Como se fala do Natal às crianças ateias e de outras religiões? - Por Bárbara Wong
O Natal está em todo o lado. Como
se fala do Natal às crianças ateias ou que não são cristãs?
À entrada da escola está uma
árvore de Natal bem decorada e, por baixo, o presépio. Na sala, a educadora
promove uma troca de prendas entre as crianças. Na rua, as decorações lembram
um menino que nasceu numa manjedoura há dois mil anos, rodeado de anjos,
pastores, reis magos e há um velho com barbas que distribui prendas aos meninos
que se portam bem. Esse é o mesmo personagem que aparece na televisão, em
inúmeros anúncios e filmes.
“As crianças são crianças”,
começa por dizer o espanhol Clemente Gª Novella, autor do livro: Onde está Deus,
papá? As respostas de um pai ateu, editado pela Verso de Kapa. “As crianças não
são coisa nenhuma até que, passados alguns anos, graças à doutrinação, se
convertem em homens ou mulheres católicos, muçulmanos ou hindus”, continua.
Reformule-se a pergunta: Como se
fala do Natal às crianças que vivem em famílias ateias ou de outras religiões
que não as cristãs?
“Quando as crianças são muito
pequenas não se dizem grandes coisas”, responde Esther Mucznik, da Comunidade
Israelita de Lisboa. Mas não é fácil, afinal elas vêem os amigos entusiasmados
a falar do Natal, das prendas… “Qual é a criança que não gostaria de receber
brinquedos?”, pergunta o sheik David Munir, da Comunidade Islâmica de Lisboa.
Por isso, à medida que as
crianças vão crescendo, vão compreendendo que aquela festa, o Natal, é a festa
que os amigos celebram e que eles têm outras como o Hanukkah, a festa das luzes
judaica; uma festividade móvel que se festeja em Dezembro e onde as crianças
também recebem pequenas prendas. Ou a Eid, a festa que assinala o final do jejum
do Ramadão muçulmano.
E o menino Jesus, o que se diz
sobre ele? “Explicamos quem é Jesus para os muçulmanos, mas para a maioria, o
Natal não é o nascimento de Jesus mas é sinónimo de prendas”, responde o sheik
Munir. “Dizemos que é uma pessoa com uma mensagem justa em muitos aspectos, mas
que não acreditamos que seja filho de Deus”, acrescenta Esther Mucznik.
E as ateias? Clemente Gª Novella
responde ao PÚBLICO com a sua experiência pessoal: “A 25 de Dezembro, o Pai
Natal vai a minha casa. Há já algum tempo que os meus filhos sabem que o Pai
Natal não existe, mas os presentes continuam a estar debaixo da árvore. Eles
sabem que eu e a minha mulher os compramos, mas gostam de os encontrar ao pé da
árvore.”
Entre os que não acreditam, há os
que acham que as festas religiosas devem ser banidas da esfera pública e os que
vivem estas festividades como um momento social para estar com a família e os
amigos, define Helena Vilaça, socióloga das religiões. “As pessoas que não têm
religião e que valorizam o Natal, absorveram os valores cristãos de estar com a
família, mas deixaram de lhe dar essa conotação religiosa”, acrescenta.
“Não acredito que todas as
pessoas que celebram o Natal crêem que, um dia, há dois mil anos, um ser
imaterial que vive no céu (em que sítio exactamente?), desceu à terra em forma
de pomba para fecundar uma mulher (virgem, mas que estava casada com outro, José),
e que, nove meses depois nasceria um homem-deus que, 33 anos depois, subiria ao
céu (e de novo, para que sítio do céu?)”, descreve Clemente Gª Novella. E,
ainda assim, celebram o Natal. “Pois, nós também! Não aproveitaríamos esta
ocasião para nos encontrarmos com tios, primos e sobrinhos uma vez por ano, só
porque não acreditamos na mitologia que está por detrás do Natal?”
Mas nem todos o fazem, mesmo
entre os que acreditam que Jesus é o Salvador. Por exemplo, as testemunhas de
Jeová não festejam porque consideram que é uma festa pagã e que não há dados
para precisar a data de nascimento de Jesus para dia 25 de Dezembro. Por isso,
proibem os filhos de participar nos festejos, mesmo na escola.
Judeus e muçulmanos não celebram
nem trocam prendas, mas também aproveitam para estar com a família e com os
amigos, mesmo com os que acreditam que há dois mil anos nasceu um menino que
era Deus. “Não podemos viver como se nada estivesse a acontecer à nossa volta”,
conclui Esther Mucznik.
Fonte: http://lifestyle.publico.pt
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