Primeira igreja evangélica brasileira era formada por índios, afirma estudo - Por Jarbas Aragão
No Brasil, como em alguns outros
países, o termo “evangélico” passou a ser sinônimo (e depois substituiu)
“protestante” ou “reformado”.
Oficialmente, a primeira igreja protestante (ou
evangélica) para brasileiros, fundada em 1858, era da denominação Congregacional.
Mas um novo estudo contesta, afirmando que foi em 1625.
Os registros históricos indicam
que os primeiros missionários protestantes chegaram aqui em 1557, enviados pela
Igreja Reformada Francesa. Dia 10 de Março daquele ano realizaram o primeiro culto
protestante no Brasil. Porém, enfrentaram forte oposição dos portugueses
católicos e nunca conseguiram fundar uma igreja.
No recém-lançado livro: “A
Primeira Igreja Protestante do Brasil”, a historiadora e professora cearense
Jaquelini de Souza procura provar que se trata da “Igreja Reformada Potiguara”.
Ela foi criada por índios durante as chamadas “invasões holandesas” no Brasil,
no século XVII. Cidades como Recife guardam até hoje as marcas desse período
conhecido como Brasil Holandês, que ocupou grande parte da região Nordeste
do Brasil, entre 1630 e 1654.
Segundo Jaquelini, a Igreja
Potiguara tinha esse nome por que teve início entre os índios de mesmo nome. Em
1625, numa frota aportaram holandeses, na Baía da Traição, na Paraíba. Entre
eles estavam missionários dispostos a evangelizar os nativos. Depois de alguns
meses, mandaram para a Holanda Pedro Poty e Antônio Paraupaba, duas das maiores
lideranças indígenas.
Chegando aos Países Baixos,
tiveram acesso à melhor educação formal e religiosa disponível. Convertidos ao
protestantismo, voltaram ao Brasil cinco anos depois, durante a chamada
“segunda invasão holandesa”. Eles fundaram com apoio holandês a igreja onde
desenvolveram um programa de discipulado e de formação de professores
reformados indígenas. Começaram a se desenvolver, reunindo-se nas aldeias e
fazendo batismos, casamentos, profissões de fé e celebrando a ceias do Senhor.
Embora não tivesse um prédio, “Já
era a Igreja Potiguara porque, teologicamente, havendo dois ou três reunidos em
nome de Deus, independentemente do lugar, está ali uma igreja”, explica a
historiadora.
A diferença do tratamento dos
protestantes holandeses era grande em comparação com católicos portugueses. A
educação do brasileiro nativo era pré-requisito para sua confissão de fé. Mas
“foi só depois da expulsão dos holandeses [em 1654] que vimos aflorar a
verdadeira Igreja Potiguara”, defende Jaquelini.
Forçados a sair do país pelos
portugueses, os holandeses deixaram um grupo de potiguares convertidos e agora,
sem supervisão. Muitos desses holandeses foram para a América do Norte, onde
fundaram a colônia de Nova Amsterdã, atual Nova York.
Por aqui, os índios continuavam
perseguidos pelos portugueses. Fugindo, caminharam cerca de 750 quilômetros a
partir do litoral pernambucano até o sertão na Serra da Ibiapaba, no atual
Estado do Ceará. Continuaram praticando a fé protestante e teriam feito
convertidos entre os índios tabajaras, que viviam ali. Paraupaba, nessa época,
tentava na Holanda, receber apoio para os refugiados, mas sem sucesso.
Apoiam esse fato, os relatos do
conhecido padre Antônio Vieira, jesuíta que relatou à Companhia de Jesus o que
acontecia na região. Ele chamou o lugar de “Genebra de todos os sertões”, em
referência à Genebra, na Suíça, o berço da Igreja Reformada. Em um trecho de
seu relato, Vieira explica que “muitos deles [os índios] tão calvinistas e
luteranos como se nasceram em Inglaterra ou Alemanha”.
É difícil identificar o que
restou dos índios da Igreja Potiguara após passarem seis anos de vida em
comunidade na Ibiapaba. O grupo acabou se desfazendo. Especula-se que alguns se
juntaram aos opositores dos portugueses na chamada “Guerras dos Bárbaros” de
1688. Outros teriam voltado ao catolicismo ou às religiões nativas.
Sabe-se que Pedro Poty foi
capturado pelos portugueses durante a Batalha dos Guararapes. Preso em
Pernambuco, acabou torturado para negar a sua fé. Não renegou e acabou morto.
Segundo Jaquelini, foi o primeiro latino-americano martirizado pela Igreja
Católica. O que ficará para história é que esses índios foram os primeiros
brasileiros protestantes, fundadores de uma igreja que possivelmente durou de
1625 a 1692. O livro de Jaquelini é baseado em sua tese de doutorado.
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