Em Fazenda Nova, PE, Parque das Esculturas mistura tradição e natureza - Por Katherine Coutinho
A cidade de Brejo da Madre de
Deus, no Agreste de Pernambuco, é conhecida pelo espetáculo da Paixão de Cristo
de Nova Jerusalém, realizado no maior teatro ao ar livre do mundo, no distrito
de Fazenda Nova, a partir desta sexta-feira (22).
A cidade-teatro, com seus
nove cenários, ocupa uma área de 100 mil metros quadrados, mas não é a única
atração do local. A aproximadamente dois quilômetros do teatro fica o Parque
das Esculturas Nilo Coelho, um espaço de 60 hectares dedicado à natureza e à
cultura.
A história dos dois locais é
intimamente ligada. Os mesmos canteis, artesãos que trabalham com pedras, que
atuaram na construção do teatro são responsáveis pelas 37 esculturas, que
variam de três a sete metros de altura.
“O então governador Nilo Coelho
perguntou ao meu pai [Plínio Pacheco, idealizador da cidade-teatro] o que seria
dos artesãos que trabalhavam na construção do teatro quando ele fosse
concluído. Foi então que surgiu a ideia do parque. Meu pai trouxe uma escultura
de madeira para servir de inspiração para as figuras gigantescas de pedra”,
explica Robinson Pacheco, presidente da Sociedade Teatral de Fazenda Nova
(STFN).
Os cerca de 50 canteis que
trabalharam na construção do teatro eram agricultores que moravam no entorno do
teatro, que foram tirados das roças e capacitados para trabalhar com pedra. O
primeiro deles foi Manoel Cazé, já falecido, que se transformou em um membro da
família.
“Ele morou durante 40 anos aqui no teatro. Formou praticamente todos
os canteis que trabalharam aqui, era um mestre mesmo. Tinha a paciência de
explicar o serviço”, recorda Robinson.
Na época da construção da
cidade-teatro, que começou em 1962, a tecnologia disponível era pouca e o
trabalho era feito de de forma rudimentar, por vezes perigosa, conta o filho de
Plínio Pacheco.
“Cazé chegou a chefiar 70 pessoas em uma pedreira. Certo dia,
retirando um bloco de pedra que tinha dois por dois metros de largura e umas 30
toneladas, a pedra 'escorregou' de onde estava. Ele não teve tempo para tirar o
pé e a pedra esmagou quatro dos cinco dedos. Foi operado, ficou bem, mas daí
você percebe o quão perigoso era”, explica Robinson.
A pedra dos muros e que compõe os
cenários do teatro é granito, retirado de pedreiras da região. O serviço era
sempre acompanhado muito de perto por Plínio Pacheco, um apaixonado pelo
projeto. “Aqui dentro desse teatro ele tinha ciúme de tudo, principalmente das
plantas. Tinha até uma placa que ele colocava 'não toque nas plantas e
flores'”, lembra o presidente da STFN.
O primeiro espetáculo encenado na
cidade-teatro foi em 1968, mas a construção ainda estava longe de terminar.
“Tinha apenas 15% do que hoje temos construído aqui. A cada ano, o teatro foi
crescendo. Alguns cenários exigiram mais atenção, mais trabalho em pedra, como
o palácio de Pilatos e o templo de Jerusalém”, explica Robinson.
Parque das Esculturas
Com a construção da cidade-teatro
chegando ao fim, o então governador Nilo Coelho e Plínio Pacheco se uniram para
não deixar os artesãos da pedra sem emprego. O projeto do Parque das
Esculturas, que foi inaugurado em 1985, era de 80 obras, mas acabou tendo
apenas 37.
“Papai teve a ideia de homenagear a cultura. Então, você tem nas
figuras manifestações como o bumba-meu-boi, o cavalo marinho, o frevo”, enumera
Robinson.
O ambiente repleto de palmas,
cactos e pedras é característico do Agreste pernambucano, um pouco mais seco
que o normal devido à falta de chuva. Ainda assim, a paisagem é inspiradora,
defende o eletricista Edmilson Fernandes, que mora em Fazenda Nova há 28 anos e
conta, orgulhoso, que decorou o nome de todas as estátuas.
“Eu gosto de vir
andar aqui, principalmente nos domingos. É bom para desopilar a mente. No
Recife, as pessoas têm o mar, a gente no interior tem a natureza”, acredita
Fernandes.
As obras estão divididas em nove
setores, de acordo com um tema, sempre ligado à cultura pernambucana ou
nordestina. A estátua 'O Peregrino', no setor nove, é uma das favoritas de
Fernandes.
“O peregrino é aquele cara sofrido, que anda por aí, é um sacrifício
grande. A perfeição dela me impressiona muito. E nessa época de seca, acho que
ela mostra como a gente se sente. Essa dificuldade de viver...”, explica o
eletricista.
No setor cinco, ficam as
esculturas de Lampião e Maria Bonita, que Fernandes nunca deixa de ver. “Minha
bisavó contava muitas histórias de Lampião. Ele era muito corajoso, andava pelo
meio do mato. Gosto de andar por aqui, conversar com Deus e também com as
estátuas. Elas guardam a nossa história, coisas que vêm desde os tempos dos
meus pais e dos pais deles”, afirma Fernandes.
Para Plínio Pacheco, não havia
escultura mais bela que a da 'Mulher do Pilão', uma das maiores do Parque e a
primeira que se vê assim que se chega ao local. “Meu pai gostava muito dessa,
tanto que falou para colocar logo no começo. Outra que ele gostava muito era a
'Colheiteira de Algodão'”, recorda o filho do fundador do Teatro.
A população no entorno é
apaixonada pelo espaço e costuma ficar atenta ao que acontece no Parque. “A
gente gosta, lógico. As crianças vêm para cá nos finais de semana, brincar,
correr. A gente fica sempre de olho, quando estavam retirando madeira das
árvores daqui, o pessoal logo denunciou. Temos que tomar conta, senão acaba”,
defende o morador de Fazenda Nova, Carlos Eduardo Alves.
Projeto
Após o término da construção da
cidade-teatro, os artesãos passaram 15 anos trabalhando com ajuda do governo do
estado, explica Robinson. “Eles sempre tinham encomendas. O governador dava de
presente para as cidades, para governos de outros estados. No Recife mesmo,
você pode ver obras desses artesãos, como a estátua na frente do [estádio]
Geraldão”, conta o presidente da STFN.
Depois, muitos acabaram migrando
para outras atividades e alguns poucos tentam manter a tradição, assim como
Robinson luta para manter a cidade-teatro funcionando o ano inteiro. Durante o
período do espetáculo da Paixão de Cristo, 1.200 funcionários atuam para que o
teatro esteja sempre impecável.
Fora desse período, o número de
pessoas é bem menor, cerca de 15 no teatro e 40 na Pousada da Paixão. “Temos
uma equipe de manutenção para o teatro, deixar todas as luzes acendendo durante
todo o ano. Tem ainda limpeza e irrigação, para os jardins estarem sempre
bonitos. Eles são responsáveis pelo teatro funcionar durante todo o ano”,
detalha Robinson.
Paixão de Cristo
O espetáculo deste ano estreia
nesta sexta-feira (22) e vai até o sábado (30). Com direção de Carlos Reis e
Lúcio Lombardi, o espetáculo que conta os últimos dias de Jesus tem mais de 500
atores e figurantes. No elenco, estão os atores globais Marcos Pasquim,
interpretando o rei Herodes; Carol Castro dando vida a Maria Madalena, e Carlos
Casagrande fazendo o papel de Pilatos. Entre os pernambucanos, José Barbosa faz
Jesus pela segunda vez e Luciana Lyra interpreta Maria.
Quem sai do Recife de carro ou de
ônibus tem duas opções: a BR-232 e a PE-90. Para quem vem de outros estados, há
as BRs 316, 116, 304, 101, 235, 110 e 104. Os ingressos estão à venda no
estande da Paixão de Cristo, localizado no 1° andar do Shopping Center Recife,
próximo aos cinemas. Também é possível comprar nas bilheterias da cidade-teatro
e no escritório de Nova Jerusalém, pelo telefone (81) 3732.1129.
Serviço:
Paixão de Cristo de Nova
Jerusalém
De 22 a 30 de março
Site oficial:
www.novajerusalem.com.br
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