Especialistas defendem currículo mais flexível nas universidades - Por Elton Alisson
As Universidades de Harvard e de
Stanford, nos Estados Unidos, iniciaram nos últimos anos a reforma curricular
de seus programas de graduação com o intuito de flexibilizar os currículos dos
cursos e propiciar aos estudantes uma formação mais sólida e diversificada,
entre outros objetivos.
Já no Brasil esse processo
enfrenta alguns obstáculos, como o conservadorismo das instituições e a
resistência dos docentes em mudar a forma tradicional de suas aulas, apontaram
especialistas participantes do simpósio Excellence in Higher Education,
ocorrido nos dias 23 e 24 de janeiro na FAPESP.
Realizado pela FAPESP em parceria
com a Academia Brasileira de Ciências (ABC), o encontro teve como objetivo
debater os determinantes da excelência no ensino superior no Brasil e formular
recomendações que poderão embasar políticas públicas.
“Há um grande conservadorismo das
universidades brasileiras em promover a reforma do currículo de seus cursos de
graduação que faz com que as instituições novas, com programas de graduação
recém-criados, tenham mais sucesso do que as instituições mais antigas nesse
aspecto”, disse Luiz Davidovich, professor da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (URFJ) e diretor da ABC.
“Em outros países, contudo, são
as instituições tradicionais que têm liderado as mudanças”, afirmou Davidovich,
na palestra que proferiu durante o evento.
De acordo com Davidovich, a
última reforma curricular da Universidade de Harvard foi iniciada no começo dos
anos 2000 e liderada por Lawrence Summers, reitor da instituição entre
2000 e 2006.
As mudanças no currículo dos
cursos de graduação da universidade norte-americana fizeram com que estudantes
da área de Ciências Humanas passassem a ser incentivados a visitar um
laboratório de Biologia, por exemplo, para conhecer o que ocorre em outras
áreas, contou Davidovich.
Além disso, passou-se a exigir
que os estudantes da instituição tenham de frequentar, pelo menos, um curso
como “Cultura e credo” e “Estética e interpretação”, entre outros.
O exemplo de Harvard foi seguido
por outras instituições norte-americanas, como a Universidade de Stanford, que
criou uma comissão, composta por professores de diferentes departamentos, para
estudar um novo currículo para a instituição.
Outros países, como a China,
também trilharam o mesmo caminho, promovendo mudanças nos currículos dos cursos
de graduação das universidades do país, para torná-los mais flexíveis e adiar a
especialização dos estudantes.
Em 1998, o número de
especializações oferecidas no país oriental foi reduzido de 504 para 249 e os
estudantes que ingressam em universidades como a de Xangai, por exemplo, podem
selecionar em que área vão se especializar após um ou dois anos de estudo,
contou Davidovich.
“As propostas do documento Subsídios
para a reforma da educação superior, que a ABC lançou há mais de dez anos, seguem
essa mesma linha de pensamento”, disse Davidovich.
De acordo com o professor,
algumas das propostas do documento são a introdução de ciclos de dois a três
anos para cursos de graduação, com a possibilidade de transferência entre
diferentes tipos de instituições, e a redução do número de horas em sala de
aula e de disciplinas obrigatórias, para estimular o trabalho fora da sala de
aula e dar mais tempo aos professores para lidar com alunos excepcionais ou com
problemas de aprendizagem.
O documento também propõe o
atraso da decisão de especialização dos estudantes e a maior flexibilidade no
currículo, em vez de introduzir novos cursos de graduação.
“A introdução de novos cursos de
graduação é uma praga no Brasil”, afirmou Davidovich. “Se surge uma área importante
do conhecimento, como nanotecnologia, logo se cria um novo curso de graduação
com esse foco no país”, exemplificou.
O currículo dos cursos de
graduação oferecidos pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos
Estados Unidos, por exemplo, é composto por um conjunto de disciplinas básicas
e uma série de outras eletivas, apontou Davidovich.
“Nanotecnologia é uma disciplina
do curso de graduação em Física do MIT, assim como Filosofia e História da
Ciência”, disse o especialista. “Esse eixo fundamental enxuto do cursos permite
acrescentar essas disciplinas eletivas e diversificar a formação dos alunos”,
apontou.
Experiências no Brasil
No Brasil, uma das instituições
que apostaram nesse tipo de currículo diferenciado foi a Universidade Federal
do ABC (UFABC). O currículo do curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia
oferecido pela universidade fundada em 2005 é composto por um ciclo básico de
disciplinas fundamentais.
Após concluir o número requerido
de créditos, o aluno obtém o diploma de Bacharel em Ciência e Tecnologia,
habilitando-se a prosseguir os estudos de graduação em Engenharia, Ciências da
Natureza, Matemática ou Ciência da Computação.
Também há a possibilidade de o
aluno fazer o mestrado na própria universidade ou de se transferir para cursos
de formação superior em outras instituições nacionais e internacionais.
“A ideia não foi mudar o
currículo essencial, mas reorganizá-lo em linhas temáticas mais adequadas ao
mundo que a gente vive, tais como ‘Estrutura da matéria’, ‘Energia’, ‘Processos
e transformações’, ‘Comunicação e informação’ e ‘Modelagem matemática’",
contou durante o evento na FAPESP Luiz Bevilacqua, reitor da UFABC no período
de 2007 a 2008, que participou do desenvolvimento do projeto pedagógico da
universidade.
“Os currículos dos cursos de
graduação oferecidos pelas universidades brasileiras precisam ser
flexibilizados porque o estudante não sabe exatamente o que quer quando entra
na universidade e um currículo mais flexível permite que eles sejam livres para
fazer suas próprias escolhas”, avaliou Bevilacqua, durante sua palestra proferida
no evento.
A estrutura curricular dos cursos
de Engenharia da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP)
também foi flexibilizada nos últimos anos, contou José Roberto Cardoso, diretor
da instituição.
Atualmente, os ingressantes nos
cursos de Engenharia da instituição têm a possibilidade de realizar até 15% do
curso onde desejarem. Além disso, a instituição tem discutido a possibilidade
de diminuir a carga horária de 28 horas por semana de hora-aula que os
estudantes enfrentam atualmente.
“Com essa carga horária semanal
de aulas, que vem de longa data, o aluno não consegue ter tempo para praticar
um esporte ou aprender um novo idioma, por exemplo”, disse Cardoso durante sua palestra
proferida no evento.
“Estamos em processo de redução
dessa carga horária para uma quantidade de horas razoável e também torná-la
mais flexível”, afirmou.
Fonte: http://agencia.fapesp.br
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