Crimes de ódio – Por Fernanda Palma
A ética democrática assenta no
respeito pelas convicções não criminosas dos outros.
A fronteira entre liberdade de
expressão e a prática de crimes é traçada pela natureza e pelo grau de dano
causado a direitos fundamentais como a honra, o bom nome e a intimidade.
Nesse conflito, deve fazer-se um
balanceamento, assegurando a máxima extensão para todos os direitos envolvidos.
Nenhum direito fundamental pode ser eliminado em nome do bem comum. A liberdade
de imprensa justifica-se não só pelo interesse público na informação, mas
também para permitir a intervenção de cada cidadão.
Sem liberdade de imprensa, não é
concebível uma verdadeira democracia representativa. Em face do atentado
praticado contra o ‘Charlie Hebdo’, importa observar que a liberdade de
imprensa desempenha dois papéis essenciais em relação à liberdade religiosa.
Permite que as religiões e os
seus críticos se manifestem e cria as condições que impedem as discriminações
religiosas. Após o atentado, muitos jornais homenagearam as vítimas, publicando
as caricaturas.
Porém, o jornal dinamarquês que
as publicou em primeiro lugar absteve-se de o fazer agora, por razões de
segurança. E um jornal norte-americano recusou-se a publicá-las, por as
considerar insultuosas.
Para quem considere que as
imagens podem ferir sentimentos religiosos, a última posição pode
justificar-se, embora se confunda com uma cedência ao terrorismo. Na verdade,
ela permite traçar a fronteira entre a liberdade de imprensa e um involuntário
incitamento ao ódio e à discriminação religiosa.
Nesta ocasião, o interesse da
comunidade internacional é isolar os terroristas, separando-os das pessoas que
professam uma religião e praticam pacificamente um culto.
Esta é uma posição racional, que
não idolatra uma religião, mas compreende que todas as liberdades devem ser
harmonizadas. Em Portugal, tem sido possível conviver civilizadamente com
religiões e ateísmos.
Religiosos e não religiosos
desfrutam do seu espaço próprio. A ética democrática é uma moral mínima, sem
conteúdo religioso, mas assenta num princípio forte: o respeito pelas
convicções não criminosas dos outros.
Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt
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