A esquerda evangélica – Por Ancelmo Góes
A face mais visível do
protestantismo na política brasileira é a conservadora bancada evangélica no
Congresso, que ataca, custe o que custar, a descriminalização do aborto e a
legalização do casamento gay.
Mas o que pouco se fala é que existem, há tempos,
evangélicos de esquerda. Gente que, durante a ditadura militar, se declarava
comunista e participava da luta armada, e que hoje defende o que os
conservadores combatem.
O historiador Zózimo Trabuco, de 31 anos, estuda o
assunto para a sua tese de doutorado na UFRJ: “A expressão política da
esperança: Protestantismos, esquerdas e transição democrática.”
Na semana em
que Marina Silva, evangélica da Assembleia de Deus, levou um balde de água fria
com o veto do TSE à criação do seu partido, Márcia Vieira, da turma da coluna,
trocou dois dedos de prosa com Zózimo:
Assim como existe a bancada evangélica, existe uma esquerda evangélica?
Há setores evangélicos que reivindicam a identidade de esquerda. E, como a esquerda mudou com a experiência do PT no poder, os evangélicos também mudaram. Hoje eles são defensores das minorias e apoiam a legalização do aborto, o uso de métodos contraceptivos e o casamento gay. Há um grupo de cristãos que participa inclusive da Marcha das Vadias. O político evangélico de esquerda mais conhecido é o senador petista Walter Pinheiro, da Igreja Batista.
Marina Silva é uma representante dessa esquerda evangélica?
Não. A trajetória dela é ligada ao catolicismo popular. Ela se converteu ao protestantismo quando já era senadora. As bases evangélicas que se aproximaram dela são conversadoras. Há uma certa pressão por verem nela a chance de o Brasil ter um presidente evangélico.
Na sua tese, você diz que os evangélicos viviam uma ambiguidade. Por quê?
Durante a ditadura e no processo de redemocratização, por serem religiosos, eles eram chamados de burgueses pela esquerda. E, na igreja, eram considerados subversivos por defenderem as esquerdas. Um exemplo é o pastor luterano Mozart Noronha, exilado político e um dos fundadores do PT no Rio.
Como militante de
esquerda, fez oposição à ditadura, mas como sacerdote luterano foi encarregado
pela família do general Ernesto Geisel a dirigir os ritos fúnebres do ditador.
Ele recebeu muitas críticas dos seus alunos da faculdade de Direito por isso.
Sua resposta foi: “Eu não ressuscitei o Geisel, eu o enterrei.” E olha que ele
chegou ao sepultamento num carro com a estrela do PT.
Fonte: http://oglobo.globo.com
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