Portugueses procuram cada vez mais ligação espiritual fora das igrejas, diz especialista

O investigador Paulo Mendes Pinto considera que os portugueses procuram cada vez mais uma ligação espiritual e religiosa, mas continuam a afastar-se das igrejas tradicionais, como a católica, porque não encontram respostas às questões quotidianas.

Em entrevista à agência Lusa a propósito da realização do primeiro congresso sobre religião no espaço lusófono Paulo Mendes Pinto, considerou que a crise económica e financeira instalada no país revelou um crescimento do fenómeno religioso, que, no entanto, não se traduz no aumento da prática religiosa.

"Há um crescimento do fenómeno religioso, mas é um crescimento que não tem lugar em torno das instituições religiosas. [...] Não temos qualquer estudo, mas a percepção é que a prática dominical na Igreja Católica continua a diminuir", exemplificou.

"A maioria das pessoas que procuram alguma dimensão espiritual não lhes passa pela cabeça fazer essa busca dentro da Igreja Católica", acrescentou.

Para o investigador, "a Igreja Católica refugiou-se durante séculos numa teologia que foge ao momento concreto", quando o que as pessoas procuram numa confissão religiosa hoje "é uma teologia do dia-a-dia, que lhes dê resposta, amparo e ânimo para o momento concreto".

Por outro lado, o diretor da área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona sublinha que atualmente as pessoas "prezam muito a liberdade" nas suas opções espirituais e "podem encontrar coerência na Igreja Católica, como podem encontrar nos ensinamentos budistas ou hindus".

Por isso, o aumento da procura pela religião está a verificar-se sobretudo nas confissões com "menos carga institucional", como as igrejas cristãs menos tradicionais.

Evangélicos, Testemunhas de Jeová, Mórmon e Adventistas do Sétimo Dia são correntes em grande crescimento, segundo o especialista, a par de outras práticas espirituais sem enquadramento institucional.

Por outro lado, o investigador lembra que a questão da separação entre estados e religião não é hoje tão linear como se pensava e aponta a discussão em torno do processo de laicização das sociedades europeias como um dos debates mais importantes que poderá sair do congresso de maio.

"Construímos todo um aparelho legal com leis que separam as coisas, mas na prática as pessoas não separam o seu cérebro em departamentos estanques: das 04:00 às 05:00 sou religioso e saio da missa ou de um culto qualquer e às 5:05 já estou numa sociedade perfeitamente laica", disse.

Portugal é o país anfitrião I Congresso Lusófono de Ciência das Religiões, um evento científico que quer aprofundar o olhar académico sobre o fenómeno religioso na sociedade e conta já com mais de 200 conferencistas inscritos.

O congresso é uma iniciativa conjunta dos programas de pós-graduação em ciência das religiões da Universidade Lusófona de Lisboa e de seis universidades brasileiras.

"As religiões, goste-se ou não, são uma componente da sociedade que não desapareceu, antes pelo contrário, há muitas correntes religiosas que têm cada vez mais implantação e força. É um fenómeno que interessa ser estudado para se perceber a sociedade atual", considera Paulo Mendes Pinto.

O congresso, marcado para 09 a 13 de maio, será antecedido, a 07 e 08 de maio, pelo primeiro Fórum Internacional do Ensino Religioso.


A religião na educação e na sociedade, a laicidade e a liberdade religiosa, as espiritualidades contemporâneas e a pluralidade religiosa, as igrejas inclusivas e a intolerância religiosa ou o islão na África lusófona são alguns dos temas das mais de 30 conferências e mesas temáticas previstas no congresso.






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