Exército de voluntários une esforços para cuidar de doentes em fase terminal – Por Jose Manuel Lourenço
Tratamento inclui conforto
espiritual, além de cuidados especiais aos doentes hospitalizados em Ribeirão.
Há duas semanas, na cidade de
Sacramento (MG), dois jovens invadiram uma igreja e quebraram diversas imagens
religiosas. O motivo? Intolerância religiosa.
No entanto, na mesma semana, a
200 quilômetros da cidade mineira, um serviço de apoio a pacientes internados
em diversas instituições de saúde de Ribeirão Preto, mostra que as barreiras
entre religiões podem ser superadas com o objetivo de tornar melhor a vida
física e espiritual de quem está enfermo. Grande parte desse serviço envolve
pacientes já em fase terminal.
Criada em 2009, a Rede de Apoio
Espiritual de Ribeirão Preto é um dos recursos utilizados nos cuidados
paliativos. Ela envolve o trabalho conjunto de quase duas dezenas de diferentes
instituições religiosas (católicas, evangélicas, espíritas) e um exército de
voluntários que, só no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo, conta com mais de 400 pessoas.
Na maioria dos casos, o
atendimento espiritual aos pacientes é feito por integrantes de diferentes
orientações religiosas, como é o caso do pastor Paulo Ros e do padre Josirlei
Aparecido da Silva.
Todo o processo de interação dos
voluntários, chamados “mensageiros” é regulado por um manual que prevê normas
específicas nas áreas de biossegurança, legislação, ética e saúde: o contato
com os pacientes só pode ser feito após todas as vacinas estarem em dia.
Mas a principal característica do
trabalho da Rede e dos próprios mensageiros, é a ausência de uma abordagem
religiosa.
“O mensageiro entra, recebe um
crachá especial, não para falar de alguma religião em particular, mas do apoio
espiritual. Cada um tem a sua crença, mas não se fala de religião. Os
voluntários levam uma mensagem de serenidade, paz e conforto, daí serem
chamados de mensageiros. Não são da igreja x, y ou z”, diz a coordenadora da
rede no HC, a psiquiatra Catalina Cabrera, que faz parte do núcleo original da
rede, surgido no hospital da USP.
Assim como Catalina, Maria
Augusta Rosa também faz parte do grupo que criou a rede. Psicóloga da Santa
Casa da Misericórdia, ela coordena os trabalhos de 16 instituições religiosas e
cerca de 90 mensageiros, além de outros quatro no Hospital Santa Lydia, desde
2013.
“O trabalho deles é extremamente
importante, pelo conforto que levam aos pacientes e, também, à família em
momentos de muita angústia”, disse. “Nós somos, por natureza, um país crente em
um ser superior, daí a importância que assume a dimensão espiritual”, concluiu.
O trabalho dos mensageiros também
é destacado pela assistente social Denise Ruiz, da Beneficência Portuguesa. “É
interessante ver pessoas de várias religiões trabalharem juntas, sem quererem
converter ninguém, mas apenas levar palavra de conforto, carinho e amor”, conta
a respeito da ação dos cerca de 90 mensageiros da Beneficência.
Além de Ribeirão Preto, a Rede de
Apoio Espiritual também se estende ao Hospital Estadual de Américo Brasiliense
e parte da rede pública de Serrana. Os trabalhos ainda estão no início e são
coordenados por Cleice Levorato e Lilian de Jesus.
Manual cria normas para evitar
exageros
A necessidade de se criar normas
no trabalho de voluntários a pacientes em cuidados paliativos surgiu após
diversas situações de abusos que, em alguns casos, envolveram até a existência
de exorcismos em unidades de emergência.
Atualmente, a relação do mensageiro
com o paciente e a instituição de saúde é regida por um manual, com o objetivo
de auxiliar e dar orientações aos visitadores sobre como proceder no apoio
espiritual, mostrando questões importantes como o preparo e o entendimento que
o mensageiro deve ter nas áreas da ética, biossegurança e legislação.
Além disso, o mensageiro passou a
ser cadastrado e receber um crachá personalizado para entrar na instituição.
Também passou a ser exigido de todos o cartão de vacinação atualizado e o uso
de um jaleco com a inscrição: “Apoio Espiritual” no lugar do credo religioso. Os
mensageiros são indicados pelas instituições. Todos os anos é feita uma reunião
na rede para avaliar o trabalho.
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