Vila Euclides é morada de comunidade muçulmana – Por Vanessa de Oliveira
Um bairro na região central de
São Bernardo, mas marcado pela presença de pessoas vindas de países como Arábia
Saudita, Síria, Líbano, e que têm como religião o islamismo.
Essa é a Vila
Euclides, onde estima-se que, das cerca de 600 famílias muçulmanas que vivem no
município, um terço reside na área.
O sheik Jihad Hammadeh, 49 anos,
de origem síria, é líder muçulmano não apenas local, mas porta-voz da
comunidade islâmica no Brasil. Ele conta que a imigração árabe em solo
brasileiro vem de longos tempos.
“Vieram para cá buscando uma qualidade de vida
melhor e, muitas vezes, fugidos de guerras. Muitos escolheram o Brasil por
conta da visita do imperador Dom Pedro II aos países árabes, que abriu as
portas do País para os imigrantes. A maior parte se estabeleceu primeiro em São
Paulo. Trabalhavam como mascates, iam até as fazendas para vender seus
produtos, e o Grande ABC tinha muitas dessas propriedades. Assim começaram a se
estabelecer e foram crescendo junto com a população”, explica Hammadeh.
A religião islâmica é constituída
por seis pilares, entre os quais a crença em um deus único. “Acreditamos que
Deus não gerou nem foi gerado, Ele é único, é o criador”, destaca o sheik.
Outro ponto são os livros sagrados, um deles o Alcorão, revelado ao profeta
Muhammad (nascido após a morte de Jesus). “O Alcorão é o código de vida do
muçulmano, serve como uma Constituição. Acreditamos que são as normas que Deus
estabeleceu para que o ser humano pudesse encontrar a felicidade.”
Dos pilares da religião estão
ainda a crença nos anjos, nos profetas (mensageiros enviados por Deus, entre os
quais Jesus e Muhammad), no destino (aquele que Deus escolheu e o escolhido por
nós) e no juízo final.
O islamismo ganhou destaque no
Brasil em 2001, com a exibição da novela O Clone, da qual Hammadeh participou
como consultor da autora Glória Perez.
Guerra
Quem vive na Vila Euclides deixou
para trás cenário desolador provocado por conflitos religiosos, parte deles por
pessoas que se dizem adeptas ao Islã. A situação gera preconceito.
“Por conta
da pouca literatura e parte da mídia internacional fazendo a divulgação
negativa, associando o terrorismo ao islamismo, há uma ideia negativa da
religião. Por outro lado, quando se fala que os muçulmanos são terroristas,
cria dentro do imaginário das pessoas uma curiosidade, elas querem saber quem é
esse bicho-papão e buscam informações. Assim se dão conta de que a religião
islâmica é de Deus e Deus é paz. Os erros de alguns adeptos são problemas de
caráter do ser humano”, garante o sheik.
Colégio islâmico ensina Árabe e princípios a alunos
Os princípios do islamismo também
estão presentes na Educação oferecida pelo Colégio Medina, na Rua Ruy Barbosa.
A escola particular tem 164 alunos com idades entre 2 e 14 anos, e trabalha os
conceitos não apenas para os que são muçulmanos, como também para os 22
estudantes não adeptos da religião.
Além das tradicionais matérias
lecionadas por qualquer instituição de ensino, as crianças e adolescentes têm
aula diária de Árabe, com duração de 50 minutos. Hanan Najib Mourad, nascida no
Líbano, é um dos quatro docentes do idioma.
“Para os alunos que não conhecem a
língua, é bom ensiná-los até os 7 anos, pois nessa idade eles captam mais
fácil”, explica.
Outra disciplina que integra a
grade escolar, do 1º ao 5º ano, é denominada Valores, passada duas vezes por
semana.
“Por bimestre, dividimos os valores (cooperação, fé, felicidade,
simplicidade, respeito, honestidade, amor) e a professora tenta enfatizá-los
fazendo atividades com jogos cooperativos, brincadeiras, contando histórias que
os levem à reflexão. Hoje o mundo mostra que felicidade é ter, consumir, e a
nossa proposta é mostrar que estar feliz é estar junto às pessoas que amamos,
não importa onde”, fala a coordenadora pedagógica Rosa Aparecida de Faria, 48
anos.
Os profissionais da escola não só
ensinam como conhecem um pouco mais da realidade vivida por muitos estudantes
antes de chegarem ao Brasil. “Quanto dá algum trovão, por exemplo, vemos o
desespero de alguns pensando que é uma bomba”, relata.
Os funcionários aprendem costumes
do povo muçulmano e os levam como lição de vida. “No Ramadã (mês no qual as
pessoas se abstêm, desde o raiar da aurora até o pôr do sol, da ingestão de
qualquer alimento e bebida) eles têm essa atitude porque precisam sentir o que
sentem os que não têm água e comida, para valorizar e agradecer a Deus por
aquilo que possuem. Isso é lindo”, afirma Rosa.
Mesquita construída em 1989 é atrativo histórico
Inaugurada em 1989, a mesquita
Abu Bakr Assidik, localizada na Rua Henrique Alves dos Santos, é o principal
ponto de encontro dos muçulmanos residentes em São Bernardo e na região do
Grande ABC, além de atrativo histórico municipal. A exuberância da construção
se destaca por duas torres com 27 metros de altura cada.
Às sextas-feiras é realizada
reunião semanal obrigatória para os homens, às 13h. Inicialmente, há um sermão
de aproximadamente 20 minutos, seguido de oração e confraternização.
Por dia, cinco orações devem ser
feitas, nos seguintes horários: 5h30, 12h30, 16h, 18h10 e 20h. No caso do homem
estar distante da mesquita em um desses momentos, deve rezar onde quer que
esteja.
As mulheres não se juntam aos
homens no momento das orações, para evitar distração de ambos. Elas podem rezar
em qualquer lugar, não sendo obrigadas a frequentar o local, mas possuem um
espaço exclusivo, espécie de mezanino instalado acima do salão dos homens.
Com capacidade para 1.000
pessoas, projeto prevê a ampliação da área devido ao crescimento de muçulmanos
que procuram a mesquita.
O templo é mantido pela Sociedade
Islâmica de Beneficência Abu Bakr Assidik, nome do primeiro califa do Islã,
companheiro do profeta Muhammad e professa o lema Em nome de Deus clemente e
misericordioso. Lá, por meio da Sociedade Islâmica, também são oferecidos
ensino da religião e diversas atividades culturais.
Estádio foi palco de atos políticos e lutas sindicais durante a
ditadura
Embora seja um bairro com forte
presença muçulmana, a Vila Euclides foi cenário de um dos momentos mais
marcantes da história brasileira. O Estádio 1º de Maio, localizado na Rua Olavo
Bilac, sediou não apenas jogos de futebol, mas também inúmeros atos políticos e
protestos de trabalhadores.
Inaugurado em 20 de agosto de
1968, o espaço ganhou notoriedade 11 anos depois, com a maior greve do País,
que atraiu ao local mais de 70 mil metalúrgicos do Grande ABC.
A área foi tomada pela polícia,
que reprimiu os grevistas, liderados pelo então metalúrgico Luiz Inácio Lula da
Silva.
No dia 30 de janeiro de 2011, na
condição de ex-presidente do Brasil, após oito anos de governo, Lula voltou ao
1º de Maio, em duelo entre São Bernardo e Corinthians, pela quinta rodada do
Campeonato Paulista. Na ocasião, a convite da Prefeitura, ele reinaugurou o
estádio, que tem capacidade para 17 mil pessoas.
Fonte: https://www.dgabc.com.br
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