Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais quer tornar a benzeção patrimônio imaterial - Por Miriam Santos
A prática tem origem em várias
religiões e é considerada um dom entre os benzedores.
"Eu benzo a sua casa com
arruda e ar de cheirar guiné
Quem tiver olho não há de enxergar ocê
Eu benzo ocê contra depressão, contra neura
Chego a sua espinhela no lugar
Divino Pai Eterno vai dar ocê tudo de bão
Saúde, paz, tranquilidade e união..."
Em Minas Gerais, a benzeção é
considerada um dom que passa de geração em geração. A tradição é tão forte que
motivou um inventário do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e
Artístico.
O Iepha quer registrar o ato de benzer como patrimônio imaterial
do estado. O instituto pretende identificar o número de benzedores, as formas
de benzer e, sobretudo, perpetuar a simbologia deste ofício, como explica o
gerente do Iepha, Luiz Gustavo Mundim.
"Quando a gente pesquisa um
bem cultural, a intenção é que gente consiga fazer com que as condições de
existência para que ele aconteça se reproduzam. Esses valores culturais são
muito importantes para a identidade desses grupos e da própria população de
Minas Gerais".
Dor de cabeça, energias ruins,
dificuldade amorosa, doença de pele, tudo se desfaz em meio à fé,
incorporada na voz de Mário Braz da Luz, que pede ajuda aos santos para afastar
o mal.
"Tem gente do olho ruim,
né? Eu tenho que gastar três dias para benzer para tirar. Passa
tudo pra mim, Nossa Senhora é que tira. Antes de eu benzer, eu peço a ela: me
livra de todo o mal".
Com terço nas mãos, sentado num
banco de madeira nos fundos da casa, Mário invoca bençãos divinas sobre aqueles
que pedem força e proteção espiritual. A benção pode ser dada através de
amuleto, planta, carvão, medalha e demais objetos que variam de acordo com a
necessidade da pessoa. Aos 82 anos, 35 deles dedicados à prática de benzedor,
Mário aprendeu tudo com a irmã, também benzedora.
"Graças a Deus, a minha fé
tem derrubado montanha". Mário trabalha das 8h às 17h e
atende, em média, 40 pessoas por dia. O industriário Abel
Beneveduto traz a filha Valentina de 2 anos com frequência para receber as
bençãos de Mário. Ele diz que as orações fortalecem a alma.
"Isso acaba fazendo com que
a gente acredite numa força de transição para a gente se sentir melhor no dia a
dia através de uma oração que a gente acredita com mais verdade, com mais
vigor".
O filósofo e professor de
Ciências da Religião da PUC Minas, Stephen Simim, é estudioso dessa
tradição. Segundo ele, o ato de benzer envolve saberes das religiosidades
europeia, indígena e africana. O mistério e as plantas medicinais estão sempre
presentes nos rituais, como explica Simim.
"Só a benzeção é uma síntese
disso: um conhecimento específico do uso de ervas medicinais aliado a essa
prática da experiência espiritual". Uma experiência que, segundo
aqueles que acreditam, traz paz espiritual.
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