Crise europeia está aproximando as pessoas de Deus - Por Jarbas Aragão
De acordo com um estudo realizado
pela Universidade Católica Portuguesa (UCP), o número de evangélicos em
Portugal cresceu, nos últimos dez anos, de 0,3 para 2,8%.
Embora igrejas como a Assembleia
de Deus já não estejam tão cheias como acontecia nas décadas de 1980 e 1990, aparentemente
a crise econômica pela qual passa a Europa esteja aproximando as pessoas da
religião.
Teólogos, pastores e
pesquisadores do assunto concordam que momentos como o atual podem motivar as
pessoas a ser mais religiosas. Mas ressaltam que este é um fenômeno complexo,
que não pode ser explicado apenas pela corrente crise europeia.
O pastor Vieito Antunes, da
Assembleia de Deus de Lisboa, ressalta que “Em situações de crise, em todas as
áreas da vida, é normal as pessoas buscarem mais Deus, é um fato. Há uma
tendência para, quando as pessoas têm tudo garantido, esquecerem-se do
religioso, como se tudo dependesse de nós e fôssemos autossuficientes. Mas não
é um fenômeno em larga escala. A secularização das sociedades continua a ser
muito importante em toda a Europa”.
O casal Strango, Mircea (romeno)
e Susana (portuguesa), explica porque a religião tem um papel importante em
suas vidas: “Já passamos por fases difíceis, mas sempre nos safamos e não
precisamos recorrer à ajuda material da nossa igreja. Mas a religião foi muito
importante para mim nos momentos mais difíceis da minha vida, sobretudo do
ponto de vista espiritual, na força que me deu para continuar a lutar, para
procurar trabalho e ter dinheiro para alimentar os meus filhos”, resume Mircea.
“A igreja será sempre importante para quem precise de um ponto de apoio, quando
tudo o resto falha”, acrescenta.
Alfredo Teixeira, antropólogo do
Centro de Estudos de Religiões e Culturas (CERC) da UCP, liderou um estudo
sobre as identidades religiosas em Portugal, realizado pelo Centro de Estudos e
Sondagens de Opinião e pelo CERC. Os dados foram recolhidos entre outubro e
novembro do ano passado.
Numa comparação dos dados desta
pesquisa com uma semelhante, realizada há dez anos, chama atenção a diminuição
do número dos que se dizem católicos (86,9 para 79,5%) e o crescimento dos que
dizem ser de outra religião (de 2,7 para 5,7%).
Teixeira admite que o crescimento
dessas igrejas evangélicas, em especial as pentecostais, pode estar associado à
“teologia da prosperidade”. Esse tipo de ensino é mais comum na IURD e na
Igreja Maná, onde “ser salvo e ser próspero equivalem-se”.
“A salvação é ‘já’ e
não algo que se espera para além de uma existência terrena. Neste contexto, as
propostas de cristianização dirigem-se, de forma muito direta, aos riscos do
quotidiano, e à possibilidade de os ultrapassar. Essa orientação pode, entre
outras razões, ajudar a perceber esta última onda de crescimento dessas
igrejas”, explica o antropólogo.
O pastor Antunes, que rejeita a
teologia da prosperidade, ressalta: “A Bíblia não tem em lado nenhum a promessa
de enriquecer pessoas. O que o Senhor promete é suprir as necessidades do seu
povo”.
A socióloga da religião, Helena
Vilaça, não nega que haja uma ligação entre a crise e a busca da religião.
Contudo, para ela esta relação “não é universal nem as coisas são assim tão
simples”.
Ressalta que a tese de que as
pessoas, em situação de carência, procuram respostas na religião só explica
parcialmente a realidade: “Isso seria reduzir a religião a alienação, no
sentido marxista do termo. E a realidade revela que a religião também conduz a
comportamentos emancipatórios. Há países com crescimento econômico e com
vitalidade religiosa, como o caso dos EUA, por exemplo. Também o Brasil ou a
Coreia do Sul, quando entraram em fase de crescimento, não perderam a
vitalidade religiosa”, lembra.
Por sua vez, José Pereira
Coutinho, autor de uma tese de doutorado sobre o assunto, considera que em
tempos de crise, seja “natural” que as pessoas com menos rendimentos reforcem a
sua religiosidade, sobretudo nas igrejas que defendam a teologia da
prosperidade: “A [Igreja] Católica dá a salvação para o além, não dá resultados
agora”, ressalta.
José Luís Costa, padre em
Linda-a-Velha e capelão prisional no hospital de S. João de Deus e no
Estabelecimento Prisional de Caxias, reconheça que no contexto atual de crise,
“há uma procura maior de aspectos religiosos”, essa busca é feita “de uma forma
mais desorganizada e menos institucionalizada”: “Procuram o elemento, mas não a
prática, não o ir à missa todas as semanas”, explica.
O pastor presbiteriano Dimas de
Almeida, pesquisador do Centro de Estudos de Ciências das Religiões da
Universidade Lusófona, afirma que não tem notado nem aproximação nem
afastamento: “Penso que, quando uma crise leva as pessoas a aproximarem-se da
religião, pode ser um sinal de fraqueza do religioso… Diante de uma crise
profunda, perguntamos ‘o que é que isto significa? Qual o meu papel? Para onde
vou?’ Somos peregrinos do sentido. Nós todos somos vagabundos do sentido. Há
religião porque há problemas do sentido. Quando a crise nos ameaça é o sentido
da vida que fica também ameaçado”.
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