Será que diabo poderá salvar yazidis do segundo genocídio? – Por Mario Sommossa
Há muito que o mundo não notava
sua existência, mas os yazidis, povo pouco numeroso que no decorrer de vários
milênios de anos professa sua religião, voltaram a atrair atenção tornando-se
vítima da tentativa de genocídio.
Combatentes do movimento sunita
extremista Estado Islâmico do Iraque e do Levante submeteram ao seu controle
vastos territórios no norte do Iraque. Segundo os últimos dados das autoridades
iraquianas, os extremistas mataram não menos de 500 curdos yazidis e
sequestraram cerca de 300 mulheres.
Nos últimos anos, consegui travar
conhecimento com alguns deles, homens e mulheres, mas foram eles próprios que
me revelaram terem professado uma religião yazidi. Quero dizer que não são
mórmons ou amish que não podem ser confundidos com outros povos, mesmo quando
vivem separados de sua comunidade.
Os yazidis, enquanto não praticarem seus
ritos, não se distinguem de pessoas comuns. Não tem estilo especial de
vestir-se ou de pentear-se. Muitos deles abandonaram por sua própria vontade
sua terra e mudaram para outros países, partindo em busca de trabalho.
Embora a religião desse povo seja
uma das mais antigas no mundo (o primeiro ano de sua cronologia corresponde ao
nosso ano de 4750 a.C.), ou, talvez, nomeadamente por esta causa, esse culto é
um exemplo de sincretismo, que, com o passar dos tempos, absorveu muitos
elementos de religiões de outros povos contatados pelos yazidis.
O mesmo
aconteceu com o Judaísmo que assimilou de Zaratustra conceitos do Bom e do Mal,
de eterna delícia e de eterno suplício, ou seja de Paraíso e de Inferno. O
Cristianismo, também, leva origem principalmente da religião hebreia antiga e
reflete alguns ritos pagãos, tanto que as raízes do Islã ascendem a mitos
hebreus e cristãos.
A religião dos yazidis está
ligada principalmente ao Zoroastrismo (conceitos professados por Zaratustra),
absorvendo ritos e crenças tanto do Islã como do Cristianismo e dos adeptos de
Cabala, assim como de hebreus e muçulmanos (os yazidis praticam circuncisão).
De acordo com o culto dos
yazidis, o Criador é único, mas existe também um anjo mau, o diabo encarnado em
pavão que traz mal. Tanto que o Criador é humano pela sua natureza e
autossuficiente, não tem sentido venerá-lo, devendo fazer orações ao diabo e
oferecer-lhe sacrifícios, para que ele domine seu temperamento furioso e se
torne mais bondoso em relação aos humanos.
Por mais estranho que nos pareça,
este culto tem a sua lógica: enquanto existem o Bem e o Mal, devemos
precaver-nos do Mal e uma oração nesse sentido não é um sinal de adoração, mas
é um apelo à clemência.
Contudo, os islamitas mais
irreconciliáveis consideram os yazidis como adeptos do diabo, isto é cruéis
pela natureza, explicando assim os atos em relação aos yazidis por parte de
integralistas islâmicos.
Na realidade, os yazidis,
seguindo sua religião, sempre foram pacíficos e tolerantes. Diferentemente dos
cristãos, eles nunca foram missionários, não tentando impor suas convicções a
outros povos.
Na hierarquia interna, os yazidis fazem diferença entre o poder
secular e religioso. Recentemente, o atual Dalai Lama também falou sobre a
necessidade de fazer tal distinção.
Os yazidis são monógamos diferentemente dos
muçulmanos, embora seus chefes possam ter vários cônjuges. Geralmente, não se
casam com representantes de outras religiões e nunca oram na presença de
outros. Devem orar duas vezes ao dia, dirigindo-se ao sol ou ao lar. Sábado
para eles é um dia de descanso e quarta-feira é um dia verdadeiramente sagrado.
Alguns yazidis rígidos acreditam
em que, embora o Criador seja único, existem ainda seis deuses. Consideram
ainda que após a morte seja possível a reencarnação espiritual.
Tanto que os yazidis não admitem
a conversão de pessoas que professam outras religiões à sua crença, o futuro
numérico desse povo é confuso. Como se estima, hoje há de 400 a 800 mil
yazidis, cerca de 300 mil dos quais vivem no território do Iraque entre Mossul
e Sinjar, onde foram atacados por terroristas do Estado Islâmico do Iraque e do
Levante. Os restantes estão concentrados nos países do Oriente Médio e em
outras partes do mundo. Na Alemanha, onde vivem 30 mil yazidis, um deles, já
naturalizado como cidadão do país, até foi eleito deputado do Parlamento
Europeu.
Esta não foi a primeira tentativa
de exterminar o povo dos yazidis. Foi o Império Otomano que tentou fazê-lo
ainda no fim do século XIX, massacrando naquela vez vários milhares de yazidis.
Mas na altura os turcos não conseguiram exterminar todo o povo que restabeleceu
gradualmente seu número populacional. Gostaríamos de acreditar que desta vez
também seja assim.
Fonte: http://portuguese.ruvr.ru
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