algumas vezes antes de irem parar em North Miami
Beach, onde os prédios remontados do mosteiro atualmente servem como uma
paróquia episcopal e atração turística.
Fonte: http://noticias.uol.com.br
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