Religião tem papel central na Cúpula Humanitária de Istambul
Tão associada a fundamentalismos,
terrorismo e violência, a fé ainda tem potencial de promover a paz e o
progresso? Essa é uma das premissas do encontro internacional promovido pelas
Nações Unidas.
A religião é, sabidamente, capaz
de mover montanhas. E, para intensificar sua quase onipresença no mundo, ela
passará agora a se engajar mais pelo progresso econômico das nações pobres,
ajudando refugiados a construírem uma nova vida e se empenhando por mudar as
condições sociais que são solo fértil para os grupos terroristas islâmicos.
Pelo menos é o que desejam as
grandes instituições doadoras e os chefes de Estado presentes na Cúpula
Humanitária Mundial, que se realiza em 23 e 24 de maio de 2016, em Istambul. O
encontro único, em seu gênero, foi promovido pelo secretário-geral da
Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, para quem "a humanidade
presencia a maior catástrofe humanitária desde a Segunda Guerra Mundial".
O tema religião consta no topo da
pauta da cúpula. Numa sessão especial na segunda-feira, representantes de
diversas comunidades de fé estão convidados a expor à comunidade mundial as
contribuições que podem prestar na superação das diversas crises humanitárias
em curso.
Avanço com a religião, e não contra
Entre os participantes na
metrópole turca também está o ministro alemão de Cooperação Econômica e
Desenvolvimento, Gerd Müller. "Em muitos países, os chefes religiosos
dispõem de grandes prestígios", declarou à DW.
"Precisamos utilizar
esse potencial, sem fechar os olhos para o fato de que a religião também é
instrumentalizada para a violência e o terrorismo."
Em colaboração com os grandes
protagonistas internacionais de ajuda humanitária, Müller pretende explorar o
potencial religioso, sobretudo do islã, para a paz e o desenvolvimento. Seu
ministério está desenvolvendo um novo programa antiterror, sob o título: "International Partnership on Religion and Sustainable Development" (PaRD).
"As comunidades religiosas
realizaram um trabalho importante, em todo o mundo, no setor da saúde,
educação, nutrição e abastecimento de refugiados", afirma o político
social-cristão. Cerca de 80% da população mundial se define como crente,
"por isso, em muitos assuntos só é possível avançar com, e não contra, a
religião".
A iniciativa do ministro Müller é
saudada por associações muçulmanas como a Islamic Relief Deutschland. "O
governo alemão certamente se alegra pela nossa existência; construímos muito na
Síria", afirma a porta-voz da entidade humanitária, Nuri Köseli.
Sacerdotes avançam onde autoridades fracassam
A Islamic Relief Deutschland é
uma das maiores contribuintes de sua organização-mãe internacional, a Islamic
Relief Worldwide (IRW), ativa em 40 países.
Em 2014, 113 milhões de euros foram
disponibilizados à ONG, que entre seus parceiros conta com os ministérios
britânico e sueco do Desenvolvimento, agências humanitárias da ONU, a União
Europeia, a Aliança Mundial Luterana e a agência católica Cafod.
Um relatório conjunto da Cafod e
da IRW sobre o combate ao ebola na África Ocidental ilustra quão importante
pode ser a cooperação com líderes religiosos em regiões de crise. Lá,
sacerdotes muçulmanos e cristãos conseguiram, com argumentos religiosos, algo
em que autoridades estatais e agências da ONU haviam fracassado: modificar os
ritos fúnebres tradicionais e, assim, deter a difusão da epidemia.
As taxas de contágio só caíram do
momento em que padres e imãs conseguiram comunicar aos parentes em luto, de
forma convincente, que uma despedida digna também era possível sem contato
físico. Até então, o manuseio dos cadáveres contaminados garantia o
alastramento meteórico do ebola.
"Se os líderes religiosos
estivessem integrados desde o início, teríamos salvo muitas vidas
humanas", afirma o relatório da Cafod e IRW Keeping the faith (Mantendo a
fé), que voltará a ser discutido na Cúpula Humanitária.
Igrejas como pioneiras
A cooperação com chefes
religiosos já se apoia em anos de experiência. O ministério alemão do
Desenvolvimento trabalha há mais de 50 anos, com sucesso, junto a órgãos
humanitários eclesiásticos como a Brot für die Welt e a Misereor, transferindo
anualmente para seus projetos 200 milhões de euros.
Um dos principais protagonistas
da assistência humanitária e da cooperação para o desenvolvimento é o Aga Khan
Development Network (AKDN). A rede leva o nome do chefe religioso dos
ismaelitas nizari, uma corrente xiita do islã, dispondo de 80 mil colaboradores
e de um orçamento anual de 625 milhões de dólares.
Mas, apesar de todos os esforços
pelo diálogo e cooperação, também na Cúpula Humanitária Mundial fica
evidenciado o cisma que separa as alas de fé. Pois uma instituição foi
intencionalmente excluída do convite a Istambul, a International Islamic Relief
Organization of Saudi Arabia.
Como as demais, a entidade criada
em 1979 por um decreto do rei da Arábia Saudita presta assistência humanitária.
Contudo ela também financia a construção de mesquitas, sendo suspeitada pela
ONU de apoiar islamistas radicais.
Fonte: http://noticias.terra.com.br
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