Há cada vez mais padres a deixar a Igreja para casar
O número de padres que deixam o
sacerdócio para casar está aumentar em Portugal, ultrapassando já os 400,
segundo o movimento Associação Fraternitas, que está preocupado com o abandono
repentino e o corte definitivo com a Igreja de alguns sacerdotes.
"Tem vindo a aumentar o
número de padres que pediram a dispensa. Os números andam acima dos 400",
disse à agência Lusa Fernando Félix Pereira, presidente do movimento Associação
Fraternitas, que congrega e apoia padres que pediram a dispensa do sacerdócio,
quer seja para casar ou não.
Fernando Félix Ferreira, de 44
anos, pediu em 2000 dispensa do sacerdócio para casar, num processo que durou
cerca de ano e meio e foi acompanhado por um padre jesuíta. O presidente da Fraternitas
mostra-se preocupado com a atual tendência de abandono repentino e de corte
definitivo com a Igreja de alguns padres.
"Temos assistido nos últimos
tempos a um fenómeno que nos preocupa que é o da autodispensa: sacerdotes
jovens e outros menos jovens que simplesmente abandonam o ministério e não
querem fazer qualquer processo a pedir a dispensa", adiantou. Destacou ainda que, quando
confrontados com a reconciliação da vida na Igreja, estes padres respondem com
"um 'não' taxativo".
Fernando Felix Ferreira diz não
ter números globais sobre esta tendência, mas adianta que recentemente na
diocese de Santarém seis padres abandonaram o sacerdócio de um dia para o
outro. O movimento Associação
Fraternitas congrega atualmente 115 padres que pediram dispensa sacerdotal e é
reconhecida pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP).
A associação defende que os
padres possam optar entre serem solteiros ou casarem, mas quer também abrir o
sacerdócio e a Igreja a homens casados que gostariam de ser padres. Por isso, as recentes palavras do
papa Francisco que afirmou que o celibato dos padres não é um "dogma de
fé" na Igreja Católica, que há sacerdotes casados nos ritos orientais e
que "a porta está sempre aberta" para tratar o tema, foram bem
recebidas pela associação.
"Uma decisão vinda do alto
iria provocar divisões. Algo sensato que vai surgir deste sínodo da família
[convocado pelo papa para outubro] é que cada igreja local faça o seu caminho e
que cada diocese veja se é possível haver padres casados ao lado de padres
celibatários. Que haja uma espécie de processo progressivo, pedagógico para que
as pessoas se vão habituando", defendeu.
O presidente da Fraternitas
considera que o papa Francisco está a devolver aos países as decisões que
estavam concentradas na Cúria Romana, mas está convencido que em Portugal esta
questão não será "resolvida pacificamente". "Os bispos portugueses são
bastante dependentes das decisões do Vaticano [...]e têm muita dificuldade em
ser pioneiros", disse, ressalvando as exceções dos bispos de Viseu, Ilídio
Pinto Leandro, ou o bispo emérito de Fátima, Serafim Ferreira da Silva.
As palavras do papa Francisco
podem incentivar o processo de abertura da Igreja a padres casados e há outros
indicadores de que essa mudança pode avançar. "Temos feito um estudo a
partir de cada documento que cada padre recebe do Vaticano quando pede a
dispensa das obrigações sacerdotais. Antes chamava-se 'redução ao estado
laical' e muita gente entendia que o padre que pede a dispensa passa a ser
leigo. Houve mudanças e deixou de haver essa expressão para dizer apenas
"'dispensa das obrigações sacerdotais' e com isto reconhece-se que o padre
continua padre para toda a vida", explicou.
O primeiro documento proibia
nomeadamente os padres de darem aulas em universidades católicas e seminários,
de dirigir atos litúrgicos ou de fazer homilias. Com o novo texto, passou-se,
segundo o presidente da Fraternitas, para outro contexto onde se valoriza
"o curso de teologia, a experiência de família para a catequese, para
trabalhar com casais ou com jovens".
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