Diálogo ou tolerância no enfrentamento da intolerância religiosa? – Por Dom Orvandil
O melhor projeto é o diálogo,
primeiro entre os que são massacrados pela intolerância, buscando unidade e
conhecimento por parte dos que sofrem preconceitos e agressões dos
fundamentalistas e sectários.
Nesta terça-feira, dia 30 de
junho, tive a honra de participar de um encontro promovido pelo Professor
Marcos Antônio Cunha Torres, Pró-Reitor de Extensão, Cultura e Assuntos
Estudantis da Universidade Estadual de Goiás, UEG.
O Professor Marcos foi
marcantemente criativo ao chamar todos os presentes a falar sobre a proposta
temática: "Diálogo Para Enfrentar A Intolerância Religiosa". Chamou-me a atenção o fato de uma
universidade pública e laica, sublinhada pela democracia, pelos estudos, pela
pesquisa e pela luta de ideias, convidar a comunidade a dialogar sobre um tema
que muitos dizem ser do arraial sagrado e intocável.
Lá estavam jovens estudantes,
evangélicos de boa vontade, orixás, umbandistas, espíritas, católicos romanos,
anglicanos, ateus, homossexuais, lésbicas, negros e negras, todos
inteligentemente a denunciar a faceta terrível da intolerância. Pelas características do grupo
foi fácil entender a gama enorme de intolerância que todos sofrem. Uns por
serem homossexuais, outros por serem orixás ou umbandistas, outros por serem
evangélicos pentecostais inclusivos, outros por serem ativos da teologia da
libertação e outros até por serem ateus.
A intolerância acontece via
agressões verbais, perseguições em setores de trabalho através de bullying, do
assédio moral e de perseguições por meio de violências físicas. Quando se fala
de intolerância religiosa menciona-se um rosário de barbarismos de tom
medieval. Por isso, o caso da guria do Rio de Janeiro, que sofreu uma pedrada
ao sair de um culto de sua religião de matriz africana, foi muito mencionado.
A intolerância com os
homossexuais, afrontados por sua opção e até por seu modo de amar e formar
família é do mesmo conteúdo que motiva os fanáticos fundamentalistas. Os
participantes se manifestaram com muito conhecimento da realidade da
intolerância e suas causas. Impressionei-me com a inteligência e maturidade dos
vários representantes dos grupos que lutam por dignidade e respeito.
Como conclusão, o grupo decidiu
encaminhar a organização de um fórum de estudos e debates do problema da
intolerância religiosa com o objetivo de viabilizar ações para enfrentar a
intolerância como uma das formas do aprofundamento de uma sociedade
democrática, onde todos sejam respeitosos e respeitados. O grande desafio é
construir bases e caminhos para o diálogo e avançar para além da tolerância.
Tolerância é aguentar, suportar e
resistir para não estourar provocando estragos desconfortáveis. Muitas vezes a
causa para tolerar é a falta de forças para argumentar, outras é a dificuldade
com os argumentos, pobreza de um lado e conhecimento falso, de outro. A
tolerância no enfrentamento da intolerância pode ser um caminho, mas
insuficiente.
O melhor projeto é o diálogo,
primeiro entre os que são massacrados pela intolerância, buscando unidade e
conhecimento por parte dos que sofrem preconceitos e agressões dos
fundamentalistas e sectários. Dialogar significa exercitar a capacidade de nos
compreendermos na luta e de compreendermos as razões e dificuldades dos que nos
enfrentam com seus ódios.
A palavra diálogo é intensa por
significar palavras, discursos, debate entre dois, dois no sentido de duas
pessoas ou várias com ideias diferentes. Originalmente "dia", além de
ser dois em grego também é "através de". Portanto, ao dialogarmos nos
entendemos melhor através das falas e discursos do outro e entendemo-nos mais
claramente através de nossas falas e discursos que pronunciamos, agora nos
grupos e nos fóruns de debates e estudos.
No auditório, com uma variedade
enorme de percepções do problema da intolerância que gera guerra vi e ouvi dois
panos de fundo mais fortes: um é o da postura política rígida e conservadora
por parte dos intolerantes e o outro a disposição enorme para construir
caminhos de diálogo por parte dos atingidos pela intolerância. Finalmente, percebi o quanto a
vida é contraditoriamente dinâmica. De um lado a rigidez doentia dos
intolerantes, que desde sempre historicamente agiram para destruir os oprimidos
e, do outro, esforços para avançar criativa e inteligentemente de forma
fraterna e acolhedora do outro.
A intolerância é a conduta dos
que tremem de medo das mudanças, notadamente das que redimem os perseguidos.
Tanto que os intolerantes sofrem de "fobias". O diálogo é a coragem
de ser, de avançar e de transformar. Os dialogadores sabem que os blocos dos
intolerantes não são rigidamente monolíticos. Do lado deles há pessoas que se
libertarão da indecência da intolerância. Por isso é preciso dialogar.
Os intolerantes têm as mesmas
condutas, sejam religiosas, sejam diante dos direitos sociais. Os intolerantes
que não aceitam os diferentes religiosos, como os umbandistas, os católicos, os
evangélicos, cada um atacado de acordo com a visão fixista dos intolerantes e
no parlamento se organizam nas bancadas da bíblia, da bala, da bola, da mídia,
das terras etc para votar sempre contra os direitos sociais, como a diminuição
da idade penal, a terceirização e contra o casamento homoafetivo, para citar
alguns exemplos.
Do outro lado vemos enorme largueza de compaixão com a CNBB, a
OAB, o MST, TRST, as centrais sindicais, os movimentos sociais etc apoiando o
diálogo e a acumulação de forças para avançar. O fórum de estudos e ações que
construiremos em Goiás será a favor do diálogo e na desconstrução da
intolerância religiosa e de todas as outras.
Fonte: http://www.brasil247.com
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