O crescimento da intolerância religiosa - Por Maria João Tomás
Estamos a assistir ao crescimento
da intolerância religiosa um pouco por todo o mundo. Nacionalismo e
separatismos, bem como conflitos que opõem etnias ou religiões, mascaram as
verdadeiras razões políticas e estratégicas subjacentes, arrastando e
alimentando ódios há muito esquecidos.
A guerra entre o Hamas e Israel é
um desses casos. Termina hoje, quarta-feira, o alargamento do cessar-fogo entre
Israel e o Hamas. Esta guerra tem impressionado o mundo inteiro, não só pela
destruição de escolas, hospitais e bairros habitacionais, como também pelas
mortes de civis, entre os quais se contam muitas crianças e bebés, gerando
sentimentos de ódio como há muito não se via.
Pela primeira vez em décadas,
ouvem-se vozes acaloradas antissemitas, ou seja, contra os judeus, como
sionistas, defendendo o nacionalismo judaico, dividindo opiniões e não deixando
ninguém indiferente.
Esquecendo que estamos perante um conflito político, e
arranjando bodes expiatórios religiosos, é realmente uma forma muito cómoda de
entender o que se passa, mas é também a mais fácil para fazer crescer os
fundamentalismos que, na Europa, estão a ter expressão na vitória dos partidos
de extrema-direita e neonazistas.
Outro exemplo é o califado
islâmico que semeia o terror e persegue as minorias na região, quer sejam
cristãs, yazidis, curdos, druzos e outros. Várias organizações de direitos
humanos falam em autênticos genocídios e limpezas étnicas feitos por estes
jihadistas que, em nome do islão, legitimam as suas ações. Mais uma vez, são
motivos bem mais mundanos que levam a estas ações, como o acesso aos poços de
petróleo ou ao controlo e posse de uma região, na falta de um poder político
forte.
Da Malásia ao Mali, dos EUA à Europa, chegam todos os dias novos
combatentes ao Iraque e à Síria, enquanto outros grupos juram fidelidade e prometem
estender o território para outras regiões.
Também aqui se cai facilmente na
tentação de culpar os muçulmanos, acusando a sua religião de incitar à
violência e à intolerância, crescendo a islamofobia, que por sua vez arrasta
cegamente o extremismo, quer o islâmico quer o de outras religiões, numa bola
de neve que invariavelmente conduz a novos conflitos.
Na Síria e no Líbano, a luta
entre muçulmanos sunitas e xiitas continua, confundindo-se com o apoio político
a Assad, enquanto no Iraque tem o apoio dos opositores ao governo de Maliki. No
Bahrein, a população de maioria xiita luta contra um governo sunita, temendo-se
que o mesmo venha a alastrar-se a outras zonas do golfo. No Líbano, cresce o
jihadismo e o perigo de o país vir a ser transformado num califado islâmico.
No Paquistão e na Índia, aumentam
os conflitos entre muçulmanos e hindus tendo, mais uma vez, como razão de fundo
antigas querelas políticas e étnicas, enquanto em Myanmar, budistas e
muçulmanos se guerreiam por motivos de cariz semelhante.
As crenças pessoais e religiosas
são do foro privado, e aí devem permanecer, não devendo ser usadas para
justificar fins ou atitudes políticas, ou de afirmação cultural e tribal. Por
vezes, é o caminho mais fácil para entender conflitos, ou para os começar, mas
fazê-lo é incentivar e perpetuar a guerra, contrária aos princípios de paz, que
todas as religiões defendem.
Fonte: http://www.dn.pt
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