Educar para a esperança – Por Marcelo Barros

Mesmo em meio aos maiores sofrimentos e problemas, a humanidade busca sempre razões para esperar. 

Às vezes, as pessoas que vivem situações de maior carência e sofrimento são as que mais se dispõem à alegria de viver e à teimosia de confiar no amanhã. Essa esperança pode ser ilusória e alienada quando é preguiçosa. 

Há quem diga: "Vamos ter paciência que o próprio tempo resolve”. Infelizmente, por si mesmo, o tempo nada pode resolver. Apenas adia o enfrentamento das questões. E, pela sucessão dos dias, muitos problemas até pioram. 

Entretanto, além do tipo de esperança baseada na ilusão, existe também um modelo de esperança, grávida de utopias. Essa nos dá energia para lutar e nos chama a não nos conformar. Essa esperança deve ser lúcida, atenta às dificuldades, mas decidida a nadar contra a corrente e ser energia de transformação da realidade e da vida. Essa esperança, para ser eficaz, tem de ser educada e organizada.

Na tarefa de educar para a esperança, as tradições religiosas têm uma missão importante. No Brasil, religiões afrodescendentes lidam com o Axé, energia vital. Celebram a presença divina na natureza e o encanto da vida. Fazem do culto uma dança de alegria que dá às pessoas força para resistir às tristezas da vida. 

O Budismo ensina a libertação dos desejos como caminho do nirvana, ou seja, da paz e da salvação. No passado, muitas vezes, o Cristianismo falou mais da vida depois da morte e do mundo sobrenatural do que do projeto divino para esse mundo, pelo qual Jesus pediu, ao ensinar seus discípulos a orar: 

"Venha a nós (isso é, para cá) o teu reino”. Nas últimas décadas, a inserção das Igrejas na caminhada do povo pela sua libertação tem ajudado pessoas e comunidades a testemunharem que, como dizem os fóruns sociais: "um novo mundo é possível!”.

A esperança de transformar a vida e o mundo tem um conteúdo revolucionário. Hoje, muita gente tem medo de usar a palavra revolução. É preciso resgatar esse conceito, hoje ainda associado por alguns grupos ao ódio, à violência e à luta armada. 

Na primeira parte do século XX, Caio Prado Júnior definiu a revolução como: "transformações capazes de reestruturar a vida de um país a partir de suas necessidades mais profundas e as aspirações da grande massa de sua população que, no estado atual, não são devidamente atendidas (...) Algo que leve o país por um novo rumo”[1]

Paulo Freire propunha uma "Pedagogia da Revolução”, como um trabalho de formação do ser humano que o torne apto ao processo de transformação social e à consolidação da nova organização social e política, produzida por uma reflexão (diagnóstica, judicativa e teleológica) sobre a educação, na perspectiva da hegemonia popular segundo as exigências do método dialético.

As Igrejas cristãs vieram para a América Latina através dos colonizadores europeus (a Igreja Católica e algumas das evangélicas mais antigas) e através de missionários norte-americanos (algumas Igrejas evangélicas mais novas e as pentecostais). 

Tanto europeus, como norte-americanos, em sua maioria, ao trazerem a mensagem do Evangelho, impunham a sua cultura e uma visão de fé desligada do compromisso de mudar o mundo. Por isso, as Igrejas têm uma dívida moral com os povos do continente. Devem ser testemunhas e agentes da esperança de um mundo novo, mais justo e igualitário. Na carta aos romanos, Paulo insiste: 

"Não vos conformeis com esse mundo, mas transformai-vos pela renovação de vossa inteligência para discernir qual a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe é agradável e perfeito” (Rm 12, 2). 

Para os cristãos, a fé nos revela que a esperança é um dom divino e não apenas uma capacidade nossa. E se baseia não na visão da realidade que é, em geral, dura e difícil. 

A esperança se enraíza na promessa divina de uma salvação que não é só para depois da morte. É a possibilidade de sermos felizes e fazermos os outros felizes nessa terra que Deus nos deu para vivermos. 



[1] - Cf. PRADO JR., CAIO, Revolução Brasileira, São Paulo, Civilização Brasileira, 1966, citado por L. BOFF,Responder Florindo, Garamond Rio de Janeiro, 2004, p. 47.




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