Relações entre política e igreja voltam à tona com eleições municipais - Por Eduardo Maretti
Entre o direito ao credo e a violação do conceito de um
Estado laico, caso do brasileiro, uma linha tênue que muitas vezes é rompida em
prol de interesses pessoais
Na campanha eleitoral de 2012 em São Paulo, o candidato líder nas
pesquisas de intenção de voto até o momento, Celso Russomanno (PRB), é
conhecido por sua estreita ligação com
o todo poderoso bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus.
Em busca de votos, José
Serra e Valdemiro Santiago, fundador e líder da Igreja Mundial do Poder de Deus
(IMPD), celebraram um acordo, executado pelo prefeito Gilberto Kassab,
suspendendo um projeto urbano (o prolongamento de uma rua em Santo Amaro, zona
sul de São Paulo) para não atrapalhar a construção de um templo.
Para tanto, o
prefeito enviou um projeto de lei que a Câmara Municipal aprovou em primeira
votação. O segundo turno, marcado para esta quarta-feira (5), foi adiado pelo
Legislativo municipal após forte pressão em torno do tema.
A interferência da religião
na política, como mostram esses e
outros exemplos, envolve todas as vertentes ideológicas, da direita à esquerda.
Em sua campanha para vereador, o petista Arselino Tatto espalha panfletos pela
cidade identificando-se como “um
candidato cristão católico”.
Em 2010, bispos financiaram a impressão de
panfletos contra a candidatura de Dilma Rousseff (PT) por conta de uma falsa
polêmica em torno do aborto.
Ao inaugurar qualquer sessão
na Câmara Municipal de São Paulo, o presidente da Mesa Diretora declara
solenemente: “Está aberta a sessão com
a proteção de Deus”. Em âmbito federal, a religiosidade tem impedido a
discussão de temas cruciais pelo próprio Congresso Nacional, caso do Projeto de
Lei 122/06 – que criminaliza a homofobia (confira box).
A situação é preocupante,
considerando que o artigo 5º da Constituição brasileira é claro ao estabelecer
que “todos são iguais perante a lei” e, no inciso VIII, determinar
expressamente: “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa
ou de convicção filosófica ou política”.
O jornalista e sociólogo
Venício A. de Lima entende que é preciso fazer uma reflexão. “É verdade que, no
Brasil, o Estado é laico desde nossa primeira Constituição. Por outro lado, não
se pode negar ou ignorar que a religião faz parte da vida das pessoas no
Brasil, as pessoas são religiosas, têm crenças.”
Para ele, “as coisas se complicam quando se mistura a religião com as coisas públicas. O serviço público
deve ser prestado a qualquer pessoa da mesma maneira, independentemente de sua
crença”, analisa Lima.
“Agora, quando temos um Conselho de Comunicação no Congresso Nacional presidido
por um bispo da Igreja Católica (confira box), aí temos um problema. Assim como há problema com TVs que são concessões públicas e são
sublocadas por essa ou aquela doutrina. Ou se contemplam todas ou nenhuma”,
defende o sociólogo.
Entretanto, Venício A. de
Lima considera que o uso de uma determinada religião numa campanha eleitoral, com um candidato se dizendo adepto ou
chamando os fiéis a votar nele, é problema do próprio candidato. “Cada um faz a
chamada que achar melhor. Se sou adepto de um credo, é claro que quero que os
fiéis votem em mim”, diz Lima.
“Mas é importante dizer: se ele for eleito, no
exercício do mandato, não pode fazer distinção entre esta ou aquela crença.”
Em outubro de 2010, no auge
da campanha eleitoral de 2010, o então candidato tucano à presidência, José
Serra, atual postulante à prefeitura de São Paulo, disse em discurso para
pastores da igreja Assembleia de Deus que se fosse presidente vetaria o PL
122/06 para garantir aos religiosos “o direito de pregar contra práticas
homossexuais aos seus fiéis”.
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