Católicos distantes da doutrina de uma Igreja cada vez mais dividida – Por Ana Fonseca Pereira
Os católicos do mundo aplaudem o
desempenho do Papa Francisco, mas estão em maioria os que discordam da doutrina
da Igreja sobre temas como o aborto, a contracepção ou o fim do celibato dos
padres, revela uma sondagem internacional divulgada neste domingo e que mostra
também grandes diferenças de opinião entre os fiéis dos vários continentes.
A sondagem, encomendada pela
estação norte-americana em língua espanhola Univisión, inquiriu 12 mil pessoas
em 12 dos países, com mais fiéis ou maior percentagem de católicos e surge em
antecipação ao questionário que o Vaticano enviou, no ano passado, às dioceses
de todo o mundo para saber o que pensam os crentes sobre as mudanças na
família, o divórcio e as uniões homossexuais.
Os resultados serão apresentados
antes do Sínodo extraordinário que Francisco convocou para Outubro e do qual
poderão sair mudanças na doutrina da Igreja, uma das mais faladas é a plena integração
dos divorciados que voltam a casar.
E se os resultados da sondagem
não trazem surpresas provam, por um lado, o enorme fosso que as mudanças da
sociedade nas últimas décadas cavaram entre o que a Igreja professa e aquilo em
que acreditam (e praticam) os fiéis.
Uma distância que varia segundo a idade e
o nível de prática religiosa dos católicos (quanto mais jovens e menos
praticantes mais liberais tendem a ser as posições), mas que tem nas diferenças
geográficas a sua maior condicionante.
“O que se deduz é que não há já
uma Igreja universal”, escreveu o jornal espanhol El País, notando que “os
fiéis africanos e asiáticos são mais conservadores em questões doutrinais do
que os latino-americanos e estes, por sua vez, são mais conservadores do que os
europeus em temas como o aborto ou a possibilidade de os padres casarem; mas
mais abertos ao casamento homossexual do que países como a Itália ou a
Polónia”.
Mesmo na América Latina, há grandes variações entre países, com os
católicos colombianos a oporem-se por larga maioria (71%) às uniões gay,
enquanto no Brasil e Argentina há um quase empate entre opiniões contra e a
favor.
O casamento entre pessoas do
mesmo sexo é, ainda assim, um dos poucos temas onde a opinião da maioria dos
fiéis se aproxima da posição defendida pelo Vaticano, com 66% dos inquiridos a
manifestar a sua oposição, uma percentagem que é esmagadora no caso da
República Democrática do Congo e no Uganda (98 e 99%, respectivamente);
enquanto Espanha é o país onde mais católicos se dizem favoráveis a estas
uniões.
Em sentido contrário, 78% dos fiéis defendem o uso de contraceptivos,
em claro desacordo com a doutrina do Vaticano, sendo nos países europeus e na
América Latina que o recurso à contracepção tem mais adeptos.
Em quase todas as outras questões,
concluiu-se que há enorme divergência de opinião entre os fiéis consoante os
países de origem, sendo o aborto aquele que mais divide continentes.
Se a nível
global, 65% dos inquiridos dizem que deve ser autorizado (8% em todos os casos,
57% em determinadas circunstâncias), nas Filipinas três em cada quatro
inquiridos dizem que essa nunca deve ser uma opção.
Em França, pelo contrário,
32% dizem que cabe à mulher decidir se quer ou não prosseguir a gravidez. A
mesma divisão é visível sobre o fim do celibato ou a ordenação de mulheres
(aceite pela maioria dos católicos na Europa e nos EUA) ou na aceitação que os
recasados possam comungar (maioritária também entre os latino americanos).
Juan Arias questionava-se no El
País sobre o que fará o Papa perante estes dados e os resultados que se
adivinham semelhantes do questionário que encomendou.
Francisco, de quem 87%
dos católicos dizem estar a fazer um trabalho bom ou excelente, optará por
escutar “os seus fiéis mais devotos ou as ovelhas mais distantes que parecem ao
mesmo tempo mais sintonizadas com os tempos actuais?”, pergunta o escritor,
sublinhando que, face à popularidade que tem junto de uns e outros, “o seu
desafio será descobrir como em matérias controversas contentar a todos”.
Fonte: http://www.publico.pt
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