Lugo maculou a imagem da Igreja Católica, diz arcebispo que apoiou deposição no Paraguai - Por Guilherme Balza
Em 2004, Lugo foi aposentado pelo Vaticano e
tornou-se bispo emérito. Dois anos depois, abandonou a batina, pois desejava
tentar a presidência do Paraguai em 2008, a lei paraguaia impede que sacerdotes
sejam candidatos.
Na época, o ex-mandatário foi suspenso pelo papa Bento 16 por
ato de rebeldia.
O auge da crise com a Igreja veio em 2009, quando
vieram à tona os escândalos de paternidade de filhos que Lugo teria concebido
enquanto exercia o sacerdócio, a paternidade de Lugo foi reconhecida para um
dos filhos.
Agora, durante a crise política no Paraguai, a
cúpula da Igreja Católica procurou Lugo dias antes da abertura do processo de
impeachment e sugeriu que ele renunciasse para que não fosse deposto, o que não
aconteceu. Lugo foi destituído e gerou uma crise no país, que será acompanhada
neste fim de semana por uma missão da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Após a destituição, a Igreja reconheceu o novo
governo de Federico Franco, alegando que o ato foi constitucional, e até
permitiu que ele tornasse protagonista da missa de São João, celebrada no dia
seguinte de sua posse.
Em entrevista ao UOL, o monsenhor Edmundo Valenzuela, arcebispo de
Assunção e vice-presidente da Conferência Episcopal do Paraguai, afirmou que,
com o escândalo da paternidade, Lugo maculou a imagem da Igreja Católica,
embora, segundo ele, o episódio não tenha qualquer relação com a posição da
Igreja diante da deposição.
Valenzuela considerou a deposição como um processo
constitucional no qual a Igreja não poderia opinar. Disse também que era
necessário buscar uma conciliação política no país, que só seria possível com a
saída de Lugo.
Leia abaixo a entrevista:
UOL - A Igreja Católica concorda com a
deposição de Fernando Lugo?
Edmundo Valenzuela - A Igreja acompanha a história do
seu povo. Acompanha o processo constitucional do seu povo. A Igreja não tem
como influenciar um processo determinado pela Constituição. O ex-presidente
aceitou submeter-se ao impeachment.
UOL - Por que então a Igreja
pediu que Lugo renunciasse na véspera da abertura do processo de impeachment?
Valenzuela - Por vários motivos: primeiro,
parar frear a violência que vinha crescendo e que se temia. Tínhamos informação
de que sairiam às ruas camponeses a favor de Lugo e outros manifestantes
contra. Temia-se uma violência. Não se justificava haver derramamento de sangue.
Pedimos que ele renunciasse porque seria uma saída mais honrosa do que o
impeachment. Seria um mal menor.
UOL - O que o senhor pensa da mensagem
enviada por padres de Itapúa que consideraram a deposição de Lugo
inconstitucional e antidemocrática?
Valenzuela - Não podemos opinar sobre a
Constituição Nacional. Ela é como está. Tem defeitos, precisamos mudá-la, mas
ela foi seguida no impeachment. Com a saída de Lugo, será possível trabalhar
com consenso político. Os problemas continuam, na disputa por terra, na
educação, na saúde... O parlamento terá que enfrentá-los e atuar, sobretudo,
para ajudar os pobres, camponeses e indígenas.
UOL - Lugo prejudicou imagem da igreja
em virtude dos filhos que foram concebidos durante seu sacerdócio?
Valenzuela - É mais que evidente que ele
maculou a imagem da Igreja. Seus atos contradisseram o que ele abraçava. É uma
situação difícil, são pecados, que necessitam da misericórdia e da compaixão de
Deus, mas que repercutiu no nome da Igreja e dos bispos. Objetivamente, a
Igreja é santa, com o Espirito Santo, com Cristo, mas os escândalos indicam que
abandonamos a coerência de vida.
UOL - A saída de Lugo tem alguma
relação com esse episódio?
Valenzuela - Não tem nenhuma relação. Ele saiu
por mau desempenho do governo.
UOL - Nas ruas de Assunção, muitas
pessoas parecem estar contra a deposição de Lugo. Se a Igreja acompanha a
história do povo, por que não se opôs à destituição de um presidente eleito
pelo voto popular?
Monsenhor Edmundo Valenzuela, arcebispo
de Assunção, sobre o impeachment
Valenzuela - É muito difícil saber se foi
oportuna ou não sua saída. A história se faz às vezes por passos inesperados.
Foi tudo muito rápido. Há muita gente beneficiada pelos programas de Lugo que
se sente prejudicada, mas boa parte da população está muito descontente. O que
aconteceu foi um impeachment, e a gente não pode nem aprovar, nem negar. A
história nos indicará depois se o caminho foi correto.
UOL - Na sua opinião, Lugo teve um
julgamento justo, considerando a justiça dos homens e a divina?
Valenzuela - Ele como cidadão teve direito à
sua palavra. Quando assumiu, aceitou respeitar a Constituição e a lei. Por que
agora ele não aceita [a deposição]?
O Congresso paraguaio, que
destituiu o ex-presidente eleito Fernando Lugo em menos de 48 horas, está
parado desde a posse de Federico Franco
UOL - A cúpula da Igreja Católica foi conivente com as ditaduras militares que ocorreram na América Latina. O senhor teme que, com a aceitação da saída de Lugo, se associe o papel cumprido pela Igreja agora e no passado?
Valenzuela - São situações históricas muitos
diferentes. O contexto do Paraguai hoje não tem nada a ver com o passado. Esse
novo contexto indica um desejo de maior governabilidade, um desejo de fazer um
governo melhor. São situações muitos diferentes. O país quer seguir adiante,
seguir a democracia. Processos semelhantes ocorreram em vários países do mundo.
Cada país é autônomo e tem sua soberania sustentada em sua própria estrutura. A
Igreja somente acompanha.
UOL - Como fica relação entre Lugo e a
Igreja?
Valenzuela - Você tem que perguntar a
ele. Ele é um cristão. Como presidente, ele participava da missa, confessava,
comungava. Nesse sentido é amigável que continue assim.
Fonte: http://noticias.uol.com.br
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