Papa aprova beatificação de Óscar Romero e fortalece concepção de ‘Igreja para os pobres’ - Por Marcela Belchior
Vinte e um anos após iniciado o processo, o Papa Francisco aprovou nesta terça-feira, 03 de fevereiro, o decreto para a beatificação do arcebispo salvadorenho Óscar Arnulfo Romero, conhecido defensor dos pobres e expoente da Teologia da Libertação na América Latina, assassinado no altar de uma igreja em 1980, por um comando de extrema direita, enquanto celebrava uma missa.
Segundo o Vaticano, ainda nesta quarta-feira, 04, será anunciada a data da cerimônia para beatificar o eclesiástico.
O processo tramitava desde março de 1994. Nos últimos anos, enfrentou uma fase de paralisação.
Observadores do Vaticano explicam que a Igreja temia que a atuação do arcebispo fosse associada à Teologia da Libertação, movimento de teologia política que interpreta os ensinamentos de Jesus Cristo em torno da libertação de injustas condições econômicas, políticas e sociais, optando pela defesa dos oprimidos.
Durante os pontificados de João Paulo II (1978-2005) e Bento XVI (2005-2013), esse viés teológico foi fortemente rejeitado pela Igreja. Com a eleição do Papa Francisco (2013), no entanto, o processo foi acelerado.
Com a aprovação do decreto, Dom Romero é reconhecido como mártir. Em informe, o Vaticano ressaltou a relação entre Francisco e a atuação arcebispo:
"O mundo mudou muito desde aquele longínquo 1980, mas o pastor de um pequeno país da América Central fala mais forte. Não deixa de ser significativo que sua beatificação tenha lugar enquanto na cátedra de Pedro está, pela primeira vez na história, um papa latino-americano, que quer uma 'Igreja pobre para os pobres’. Há uma coincidência providencial”, divulgou a Igreja Católica.
A luta do arcebispo
No próximo dia 24 de março, completam-se 35 anos da morte do eclesiástico. Nessa data, em 1980, que era um Domingo de Ramos, Dom Oscar Armulfo Romero foi atingido com um disparo no coração por um atirador do exército salvadorenho, enquanto celebrava uma missa na capela do hospital da Divina Providência, na Colônia Miramonte, em San Salvador, capital salvadorenha.
Ele foi perseguido durante a Guerra Civil do país, conflito armado que se estendeu de 1980 a 1992 entre o governo de direita e a guerrilha de esquerda, deixando 75 mil mortos.
Progressista latino-americano, Dom Romero assumia postura de defesa dos índios, pobres e perseguidos políticos pelas milícias paramilitares. Semanas antes de sua morte, Monsenhor Romero intensificou as denúncias contra o governo salvadorenho e militares por violações aos direitos humanos no país.
No esforço contra a repressão, o religioso chegou a pedir aos Estados Unidos que interrompessem a ajuda militar a El Salvador. Os EUA, que temiam o avanço de processos semelhantes ao da Revolução Cubana na América Latina e ameaçassem sua política econômica imperialista, apoiavam as forças governistas salvadorenhas e financiavam a repressão, transferindo em torno de US$ 7 bilhões às forças estatais e não estatais durante um período de 10 anos.
Pela luta, Dom Romero tornou-se um dos símbolos da Teologia da Libertação na América Latina. Até hoje, o crime não foi julgado pelo Estado de El Salvador. A Lei de Anistia do país, assinada em 1993, deixou centenas de crimes, inclusive o assassinato do arcebispo, sem aplicação da Justiça.
Um informe da Comissão da Verdade do país aponta o militar e fundador do Partido ARENA (Aliança Republicana Nacionalista) Roberto D'Aubuisson Arrieta, morto em 1992, como um dos mentores do crime.
Outros três beatos
Além do reconhecimento de Dom Romero, o Papa Francisco ordenou a beatificação como mártires de três sacerdotes missionários assassinados no Peru, em 1991, por membros do grupo de extrema esquerda maoísta Sendero Luminoso.
Dois deles eram poloneses, Michal Tomaszek e Zbigniew Strzalkowski, de 31 e 33 anos de idade, respectivamente, pertencentes à Ordem dos Frades Menores Conventuais. O outro mártir é o sacerdote missionário italiano Alessandro Dordi, morto com três disparos com arma de fogo.
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