Médicos querem impedir que religião afete as decisões de pacientes - Por Jarbas Aragão
Médicos querem impedir que
religião afete as decisões de pacientes
Em um artigo publicado no Journal
of Medical Ethics, médicos ingleses alertam que as famílias com esperanças
infundadas de uma recuperação “milagrosa” estão forçando seus filhos a
tratamentos agressivos, mas inúteis.
Para os doutores Joe Brierley e Andy
Petroseles, do Hospital Great Ormond Street, os pais que confiam na intervenção
divina, contrariando a opinião dos médicos, deveriam ser impedidos.
Curiosamente, o apelo tem o apoio do capelão do hospital, o reverendo Jim
Linthicum.
Os médicos são especialistas da
unidade de terapia intensiva neonatal do Hospital Great Ormond Street, em
Londres. Seu artigo usa um levantamento feito entre 203 casos que eles
acompanharam, quando os pais foram informados que as máquinas que mantinham as
crianças vivas deveriam ser desligadas, pois não havia chance de recuperação.
Os autores revelaram que em 186
casos (70%) as famílias concordaram com os médicos. Em 17 casos, os pais
insistiram em continuar o tratamento, mesmo após longas discussões sobre a
probabilidade de mudança no quadro, o que de fato não ocorreu. Em 11 deles, a
religião foi o principal fator a influenciar sua decisão.
Alguns dos casos só foram
resolvidos depois que os líderes religiosos ajudaram a convencer os pais a
desligar as máquinas. Um desses casos só foi resolvido na Suprema Corte. Mas
houve situações onde não se chegou a um acordo, pois os pais estavam esperando
um “milagre” até o último segundo, disseram Joe Brierley e Andy Petroseles.
“Embora seja vital apoiar as
famílias em situações tão difíceis, estamos cada vez mais preocupados que a
crença profundamente arraigada na religião pode levar crianças a sofrerem
desnecessariamente por causa da expectativa de intervenção milagrosa de seus
pais”, advertem os autores.
“Em muitos casos, as crianças sobre as quais pesam
essas decisões são demasiadamente jovens para concordarem ou discordarem das
crenças religiosas de seus pais”.
Citando exemplos de tratamentos
que presenciara, eles argumentaram que os pais que insistem que as crianças
sofram sem esperança de uma cura científica deveriam ser acusados de tortura.
“Passar a vida inteira ligada a uma máquina, tendo todas as funções corporais
supervisionadas e higienizadas por um cuidador ou parente, não oferece qualquer
dignidade ou privacidade para a criança ou adulto é algo claramente desumano”,
argumentaram.
A lei inglesa deixa claro que a
opinião dos pais é determinante, mas os médicos ressaltam que os casos
analisados incluíam famílias muçulmanas, judias e católicas, o maior foram os
provenientes de grupos cristãos evangélicos, classificados por ele como
“fundamentalistas”.
O Dr. Petros diz que essa parece
ser uma situação cada vez mais comum, pois esses pais geralmente não aceitam
debater suas crenças religiosas nem participar de reuniões para tentar
reconciliar as diferenças.
Keith Wood Porteous,
diretor-executivo da National Secular Society, disse: “Esta é provavelmente a
situação mais terrível para qualquer pai, mas a experiência e os conselhos dos
médicos não deve ser ignorados pelas famílias religiosas, No entanto eles são
muito resistentes”.
Charles Foster, especialista
jurídico da Universidade de Oxford, argumenta que não ignorar o lugar da religião
na vida e nas decisões tomadas pelas famílias. “Eles [os médicos] parecem
pensar que existe algum tipo de mandato democrático que lhes dá o direito de
impor seus valores seculares sobre todo mundo”.
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