Exposição em São Petersburgo foca nos primórdios da cultura europeia
Possível graças ao trabalho conjunto de especialistas alemães e russos, uma mostra sem paralelos conta, através de 1.700 objetos da Idade do Bronze, o surgimento da civilização europeia.
A chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, obteve uma vitória moral durante sua visita à exposição Idade do Bronze: Europa sem fronteiras, em São Petersburgo. Ela encontrou as palavras exatas para louvar o trabalho de especialistas russos e alemães e, ao mesmo tempo, deixar clara a posição da Alemanha na disputa com a Rússia pela posse de grande parte dos objetos expostos.
A exposição conta com cerca de 600 objetos levados da Alemanha pelas tropas soviéticas depois da Segunda Guerra Mundial. Entre eles está o Tesouro de Eberswalde, o maior conjunto de objetos de ouro da Pré-História já encontrado na Alemanha e que foi descoberto em 1913 na cidade alemã de Eberswalde.
"Somos da opinião de que essas peças devem voltar para a Alemanha e vamos continuar debatendo o assunto", disse a chanceler federal na abertura da exposição, em 21 de junho, causando um visível desconforto no presidente russo, Vladimir Putin. "Mas é um grande prazer ver essas peças reunidas aqui", continuou Merkel, louvando o trabalho dos curadores.
A exposição é o resultado de cinco anos de cooperação entre cientistas do Museu de História e Pré-História de Berlim, do Museu Hermitage de São Petersburgo e do Museu Pushkin de Moscou. Só o fato de os diretores dos dois museus russos terem dado sinal verde para os pesquisadores já causou sensação, pois nos depósitos desses museus estão guardados, há sete décadas, milhares de objetos em disputa por serem espólio de guerra.
O Início da Cultura Europeia
O resultado da cooperação é uma espetacular exposição sobre história da arte. Numa área de mil metros quadrados do Heremitage, três seções dispostas em ordem cronológica contam a história do surgimento da civilização europeia.
Ela começa com a Idade do Cobre, no século 4 a.C., numa vasta área que ia do Oceano Atlântico até os Montes Urais. A partir da segunda metade do século 3 a.C. (as Idades do Bronze Inicial e Média) evolui para a Idade do Bronze propriamente dita, alcançando seu apogeu nos séculos 2 e 1 a.C.
Na exposição em São Petersburgo, pode-se perceber paralelos e semelhanças, mas também peculiaridades das culturas regionais.
Apesar da sobriedade da exposição (todos os objetos estão expostos em vitrines de vidro), há um forte caráter emocional na mostra. Algumas das peças, e sobretudo as histórias sobre poder, religião e culto e também sobre a vida cotidiana dos antepassados europeus que elas contam, são fascinantes.
É o caso das joias de ouro encontradas nas regiões de Eberswalde e Potsdam, perto de Berlim; dos vasos decorados da cultura de Maikop, achados no norte do Cáucaso; e dos ídolos místicos de Galich, encontrados a 500 quilômetros a nordeste de Moscou; ou ainda exemplares da cultura da cerâmica cordada ou da cultura das ânforas globulares oriundos das culturas do Volga e do Fatjanovo-Balanovo.
Também tesouros de prata da Bacia dos Cárpatos e armas e joias do Tesouro de Príamo, encontrado pelo arqueólogo alemão Heinrich Schliemann, podem ser admirados.
Um dos destaques da exposição são os chamados lurs, instrumentos musicais de sopro de até 1,80 metro de comprimento e mais de três mil anos de idade. Alguns foram encontrados na cidade de Daberkow, no norte da Alemanha, e outros nos pântanos dinamarqueses. É fascinante observar esses instrumentos dos primórdios da história da música e imaginar que som eles eram capazes de produzir.
Também uma coleção de espadas pode ser admirada. As antigas armas são um testemunho das cerimônias de consagração de espadas, um ritual do final da Era do Bronze muito comum em diversas partes da Europa.
Sem Paralelo
Polêmicas à parte, não se deve esquecer que cerca de 1.100 dos 1.700 objetos expostos em São Petersburgo vêm de coleções e escavações russas, e que uma exposição como essa só é possível porque se privilegiou o significado histórico e cultural dos objetos e não a sua origem.
"Que eu saiba e eu sou arqueólogo e especialista em Idade do Bronze, nunca houve uma mostra como essa", disse o professor Hermann Parzinger, presidente da Fundação do Patrimônio Cultural Prussiano. "Pela primeira vez é exposta a evolução de todo o continente europeu, do século 4 a.C. até o século 1 a.C. Isso é algo extraordinário", afirmou.
Outro mérito da exposição é colocar lado a lado peças separadas por guerras e hoje distribuídas pelos museus de Berlim, Moscou e São Petersburgo, como é o caso do Tesouro de Eberswalde e do Tesouro de Príamo. Isso cria a esperança de que, também no mundo dos museus, um dia peças separadas pelo curso da História possam de novo estar reunidas.
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