O corpo de Cristo – Por Marcello Scarrone
A festa católica do Corpus
Christi, celebrada numa quinta-feira após o domingo da Trindade, tem sua origem
no século XIII, quando uma freira belga teve um sonho revelador.
A festa de Corpus Christi (Corpo
de Cristo, em latim) deve sua origem a uma freira agostiniana belga, Juliana de
Mont Cornillon ou Juliana de Liège (1193-1258). No começo do século XIII, a
religiosa teve algumas visões: em uma delas, a Igreja teria aparecido no
semblante de uma lua cheia, mas atravessada no meio por uma faixa escura, como
se faltasse uma festividade. Numa outra visão, o próprio Cristo teria pedido
que ela se empenhasse para a criação de uma solenidade em homenagem à
Eucaristia.
Foi o que Juliana fez: escreveu a
várias autoridades religiosas na Europa do tempo. Até que, em 1246, um sínodo
da diocese de Liège instituiu a festividade, limitando-a ao seu território. A
história da festa, todavia, estava destinada a ter uma continuação
surpreendente.
Entre as pessoas consultadas por
Juliana estava o eclesiástico Jacques Pantaléon, também da província de Liège,
que aprovou o pedido da freira e trabalhou para a instituição da celebração.
Anos depois ele foi nomeado bispo e, mais tarde, Patriarca Latino de Jerusalém
e em 1261 foi eleito papa, com o nome de Urbano IV.
Milagre motivou expansão da
festa
Sem dúvida, o novo pontífice
conservava dentro de si a recordação da festa instituída em sua terra natal e
talvez já pensasse em estender sua celebração à toda a Igreja, mas um evento
surpreendente veio acelerar as decisões.
Em 1263 ou 1264, um sacerdote da
Boemia, durante uma peregrinação na Itália em direção à Roma, tomado de dúvidas
a respeito da presença real do corpo de Cristo na Eucaristia, celebra uma missa
numa igreja da cidade de Bolsena.
Durante a celebração, a hóstia se transforma
em carne e algumas gotas de sangue caem no corporal, o pano de linho que se
estende sobre o altar. Impressionado, esconde carne e sangue no tecido,
deixando-o na sacristia. Depois, sabendo que o papa se encontra a poucos
quilômetros, na cidade de Orvieto, o procura e lhe narra o acontecido.
Recuperadas as relíquias do milagre, elas são mostradas ao povo: a grande
comoção que tomou conta da cidade levou à construção nas décadas seguintes da
grande catedral de Orvieto, onde desde então as relíquias são conservadas.
O evento foi um motivo a mais
para Urbano IV se decidir a instituir em 1264 a festa do Corpus Christi como
solenidade a ser celebrada por toda a Igreja.
O encarregado pela composição dos
textos litúrgicos para a nova festividade foi um dominicano que também se
encontrava em Orvieto naquele momento: Tomás de Aquino. Ainda hoje, ressoam, em
ocasião da benção com o Santíssimo Sacramento nas igrejas católicas, as estofres
do Tantum Ergo Sacramentum, por ele compostas.
Por que quinta-feira?
Claramente, a presença real do
corpo de Jesus no pão eucarístico e de seu sangue no vinho, após a consagração
da missa, vinha sendo proclamada pela fé da igreja desde os primeiros séculos e
os primeiros concílios, mas a nova festividade foi reforçando esta convicção.
Ainda mais quando, no começo da Idade Moderna, a Reforma Protestante discutirá
essa presença, interpretando a missa como uma simples ceia comemorativa, e não
como a reapresentação sobre o altar do sacrifício extremo de Jesus. Então,
ostensões públicas da hóstia consagrada e procissões eucarísticas foram se
multiplicando.
Ainda hoje os católicos celebram
esta festividade na quinta-feira que segue ao domingo da Trindade, primeiro
domingo após o dia de Pentecostes. Uma quinta-feira: afinal, esse tinha sido o
dia da semana em que fora instituída a Eucaristia, na ultima ceia que Jesus
consumiu com seus apóstolos em Jerusalém, na véspera de sua morte.
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