XXI Assembleia Geral do Cimi – “Esquecemos que nós mesmos somos terra" - Por Patrícia Bonilha
Na manhã do terceiro dia da XXI
Assembleia Geral do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), na
quinta-feira,18/09, Paulo Suess, assessor teológico da organização, iniciou sua
fala questionando o papel da assessoria teológica em uma entidade onde as
batalhas e decisões acontecem no campo jurídico, legislativo e administrativo,
como é o caso do universo vivido pelos povos indígenas.
Como contribuição ao seu próprio
questionamento, ele apresentou três “pedras” fundamentais com as quais a
teologia pode contribuir para o trabalho realizado pela instituição indigenista
missionária: lembrar a memória (das batalhas passadas, dos indígenas e
missionários que tombaram, dos anos de luta para garantir a demarcação de
alguns territórios, do Bem Viver); animar a luta de hoje, bastante desafiadora;
e alimentar a esperança diante das situações concretas da luta indígena. Paulo
avaliou que a teologia é lugar de discernimento e crítica (interna e externa) e
destruidora da unanimidade.
Em seguida, Paulo fez um paralelo
entre a igreja e a lua. “O sol é Jesus. A igreja é a transmissora e irradia a
luz de Jesus. Ela tem suas fases, a lua cheia, a lua nova... Com o Papa
Francisco, tem irradiado muita luz”, considera ele.
Segundo Paulo, os povos indígenas
viveram e muitos ainda vivem em um outro sistema, que é incompatível com o
capitalismo, o Bem Viver. Todas as cosmologias têm seu valor e contribuem para
a luta, o luto e a esperança do povo. No entanto, ao propagar o consumismo e o
individualismo, o capitalismo contamina alguns povos indígenas, mas nele não há
lugar para todos.
Nesse sentido, o teólogo
apresenta algumas perguntas no sentido de fortalecer o debate sobre o Bem
Viver.
“Como fazer uma crítica radical
ao sistema capitalista, que mata pelos estímulos à desigualdade, à acumulação e
à migração, ao crescimento, à aceleração e banalização da vida e das relações
sociais pela precarização do trabalho?”, “Como desmascarar as soluções
paliativas para mitigar os efeitos negativos do capitalismo sem tratamento das
raízes causadoras?”, “Como convencer os 'beneficiados' dessa mitigação, de que
eles vivem das sobras da exploração e não num Estado de bem estar social?” e
“Como reeducar o mundo alienado pela mídia e pelo consumo, num mundo militante
pelo Bem Viver de todos” são alguns destes questionamentos provocados por ele,
que citou a entrega das cestas básicas em territórios indígenas não demarcados
como um exemplo desse tipo de mitigação.
Povos indígenas na vanguarda,
naturalmente
“A causa indígena não pediu
carona à questão ecológica. Pelo contrário, os povos indígenas foram os
primeiros que despertaram, a partir de suas culturas, religiões, mitos e do
sofrimento que lhes foi imposto desde a conquista, para a interdependência
entre natureza e cultura”, considera Paulo Suess.
Segundo ele, a ecologia integral
faz parte das culturas indígenas e os povos indígenas oferecem à sociedade não
indígena a herança de uma educação e espiritualidade integral.
São justamente
as tentativas sistêmicas de destruir essa herança, orientada para a vida de
todos e não para o lucro de particulares, que constituem o conflito básico
entre duas visões do mundo, causando violência, mortes e lutas.
O paralelismo entre a Encíclica
da Ecologia, sistematizada pelo Papa Francisco, e o Plano Pastoral do Cimi foi
ressaltado pelo assessor, especialmente em relação à concepção da terra como
fonte de vida, direito inalienável dos povos indígenas, dom sagrado de Deus e
dos antepassados que nela descansam, espaço sagrado com o qual precisam
interagir para manter sua identidade, e não um bem econômico, objeto da
exploração e do lucro. “Esquecemos que nós mesmos somos terra”, afirma o texto
da Encíclica.
Desse modo, Paulo Suess afirmou a
necessidade da urgente mudança de consciência e de hábitos, do abandono da
cultura do descarte da sociedade não envolvente, do desenvolvimento de novas
convicções, opções e estilos de vida, no sentido de superar o individualismo, a
postura de segregação com as outras criaturas vivas, o apego material e
regressar à simplicidade. “Os povos indígenas nos desafiam a realizar estas
mudanças”, concluiu ele.
Fonte: http://www.cimi.org.br
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