Aspectos Legais que todos Pagãos Brasileiros devem Saber
Sendo o Paganismo uma expressão
cultural reavivada recentemente, além de inúmeros serem seus caminhos, sendas,
religiões e vertentes, é impossível não deparar-se com preconceitos, medos e
estigmas de cidadãos que estão desde sempre inseridos na sociedade brasileira
que é predominantemente encharcada e constituída de valores ocidentais e
judaico-cristãos.
É leviano afirmar que o fato de o Brasil ter recebido forte
influência mística e religiosa dos negros, conservado reminiscências das
espiritualidades indígenas e agregado certos traços mágicos dos brancos que o
colonizaram, fizeram dele um país de diversidade e tolerância religiosa.
Existe
algo que é incontornável e que precisa ser encarado de frente: nosso país é sim
predominantemente cristão e fundamentou-se totalmente nos valores inerentes a
prática oficial do Catolicismo.
A Formação Político-Cultural do
Estado Brasileiro
Quando ainda nem sequer haviam
chegado ao país as religiões cristãs protestantes e neopentecostais, o Brasil
já tinha sua identidade cultural formada, e oficialmente, qualquer prática, que
não fosse reconhecida pela Igreja Católica Apostólica Romana era praticada às
margens da sociedade, vide a necessidade dos negros, por exemplo, de
sincretizar os Orixás com Santos, para verem-se livres a exercitarem seu culto
aos seus Deuses, sem a necessidade de se esconderem.
A Constituição de 1824, sendo a
primeira do Brasil, foi essencialmente muito importante para fins políticos e
unificadores em termos de nação. Ela formalizava a Independência do Brasil,
instituindo o Império e garantindo o exercício de Poderes controlados por Lei.
Entretanto, obviamente, ela não era muito amiga dos cidadãos brasileiros que
desejassem se denominarem de outra fé, senão a da Igreja de Roma:
“(…) A Religião Catholica Apostolica
Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão
permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso
destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo.”
– Art. 5º da Constituição de
1824. (BRASIL. Constituição Politica do Imperio do Brazil. Rio de Janeiro,
1824).
Muitos não sabem, mas essa foi a
Constituição de maior vigência na história do País. Vigorou plenamente por 65
anos e só fora colocada de lado, quando do Golpe Republicano em 1889. Em 1891,
surge a primeira Constituição da então República. Essa não ostentava nenhuma
religião oficial para o Estado, da mesma forma que nenhuma das várias que as
sucederam até hoje. Entretanto, não devemos pensar que o pensamento dos
cidadãos, a cultura e seus hábitos é modificado por força ou ausência de Lei.
Todos os valores e preconceitos seguem com o seu povo, até que o tempo se
encarregue de transformá-los.
O Estado Laico e de Direito
Finalmente em 1988, após décadas
preenchidas por golpes de Estados e anos ditatoriais, embalado pelo movimento
das Diretas Já, surge a atual Carta Magna, também chamada de “Constituição
Cidadã”, a Constituição de 1988 que emerge transformando direitos coletivos e
gerais, focando agora principalmente nos direitos individuais e libertários. É
através dela, que o Brasil se estabelece definitivamente como Estado Laico.
Isso significa dizer, que o Estado brasileiro não possui, ou pelo menos,
legalmente não deve possuir, qualquer vinculação, com uma ou outra religião.
Significa também, dizer que o Brasil, em termos constitucionais, tem como
princípio a imparcialidade e neutralidade em assuntos religiosos.
O Estado laico vai além, pois
serve de instrumento para garantir que todos os seus cidadãos possuem direito
absoluto à liberdade religiosa – Estado laico, não é necessariamente, Estado
ateu (contudo, o mesmo princípio que garante a liberdade religiosa, garante a
liberdade de expressão e pensamento dos ateus). O Estado laico em tese, não
deve sequer permitir a interferência de correntes religiosas em matérias
sociopolíticas.
“(…) é inviolável a
liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos
cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto
e a suas liturgias; (…) é assegurada, nos termos da lei, a prestação de
assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva (…)”
– Art. 5º, incisos VI e VII
da Constituição de 1988. (Brasil. Constituição da República Federativa do
Brasil, Brasília, 1988).
O fato é que infelizmente algumas
denominações religiosas abusam das garantias oferecidas pelo Estado laico e
disso, através, do seu exercício de fé, que é defendido pela Constituição,
fazem instrumento para denegrir a imagem da fé alheia. Disso, infelizmente,
nenhum cidadão brasileiro estará livre, pois é preciso também considerar o
direito à liberdade de expressão conjugado com ao da liberdade religiosa.
Entretanto, os pagãos brasileiros e outras minorias religiosas, podem e devem
tomarem para si os direitos que estão à sua disposição pela carta
constitucional e as demais legislações infraconstitucionais que veremos a
seguir.
O Direito ao pleno favor de todos
os tipos de fé, cultos e crenças
É de suma importância que todos
os pagãos brasileiros saibam, que independente de sua vertente, sua fé já está
constitucionalmente protegida, como disposto no Art. 5º, acima mencionado. Mais
do que isso, toda e qualquer fé, exercida em território brasileiro é
automaticamente reconhecida legalmente – sendo assim, seus lugares de culto, assim
como liturgias devem ser defendidas pelo Estado. A questão é: não se pode
esperar que o Estado vá até cada um dos cidadãos, quando nem sequer sabe ou
conhece o que está acontecendo no seu exercício de culto. Dormientibus non
sucurrit ius – “O Direito não socorre aqueles que dormem”. É necessário
que cada cidadão saiba como se fazer representar legalmente, reivindicando seus
direitos e provocando o Estado para que ele atenda então suas necessidades.
Já fora dito, que todo pagão está
constitucionalmente protegido e pode exercer sua fé livremente, independente da
formação cultural judaico-cristã do Brasil, como visto no início do texto.
Consequentemente, todas as congregações e grupos pagãos, também estão,
respectivamente representados no mesmo direito do livre exercício de fé e assim
como no direito de proteção sobre seus locais de culto e liturgias. Isso
significa que dizer, que mesmo em espaço público como um parque ou uma praça
impregnada de cristãos fundamentalistas, pagãos PODEM, por exemplo, realizar
uma cerimônia religiosa. Para isso basta informar a Secretaria do Município de
sua cidade o que será realizado.
Além disso, qualquer cidadão, ou
grupo de cidadãos, tem o direito de SOLICITAR a presença da Polícia Militar e
da Guarda Municipal (quando houver) para acompanhar e proteger toda e qualquer
atividade pública de cunho religioso, social ou cultural. Basta oficiá-los da
forma correta, o que será visto minuciosamente, como fazer, em postagens que
serão feitas mais além.
A Lei 7.716 de 5 de Janeiro de
1989 e o Art. 208 do Código Penal
Qualquer pessoa que sofrer
discriminação por conta de sua crença, pode e deve imediatamente fazer sua
denúncia na Delegacia de Polícia Civil mais próxima, gerando um Boletim de
Ocorrência (B.O.) e logo em seguida, abrindo um processo criminal contra o (s)
autores do fato discriminador.
“Serão punidos, na forma desta
Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia,
religião ou procedência nacional. (…) Pena: reclusão de dois a cinco anos. (…) Praticar,
induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião
ou procedência nacional. (…) Pena: reclusão de um a três anos e multa.”
– Art. 1º e 20º da Lei
7.716/89. (Brasil. Lei 7.716. Brasília, 1989).
Com base no dispositivo legal
acima, qualquer pagão pode processar o seu discriminador, impelindo assim, que
cada vez mais pessoas infrinjam o mesmo tipo de atitude contra sua fé. Da mesma
forma:
“Escarnecer de alguém
publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar
cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto
de culto religioso: Pena – detenção, de um mês a um ano, ou multa. Parágrafo
único – Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem
prejuízo da correspondente à violência.”
Art. 208 do Código Penal.
(Brasil. Código Penal Brasileiro, Rio de Janeiro, 1940)
Por fim, há de se entender que
não existem motivos para os pagãos brasileiros viverem escondidos dentro de
armários ou vivenciando suas fés de forma marginal. TODAS AS FÉS PAGÃS são TÃO
OFICIAIS E LEGAIS quanto as fés cristãs. O que é preciso é ter atitude,
coragem, ímpeto e fazer valer todos os direitos enquanto cidadão brasileiro.
Somente com a Força da Lei, através do exercício de direitos e de muito
ativismo, os pagãos conseguirão espaço para provarem à sociedade brasileira sua
integridade frente a 500 anos de imposição judaico-cristã em Terra
Brasilis.
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