Erros em artigos científicos brasileiros são mais conceituais do que de expressão - Por Elton Alisson
A redação científica ainda
representa o “calcanhar de Aquiles” de muitos pesquisadores brasileiros.
E os
erros cometidos ao escrever uma tese ou artigo científico estão muito mais
relacionados a problemas de metodologia de pesquisa do que à falta de
habilidade com as palavras para apresentar os resultados de forma clara,
concisa e interessante.
A análise de Gilson Volpato,
professor do Departamento de Fisiologia do Instituto de Biociências da
Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Botucatu, está na sexta
edição revisada e ampliada do livro: Ciência: da filosofia à publicação.
Lançada no início de dezembro, a
edição acrescenta quatro novos capítulos aos nove da primeira edição, publicada
em 1998. Um deles apresenta um breve resumo da história da filosofia para
explicar por que a ciência é feita tal como é hoje, aceitando conclusões
apenas se forem baseadas em evidências empíricas (comprovadas
experimentalmente).
A ideia desse capítulo, segundo
Volpato, é demonstrar ao leitor o caráter indissociável entre a prática da
ciência e questões teóricas e filosóficas, e que só é possível fazer boa
ciência e escrever artigos para publicação em revistas de elevado fator de
impacto quando se tem uma boa formação filosófica e um entendimento muito
preciso dos conceitos científicos.
“É necessário ter uma compreensão
muito clara sobre o que é fazer ciência para realizar boas pesquisas, que
resultem em artigos sólidos para serem publicados em revistas de alto nível.
Não dá só para corrigir a ponta desse processo, a redação científica, sem ter
uma base bem fundamentada por trás disso”, disse Volpato à Agência FAPESP.
Especialista em redação e
publicação científica, o autor, que dá cursos na área e já auxiliou
pesquisadores brasileiros a reescreverem mais de 250 artigos científicos nas
áreas de humanas, exatas e biológicas, avalia que alguns dos artigos
publicados por cientistas do país apresentam muitos problemas estruturais.
Entre eles estão introduções que
não cumprem essa função, tabelas, gráficos e figuras incompreensíveis, métodos
duvidosos e dados que não corroboram as conclusões dos autores mas que, na
maioria dos casos, segundo Volpato, apresentam erros inerentes à própria
pesquisa.
“Se a pesquisa começou errada e é
ruim não tem como fazer mágica no artigo. Se o pesquisador estudou uma questão
irrelevante, por melhor que sejam os resultados, eles jamais resultarão em
artigos científicos que extrapolarão as fronteiras sequer de seu laboratório e
que dirá do Brasil”, disse.
Um dos principais erros
conceituais nos trabalhos publicados por alguns cientistas brasileiros, de
acordo com Volpato, é querer fazer ciência para solucionar problemas pontuais e
localizados, sem tratar o fenômeno geral, que justamente tem a capacidade de
resolver problemas pontuais.
Prova disso, de acordo com o
especialista, é que no próprio título de alguns trabalhos publicados ainda
aparecem o nome da instituição ou da cidade onde a pesquisa foi realizada e os
dados foram coletados, reforçando a ideia de que o estudo está circunscrito
àquele local.
“Para fazer ciência, realmente é
preciso de dados que são coletados de algum lugar. Mas o problema é que alguns
pesquisadores brasileiros coletam dados de um determinado lugar e só se
preocupam com aquele lugar especificamente”, afirmou Volpato.
“É muito diferente de pegar os
dados de um determinado lugar e construir uma ciência geral, que resolve
questões particulares, como pode ser visto em artigos publicados por cientistas
estrangeiros em grandes revistas científicas internacionais. Ainda falta esse
aprendizado e ousadia científica ao pesquisador brasileiro”, compara.
Questões pontuais
Segundo Volpato, alguns dos
fatores responsáveis pela ausência da ciência geral são a falta de formação
filosófica sobre o que é necessário para construir conhecimento e o fato de que
o Brasil ficou por muito tempo fechado para o mundo. Algumas áreas ficaram
dissociadas da ciência produzida no exterior.
Por outro lado, de acordo com
Volpato, outras áreas relacionadas à ciência básica, como imunologia, biologia
celular e física, sempre tiveram uma inserção internacional natural que
continuou e ganhou maior projeção na década de 1990 com os adventos da
globalização e da internet.
De acordo com o pesquisador, é
preciso rever esse conceito de se fazer ciência sob uma perspectiva
estritamente local para que se possa melhorar a qualidade dos artigos
científicos publicados por brasileiros e, consequentemente, aumentar a
publicação em revistas de alto fator de impacto e citação internacional.
“A redação científica é um forte
indicador sobre os conceitos científicos dos autores de forma que para
melhorá-la é preciso, primeiramente, corrigir os conceitos dos pesquisadores
sobre o que é fazer ciência”, disse. Volpato também é autor dos livros:
- Método lógico para a redação científica,
- Bases teóricas da redação científica,
- Publicação científica,
- Bases teóricas para redação científica,
- Administração da vida científica,
- Pérolas da redação científica,
- Dicas para redação científica,
- Lógica da redação científica e Estatística sem dor!.
O professor também divulga seu
trabalho no site www.gilsonvolpato.com.br , que oferece artigos, dicas e
reflexões sobre redação científica, educação e ética na ciência. O site dá
acesso a aulas on-line do curso: “Bases Teóricas para Redação Científica”,
apresentado por Volpato na Unesp.
Ciência: da filosofia à
publicação
Lançamento: 2012
Mais informações:
www.bestwriting.com.br
Fonte: http://agencia.fapesp.br
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