Maioria dos muçulmanos no Rio de Janeiro é brasileiro convertido – Por Flávia Villela
O estado do Rio de Janeiro tem
aproximadamente 2 mil muçulmanos, segundo a Sociedade Beneficente Muçulmana do
Rio de Janeiro (SBMRJ).
A maioria não é estrangeiro ou filho de muçulmanos, mas
brasileiros que resolveram seguir a religião após conhecê-la. De acordo com a
sociedade, dos cerca de 400 afiliados que frequentam a única mesquita no
estado, localizada na Tijuca, zona norte, 70% são brasileiros. A maior parte
escolheu o islamismo na idade adulta.
“A maioria acha que não somos
brasileiras. Quando digo que sou, perguntam se minha família é da Arábia
Saudita”, informou a aeronauta carioca Ana Cláudia Mascarenhas, que se
converteu ao islamismo há cinco anos. Ela tinha 25 anos quando entrou em uma
mesquita. Antes, foi casada com uma pessoa não muçulmana, teve duas filhas e
era adepta do espiritismo. Aos 45 anos, Ana Cláudia conta que se descobriu com
a nova religião.
“Desde criança, tinha uma ligação
inexplicável com o Oriente Médio. Fui crescendo, gostando cada vez mais e
comecei a ler sobre o islã. Quando iniciei na profissão, fui morar em São
Paulo, onde o número de mesquitas é muito maior. Conheci alguns muçulmanos, fui
apresentada a uma mesquita, recebi o alcorão e fui me envolvendo”.
O respeito e a possibilidade do
contato direto com o deus Alá foram os principais motivos que a atraíram ao
Islã. “Somos uma família, somos irmãos e adoro isso. Minha relação com a
família melhorou muito desde que me reverti [termo que significa conversão para
os muçulmanos]. Hoje, minha vida é 100% família e antes não era”.
As filhas, de 21 e 14 anos, não
são muçulmanas e a aceitação da escolha da mãe foi difícil. “Muita gente liga o
islã ao terrorismo. Se você é muçulmana, faz parte de alguma facção terrorista.
Elas tinham vergonha de sair comigo por causa do véu. Foram contra e ficaram
sem falar comigo”, lembrou.
“A família achou que estava louca. Minha mãe chegou
a arrancar meuhijab (véu). Hoje todos aceitam, se preocupam com minha
alimentação quando tem festa, pois sabem que não como carne de porco. Ganhei
meu espaço, sem precisar gritar para o mundo”.
Segundo ela, foi preciso mudar
hábitos e abdicar de alguns prazeres. “Deixei de ir a bares, coisa que fazia
sempre. Parei de beber e fumar. A gente precisa mudar de conduta. Ou aceita e
muda o que deve ser mudado ou não é muçulmano”, afirmou Ana Cláudia, que há
dois anos conheceu o atual marido, também muçulmano, que teve que fugir da
Síria por causa da guerra civil. "As vestimentas da mulher servem para
preservá-las quando estiverem fora de casa ou entre estranhos. Em casa ficamos
à vontade".
Para o assessor de imprensa da
SBMRJ, Fernando Celino, a reversão não significou muitas mudanças. “Já tinha
uma vida mais regrada. Nunca fumei, bebia pouco e nunca fui muito fã de carne
de porco". De família católica, ele foi apresentado ao islã por um amigo
de infância, muçulmano de berço. Ele se reverteu há dez anos, fascinado com as
palavras do Alcorão, livro sagrado do islã.
“A palavra muçulmano significa
aquele que se submete voluntariamente à Deus. Ouvimos e obedecemos às ordens de
Deus, mas não é uma fé cega. Tudo tem uma razão e uma sabedoria”.
Atendente de telemarketing, Ana
Carolina Jimenez, 22 anos, se reverteu há pouco mais de um ano, mas a família
ainda não aceita a mudança. “Minha família é totalmente contra. Não gosta da
forma como me visto e que eu reze cinco vezes ao dia, mas cada um tem sua
crença.”
As cinco orações diárias
tornaram-se um prazer. “Há períodos que não podemos orar e sinto falta. É
natural. Ninguém reza forçado. Não conheço nenhum muçulmano que reclame",
disse Ana Carolina.
Após conhecer, pela internet, um
rapaz muçulmano da Indonésia, ela começou a pesquisar sobre a religião. “Fiquei
assustada no início, mas fui conhecer o islã, pois minha visão era
completamente diferente. Fique fascinada, pois tudo o que aprendia estava no
meu coração desde sempre”. Hoje, são noivos e ele virá ao Brasil para conhecer
a família dela e pedi-la em casamento.
De acordo com Ana Cláudia e Ana
Carolina, as vestimentas também não são um problema, apesar do calor carioca.
Braços, pernas de fora e roupas que marcam o corpo não são recomendados.
Segundo Ana Cláudia, as únicas mudanças negativas da reversão são o preconceito
e as agressões, comuns no Rio de Janeiro, a ponto da religião muçulmana ser a
segunda que mais sofre com intolerância religiosa no estado.
“Prezamos muito a paz, a
confraternização e o bom relacionamento com as pessoas. O contrário do que
dizem do islã. Respeitamos todos, mas não somos respeitados”, criticou Ana
Carolina. "O preconceito é uma coisa muito séria, muito triste. É um
problema de difícil solução, pois falta respeito ao próximo e conhecimento para
a pessoa abrir um pouco mais a cabeça", acrescentou Ana Cláudia.
O censo 2010 do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que cerca de 35 mil pessoas
seguiam o islamismo no período da pesquisa.
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