a religião em alta - Por Alvaro Siviero
Insinua-se, em alguns setores da
opinião, uma inquietante prevenção contra a presença pública da religião, onde
se procura a defesa de espaços públicos neutros, “laicos”, livres de
contaminações religiosas.
Encontra-se de tudo: há quem afirme (como presenciei
nas redes sociais ontem) que “se o feto tem seus direitos, quero que meu baço
também tenha”.
Já vi gente, coerente no raciocínio “laico”, que sugeriram
arrancar o Corcovado. Outros sugeriram mudar os nomes das estações de metrô de
SP: Santa Cruz, São Judas, Conceição, Paraíso, São Joaquim, Sé, Santana, São
Bento… Há quem “permita” a liberdade religiosa desde que não sejam manifestadas
publicamente.
A sensibilidade laica vai mais longe, proibindo até mesmo
funcionários da administração pública de usarem peças que os identifiquem com
alguma religião. Assim aconteceu, em 1995, com Lúcia Dahab, professora, que
depois de se converter ao maometanismo começou a usar o véu islâmico. A
advogada muçulmana Zoubida Barik, em 2009, foi expulsa do estrado pelo juiz por
vestir esse véu.
É curioso que, numa sociedade em que cada um se veste como lhe
dá na veneta, se espalhe uma ideia que vem a dizer: “Vista-se como quiser,
desde que não seja porque o manda sua religião”.
Igreja (poder espiritual) e
Estado (poder temporal) são realidades distintas. O fato, desenvolvido com
maestria pelo cientista político Ibañez Langlois, nos leva a uma clara
conclusão: não pertence ao poder espiritual vínculos com a direita, nem com a
esquerda, nem com o centro. Nem com nada. Mas isso não significa que a Igreja
(poder espiritual) não tenha sua lição de casa: Langlois mostra, isso sim, o
dever do poder temporal em formar a consciência de seus fiéis para que façam
escolhas acertadas, do tipo que for, dentro de padrões éticos ou morais. Sendo
assim, não é função da Igreja determinar qual o melhor partido ou candidato.
Um
exercício de responsabilidade individual, de gente amadurecida e bem formada: é
aí que se encontra o alicerce de uma democracia liberal, conclui Langlois. E é
isso o que significa, corretamente, a palavra “laico” ou laicidade do
Estado. Laicismo, no entanto, é algo muito diferente. É a recusa em
aceitar que um cidadão participe legitimamente dos debates morais da atualidade, do tipo que for, caso exista nela alguma religião. A religião o
desautorizaria.
Não se fala aqui sobre a legítima separação que deve existir
entre Igreja e Estado mas, em realidade, em tentativa de criação de um Estado
ateu que, na verdade, também é antidemocrático, onde a Igreja e os crentes não
tem o direito de manifestar-se.
A Música é um oásis de união, de
respeito, onde compositores explicitam religiosidade. Bach em suas
Cantatas, em sua Missa em Si menor, em suas Paixão segundo São Mateus e Paixão
segundo São João, comove e transforma sons em ato de louvor explicito a Deus.
Em muitos manuscritos do gênio alemão vê-se a inscrição, feita pelo próprio
autor S.D.G. (Soli Deo Gloria). Mozart com sua Missa de Requiem,
Missa da Coroação K317, Missa Brevis, Missa Solemnis dá um show ao revelar que
a criatura é, de fato, criatura. Beethoven, em sua Missa Solemnis Op.123,
pergunta ao ouvinte:
“Sabe o que vai acontecer se você morrer hoje? O sol vai
nascer amanhã do mesmo jeito…”. Vivaldi, Haydn, Liszt, Schubert… uma lista
interminável. Se o laicismo histérico de muitos entrasse na música, entre
tantos outros desastres, a nota SI deveria mudar de nome, é mole? (Sancte Ioannes).
E fica a questão: em que creem os
que não creem?
Fonte: http://blogs.estadao.com.br
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