O sábio do Islã – Por Adriana Carranca




Helmi Nasr, de 86 anos, é um dos 21 grandes eruditos e conhecedores da religião - o único na América Latina




Allahu Akbar. Allahu Akbar. Ash-hadu al-la ilaha illallah. Ash-hadu al-la ilaha illallah. Ash-hadu anna Muhammadan rasulullah. Ash-hadu anna Muhammadan rasulullah. Hayyi 'alas-salah. Hayyi 'alas-salah. Hayyi 'alal-falah. Hayyi 'alal-falah. Allahu akbar. Allahu akbar. La ilah illa

(Deus é Grande. Confesso que não existe divindade, se não Deus. Confesso que Mohammad é o profeta de Deus. Vem para a reza. Vem para o sucesso. Deus é grande. Não existe Deus, se não Deus).



A melodia, em frases repetidas duas vezes, ecoa das torres das mesquitas e invade as casas do Cairo, na capital do Egito, convocando os fiéis para a reza cinco vezes ao dia. O chamado divino é, aqui, adaptado a um pequeno rádio-relógio digital, cujo alarme reproduz o mesmo som às 5h, 12h, 15h30, 17h30 e 19h30 no confortável apartamento a sete andares da rua, com vista para o Parque Buenos Aires, em Higienópolis, centro de São Paulo.Ali vive o egípcio Helmi Mohammed Nasr, de 86 anos, que adotou São Paulo há 46 e é um dos 21 sábios do Islã no mundo, como foi nomeado recentemente pela Liga Islâmica Mundial, a mais alta entidade muçulmana, com sede em Meca. A designação é dada àqueles considerados grandes eruditos e conhecedores da religião - Nasr é o único na América Latina. A junta de sábios se reúne pelo menos uma vez por ano para discutir assuntos relacionados à fé, relações internacionais, segurança e paz.


Nasr chegou ao Brasil em 1962 para montar, a pedido do presidente Jânio Quadros, admirador do líder egípcio Gamal Abel Nasser, um departamento de estudos árabes na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). “Aceitei com uma condição: ficar somente um ano. Fiquei para sempre.” Casou-se com a brasileira de origem libanesa Nida Nasr. E passou a dedicar a vida a aproximar as duas culturas. Ele é o autor da primeira e única tradução oficial do Alcorão, o livro sagrado do Islã, feita diretamente do texto original em árabe para o português e reconhecida pela liga. Foram quatro anos de “dedicação monacal”: nove horas diárias ao lado de uma equipe de oito professores, universitários e quatro datilógrafas (sim, as 1.065 páginas foram escritas e reescritas à máquina) para traduzir a palavra de Allah em 114 capítulos - ou suras - divididos em até 286 versículos. Finalizado, o texto foi enviado a Meca em 1988, onde passou por um processo de revisão que durou 15 anos e envolveu um conselho de especialistas, inclusive de Portugal, até ter o aval do líder máximo, secretário-geral da liga, Abdullah bin Abdul Mohsin Al-Turki. “Foi preciso muita calma. Eu pensava que não iriam mais aprovar a tradução. Hoje, me sinto realizado. Graças a Deus”, diz o professor, cujo nome começa com “calma” (helmi, em árabe) e termina em “vitória” (nasr), o que parece definir bem a sua trajetória. O livro sagrado não pode ser vendido, porque “a palavra divina não tem preço”. Só pode ser doado a quem quer recebê-lo. Desde o lançamento, em 2005, foram distribuídos cerca de 40 mil exemplares no Brasil, em atendimento a pedidos que chegaram por telefone ou e-mail à Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, da qual Nasr é vice-presidente de Relações Internacionais há 25 anos. Os exemplares são impressos oficialmente no Complexo do Rei Fahd, na cidade sagrada de Medina, na Arábia Saudita, hoje em 41 idiomas - o português é o 41º e último. Nasr é também o autor do primeiro dicionário árabe-português, que começou a preparar quando chegou ao Brasil, em duas máquinas de escrever - uma com letras árabes no teclado e outra com o alfabeto ocidental. E traduziu para o árabe o livro Novo Mundo nos Trópicos, de Gilberto Freyre, a pedido da Embaixada do Brasil na Arábia Saudita. Em julho, ele lança um curso de árabe para brasileiros em áudio. Como intérprete, ele foi a voz de presidentes como Ernesto Geisel e João Figueiredo, em conversas oficiais com líderes do Oriente Médio. O quinto de oito filhos, quatro homens e quatro mulheres, com 12 tios e tias por parte de mãe, “cada um com cinco ou seis filhos, às vezes dez”, Nasr mantém viva a memória da infância em uma típica família árabe, sem rádio nem tevê, somente discos de vinil, na pequena Mansura, à beira do Nilo, a 200 quilômetros do Cairo. Entre os 10 e 19 anos, ele estudou em uma madrassa (escola religiosa) na Universidade de Al-Ahzar, no Cairo, que tem mais de mil anos e forma xeques do mundo todo. Ali, aprendeu a ter disciplina. Levantava para a primeira reza antes de o sol nascer, hábito que, como bom muçulmano, mantém até hoje. “Valeu a pena. Sou o único sábio da família”, diz, com os olhos brilhando atrás dos óculos de aro dourado. Podia ser xeque, mas escolheu as letras. Cursou o doutorado na prestigiada Sorbonne, em Paris, foi professor do Lycée Français e da Universidade do Cairo. “Poucos religiosos conhecem a língua estrangeira. Se o fizessem, o Islã não seria tão mal interpretado no mundo”, diz, zapeando entre os 40 canais árabes que chegam à sua casa, incluindo a TV Al-Iraqiya. “A guerra não é do Islã. É a vaidade do homem que o faz buscar o poder e o afasta das coisas divinas.”

Fonte: http://txt.estado.com.br

Comentários

Anônimo disse…
ilústre dr helmi. é um fenÔmeno intelctual raro em suas difernças e ideologias do pensar laico do islamismo. é um pensar além das expectativas, mente fértil e visão infinita da justiça em seu iluminado ego do conhecimento, e como consegue a proximar as ideias para mudanças e fazer da religiao muçulmana uma referÊncia de tolerãncia , e desenvolvimneto cultural da fê. meus parabens ao profeta das transformaçoes e das reformas logicas para o bem estar do islamismo e a humanidade.

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