Para Cybele Amado, cursos de pedagogia "não deveriam mais existir no Brasil" – Por Suellen Smosinski


A presidente e diretora executiva do Icep (Instituto Chapada de Educação e Pesquisa), Cybele Amado, defende que o Brasil tenha "institutos superiores de formação de professores, com um currículo que forme professores para ensinar", no lugar dos atuais cursos de pedagogia nas faculdades de educação. 

A formação dos docentes é apontada como um dos maiores problemas da educação por gestores de municípios da Chapada Diamantina e do semiárido baiano.

"Na minha opinião, e as pesquisas também já apontam isso, os cursos de pedagogia não dão conta da formação dos professores. O currículo dos cursos é muito centrado em disciplinas de direitos humanos, história da educação, filosofia da educação. Basicamente, não tem no currículo disciplinas que ajudem o professor a saber o que e como ensinar. Isso significa que nós formamos pedagogos, mas não formamos professores", afirma Cybele.

Segundo Cybele, muitos professores que se formam em pedagogia contam que aprendem coisas importantes na faculdade, mas não sabem ensinar. "A didática, o conhecimento da prática pedagógica, as especificidades do currículo e de cada área do conhecimento precisam estar na formação dos professores", disse a educadora.

Falta ousadia

"Eu respeito as decisões sobre a alfabetização na idade certa, é uma coisa que está sendo discutida há muito tempo, eu entendo as razões dos oito anos, mas eu defendo os seis anos. Para mim, todas as crianças tem plenas condições de aprender aos seis anos", afirmou Cybele. Para que a meta seja menor do que a estipulada hoje, ela diz que o país precisaria "investir pesado na educação infantil".

Para justificar os seis anos como idade possível de alfabetização, Cybele cita o trabalho realizado com o Icep junto aos municípios da Chapada Diamantina, na Bahia. "Eu trabalho com crianças pobres, nós temos o pior IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] da Bahia, em Novo Horizonte [a 580 km de Salvador]. A Bahia já tem um IDH baixíssimo, então você imagina o pior da Bahia. São crianças que estão em situação de pobreza, de miséria mesmo. Se eu vejo todas essas crianças aprenderem a ler, inclusive algumas com cinco anos, eu acho que o meu recado para o Brasil, é que ele deveria ousar mais", disse.

Segundo ela, que é formada em pedagogia, o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, lançado em novembro deste ano, é mais uma esperança de alfabetizar todas as crianças do país. Mais uma, pois Cybele conta que em 30 anos de trabalhos com a educação, que serão completados no ano que vem, já viu diversos programas de alfabetização. 

No entanto, ela acredita que o Pacto "vem com muitas diferenças em relação aos outros" e conta que o Icep "está bem perto do MEC na Chapada e nos municípios parceiros em Pernambuco, trabalhando como ‘antena’ desse projeto".

Cybele também afirma que a meta de oito anos pode induzir a uma ideia de que as crianças de escola pública não têm capacidade de aprender antes: "Obviamente, não pensaram nisso quando decidiram a meta, mas temos que pensar o que estamos dizendo com isso, porque essa não é a meta para as escolas particulares desse país".

De acordo com ela, as crianças podem aprender aos seis anos, com "melhores condições de formação de professores, montando uma rede colaborativa, oferecendo estrutura nas escolas, co-responsabilizando os pais, a comunidade e o poder público nessa tarefa, pondo metas e fazendo um acompanhamento permanente".

Coordenador pedagógico

Outra "briga" do Icep é para que na meta 19 do PNE (Plano Nacional da Educação) seja incluído o coordenador pedagógico. O texto, que também destina 10% do PIB para educação, foi aprovado pela Câmara e agora é analisado pelo Senado.

"O Brasil está colocando 1/3 da carga horária para planejamento no plano de cargos e salários. Quem faz isso na escola [planejamento junto aos professores] é o coordenador pedagógico, ainda que o diretor tenha uma atribuição pedagógica, esse não é o trabalho dele. Não sei por que não está no texto, que fala de gestão democrática na escola, mas só cita o diretor, não fala do coordenador", disse Cybele.

Evento de transição

Nos dias 6 e 7 de dezembro, secretários de Educação, prefeitos e vice-prefeitos eleitos, gestores e educadores de municípios da Chapada Diamantina e do semiárido baiano participaram do 2º Seminário de Transição Suprapartidária, realizado pelo Icep, na cidade de Seabra (a 468 km de Salvador).  A presidente da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), Cleuza Repulho, também participou do seminário.

No evento, equipes das secretarias municipais de educação que têm parcerias com o instituto apresentaram os avanços na área e também mostraram quais são os principais desafios para a próxima gestão.

As propostas apresentadas para os novos prefeitos ou vices foram discutidas nos Fóruns de Educação, que reúnem coordenadores pedagógicos, diretores escolares, professores, pais e demais representantes da comunidade.

No seminário também foi lançado o livro "Coordenador Pedagógico: Função, Rotina e Prática", com coordenação geral de Ana Inove e Cybele Amado e coordenação pedagógica de Beatriz Gouveia.

Icep

O Icep tem parcerias com municípios da Bahia, onde o projeto começou, e de Pernambuco. O instituto realiza um trabalho de apoio à formação continuada de educadores e gestores educacionais, bem como a criação e mobilização de redes colaborativas para o fortalecimento do ensino formal e das políticas públicas de educação.

O trabalho realizado na presidência e diretoria do Icep deu a Cybele Amado o prêmio Empreendedor Social 2012, promovido pela Folha de S. Paulo em parceria com a Fundação Schwab.

A sede do Icep fica no povoado de Caeté-Açu, também conhecido como Vale do Capão. O local é distrito rural do município de Palmeiras (a 422 km de Salvador) e marca o centro da Chapada Diamantina.




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