Principal ícone do bairro, Igreja da Glória volta à sua época de ouro (Rio de Janeiro) - Por Rogério Daflon
A Igreja da Glória vai
passar por um importante restauro no momento de revitalização do bairro do qual
é o principal ícone.
E essa reconstituição é tão importante que, na última
quinta-feira, um seminário com arquitetos, restauradores, historiadores da arte
e integrantes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)
e da Irmandade Imperial da Glória discutiu o destino da talha no interior da
edificação religiosa.
A partir daí, pôde-se desvendar um pouco da história do
prédio instalado no topo do outeiro na primeira metade do século XVIII,
formando um conjunto de relevo e arquitetura que o carioca talvez não tenha se
dado conta que é tão importante quanto o do Corcovado e do Cristo Redentor.
Atualmente, a talha do altar-mor
e dos dois altares laterais tem sua madeira crua, sem qualquer douramento. A
Irmandade da Glória, então, quis ouvir especialistas para saber se a mantém
assim, faz um douramento total ou se faz um douramento parcial, deixando fundos
brancos, mais leves.
- Ao fim de oito horas de debate,
a Irmandade percebeu que a maioria dos palestrantes gostaria de ver a talha com
douramento parcial, no estilo rococó. Agora, vamos precisar da aprovação do
Iphan - disse o provedor da irmandade, Ronaldo Goytaz Cavalheiro.
A discussão sobre a talha é
antiga. O arquiteto Luciano Cavalcanti de Albuquerque lembra que, em 1940, o
então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan) tinha como
presidente Rodrigo Melo Franco de Andrade . Na época, Melo Franco se aconselhou
sobre a talha da igreja com o arquiteto Lúcio Costa, pioneiro da arquitetura
moderna no Brasil.
- Lúcio Costa defendeu então a
retirada do douramento não por ser contra, mas por considerar o ouro utilizado
de má qualidade. Ao ver como ficou a madeira sem nada, Lúcio gostou do efeito
visual.
Desde então, a talha dos altares
não tem qualquer douramento. Em 1942, porém, o poeta Manuel Bandeira publicou
artigo protestando contra a retirada do douramento.
Azulejos vieram de Portugal
De planta poligonal, a
arquitetura da igreja, segundo o arquiteto e historiador Nireu Cavalcanti, tem
estilo barroco em seu exterior. Já o interior da igreja, com as mudanças feitas
ao longo do tempo, apresenta o estilo rococó, bem mais simples do que o estilo
barroco, no qual o douramento das talhas era total.
O recurso visual buscava
acentuar o poder da Igreja Católica após a contrarreforma, como explica a
historiadora da arte Myriam Ribeiro no livro: "O barroco e o rococó nas
Igrejas do Rio", escrito em parceria com Fátima Justiano. Na obra, as
autoras explicam que o rococó surgiu na França no reinado de Luiz XV, em meados
do século XVIII. Há documentos históricos comprovando que a Igreja da Glória já
estava em atividade em 1739, mas ainda não se sabe ao certo o ano da
inauguração.
O primeiro douramento ocorreu na segunda metade do século XVIII,
sob a influência do estilo francês. Apaixonada pela igreja, Myriam vai além da
análise do interior do prédio.
- As três portadas da fachada são
em pedra de lioz. Esse material veio em navios portugueses como lastro e, como
era pesado, não chegou às igrejas mineiras, já que era impossível transportá-lo
nas estradas da época. Em Minas, usou-se então material semelhante à pedra de
lioz, a pedra sabão - diz Myriam, lembrando que os azulejos também vieram em
navios portugueses.
Estudiosa da azulejaria
portuguesa, a arquiteta Dora Alcântara detalha os exemplares da Igreja da
Glória:
- Os painéis de azulejos da nave
são do segundo quarto do século XVIII. É um tipo de produção do período joanino
(dom João V) entre 1725 e 1750. Historiadores de Portugal atribuem esses
painéis ao pintor português Valentim de Almeida. Os demais painéis (da
capela-mor, da sacristia, dos corredores e do coro alto) são da mesma época,
mas de autoria desconhecida. Todos têm muita boa qualidade.
O arquiteto Lúcio Costa talvez
tenha sido o admirador mais ilustre da Igreja da Glória. Luciano Cavalcanti
conta que, nos anos 1960, ele projetou a rampa em ziguezague até o templo,
começando pela Rua do Russel. Hoje, o belo caminho carece de reforma.
- A Igreja da Glória revela belos
ângulos de diferentes pontos do bairro. Desde o século XVIII, talvez tenha sido
uma das edificações mais vistas em pinturas históricas - diz Luciano.
O cartão-postal tantas vezes
retratado guarda também a imagem da primeira capela construída no outeiro no
século XVII. Como conta Nireu Cavalcanti, quem olha para o teto da sacristia se
depara com uma pintura da construção original.
Fonte: http://br.noticias.yahoo.com
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