Mesmo debaixo de fogo, cristãos não abandonam civis em Gaza - Por Filipe d’Avillez
A única igreja católica já sofreu
danos por causa dos ataques. O padre não quer evacuar a igreja e a escola, onde
estão milhares de pessoas. “Para onde levavam esta gente toda?", diz
o director da Cáritas Jerusalém.
Milhares de pessoas estão
refugiadas nas duas igrejas cristãs e respectivas escolas da Faixa de Gaza. São
refúgios frágeis e que não escapam aos ataques dos últimos dias. Embora não
tenha sido atingida directamente, a Igreja da Sagrada Família, católica, sofreu
danos materiais durante a última madrugada. Não há vítimas a lamentar.
A igreja "fica na zona alta
de Zeitoun e todo esse bairro tem estado sob fogo há uma semana”, conta, ao
telefone com a Renascença, o director da Cáritas Jerusalém, o padre Raed
Abusahliah.
"Os residentes receberam
recentemente mensagens escritas do exército israelita para abandonarem a área,
mas o pároco não quis evacuar a igreja e a escola porque eles têm também as
irmãs da Madre Teresa que cuidam de 28 deficientes e nove idosos. Mesmo que
saíssem, para onde levavam esta gente toda? Por esta razão, preferem
permanecer", explica.
A população cristã em Gaza
limita-se a cerca de 300 famílias, divididas entre uma paróquia católica e
outra ortodoxa, mas há muitos anos que as organizações eclesiais desempenham um
papel naquela região maior do que a sua representatividade.
Os que estão na Igreja da Sagrada
Família recebem ajuda da Cáritas local. Sedeada em Jerusalém, a Cáritas opera
várias clínicas em Gaza e presta apoio humanitário.
Situação "potencialmente
catastrófica"
Outra organização que presta
auxílio a milhares de pessoas em Gaza é a Catholic Relief Services (CRS),
financiada pela Conferência Episcopal dos Estados Unidos. Com vários trabalhadores no
terreno, as operações são coordenadas também a partir de Jerusalém pelo
norte-americano Matthew McGarry.
Explica que a situação em Gaza é
"insustentável" durante muito mais tempo. "Está verdadeiramente
horrível e está a piorar. Gaza é um local difícil, mesmo nas circunstâncias
consideradas normais, mas, com o agravamento da situação nas últimas semanas,
os danos à central energética, a dificuldade em introduzir bens e a mera
quantidade de pessoas deslocadas está a tornar-se uma situação verdadeiramente
insustentável, potencialmente catastrófica."
A CRS emprega pessoas de
diferentes religiões em Gaza e McGarry explica que tanto cristãos como
muçulmanos são afectados da mesma forma pela guerra:
"Temos uma
funcionária que perdeu vários membros da família num ataque aéreo, temos muitos
que tiveram de sair de casa e ir viver com parentes, porque as suas casas foram
atingidas. Uma das estagiárias num programa que gerimos, de criação de emprego
para pessoas com dificuldades auditivas, morreu em casa. Este é um conflito que
atinge toda a gente em Gaza".
Um conflito sem solução militar
O padre Raed Abusahliah é natural da Cisjordânia, mas diz que, mesmo na Faixa de Gaza, controlada actualmente pelos islamitas do Hamas, os cristãos sentem-se parte da população. O cansaço da comunidade é evidente. O sacerdote teme que, caso a situação não se resolva, acabem por fugir de Gaza, deixando o território sem cristãos.
Uma solução, para o director da
Cáritas local, terá de passar necessariamente por um acordo sob a supervisão da
Autoridade Nacional Palestiniana:
"A melhor solução para todos passa por
ambos os lados, sob a supervisão da Autoridade Palestiniana, sentarem-se e
negociarem e resolverem a raiz deste conflito, a ocupação, que deve terminar
logo que possível."
"Infelizmente temos mais de
1250 mortos entre os palestinianos em Gaza. A maioria são mulheres, crianças e
idosos, pessoas inocentes. Mais de sete mil ficaram feridos e mais de 250 mil
abandonaram as suas casas e vivem em escolas das Nações Unidas, por isso é uma
crise humanitária enorme. Do lado israelita também houve baixas, principalmente
entre militares, e toda a sociedade israelita vive debaixo de medo,
aterrorizada", diz.
"Não existe uma solução
militar para este conflito. Israel, com todo o seu poderio militar, não
consegue controlar a vontade de toda uma nação que quer ser livre",
conclui o padre Raed Abusahliah.
Fonte: http://rr.sapo.pt
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