Projeto obriga cemitérios de São Paulo a respeitar religiões de matriz africana - Por Rodrigo Gomes

Lideranças religiosas de matriz africana defendem a aprovação do Projeto de Lei 66, de 2013, que determina que os cemitérios da capital paulista tenham espaços reservados para os rituais fúnebres de umbanda e candomblé. 

O autor do projeto, vereador Laércio Banko (PHS), afirma que hoje os praticantes dessas religiões acabam fazendo os preceitos às escondidas, ou não realizando as ações de forma adequada, em virtude da discriminação e, mesmo, do impedimento do acesso aos locais de velório.

“Nossos rituais fúnebres são diferentes das outras religiões. Em um dia de sol, por exemplo, precisamos estar ao ar livre, banhar o corpo com ervas. Nós temos de ter a condição de praticar a nossa religião em sua plenitude. E infelizmente, nesse momento, não conseguimos fazer isso”, afirma Benko, que é adepto da umbanda.

A sacerdotisa do Centro de Umbanda Caboclo Terra Branca, Mãe Rosane de Yansã, considera o projeto “importantíssimo”.

“É um grande avanço no sentido de garantir a liberdade religiosa. Sofremos olhares de recriminação, até por conta da roupa branca, que é a nossa vestimenta fúnebre. E nossos rituais têm segredos de culto que demandam um espaço reservado.” Assim, lembra ela, não basta que um espaço seja reservado, ele também deve estar protegido de olhares curiosos.

O vereador ressalta que, como é contra a lei sepultar um corpo em outro lugar que não nos cemitérios da cidade, é fundamental que estes espaços estejam adequados para respeitar as diferentes fés.

“É claro que um cemitério particular de uma religião, como o israelita, tem práticas próprias e unificadas. E isso é inquestionável. Mas um cemitério público deve permitir o ingresso e as práticas de todas as religiões.”

O vice-presidente da Associação Beneficente Paulista de Umbanda, Edson Ludogero, lembra que na matriz africana há entidades que reinam nos diferentes ambientes do planeta. 

“Garantir o espaço é importante para nós porque, da mesma forma que temos Iemanjá reinando nos mares, temos orixás que predominam nos cemitérios e precisam ser louvados no ritual fúnebre”, explicou.

Além disso, existe também a necessidade de levar oferendas ao cemitério e os instrumentos do ritual, como atabaques (tambores), adjás (sinetas), defumação, ervas e água. “Tudo isso faz parte do ritual de sepultamento da pessoa”, comenta Ludogero.

Os líderes afirmam que nunca foram impedidos de realizar os atos, mas várias vezes tiveram de enfrentar pressões contrárias. “Conhecemos muitos casos de não querer que as pessoas cantem, que toquem, que entrem de branco. De não permitir que se dê banho no corpo. Tudo que é relacionado ao culto”, afirmou Mãe Rosane de Yansã.

A cidade tem hoje 23 cemitérios públicos, 17 deles com espaços para velórios e um crematório. A proposta do vereador não determina que todos tenham espaço reservado para os rituais fúnebres de matriz africana, mas que a cidade disponha de espaços “em quantidade adequada para a demanda das necessidades”.

No caso de um local não ter condições de cumprir a determinação, que isso seja feito por “associações ou fundações com pelo menos cinco anos de existência e profundo conhecimento das práticas das religiões de matrizes africanas”.

O PL 66/2013 foi aprovado em primeira votação no dia 17 de abril. Ele precisa ser aprovado mais uma vez antes de ir à sanção do prefeito Fernando Haddad (PT).

O vereador afirmou que mantém diálogo com o superintendente do Serviço Funerário Municipal,Sérgio Trani, e que ele tem demonstrado boa vontade com o tema. “Ele tem nos recebido, participado de alguns seminários. Está tratando o tema com muito respeito.”

O Serviço Funerário Municipal informou à RBA que não se manifesta sobre a proposta até que seja aprovada.





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