Especialistas criticam ignorância em torno do mito do fim do mundo
"Vivemos uma época obscura,
supersticiosa, acrítica", lamentou o historiador mexicano Alfredo López
Austin.
A euforia e a incerteza
alimentadas pelo mito de uma suposta profecia maia sobre o fim do mundo nesta
sexta-feira surgem de uma excessiva credulidade, ignorância, sensacionalismo e
um desmedido afã por lucro, disseram especialistas consultados pela Agência
Efe.
"Estas versões apocalípticas derivam de uma ignorância, mas em
algumas ocasiões também de um afã por um lucro desmedido do qual se aproveitam
para escrever livros, fazer filmes ou outras formas de expressão",
comentou o arqueólogo Eduardo Matos.
Por sua parte, Alfredo López
Austin, um historiador especialista em religião mesoamericana e em povos
indígenas do México, explicou que "se há um dado curioso do calendário
maia é acrescentado o sensacionalismo, o mercantilismo dos meios de comunicação,
um notável nível de ingenuidade generalizada e muita vontade de aceitar o
inexplicável e o catastrófico, se forma um coquetel complexo".
Matos
afirmou que o "pensamento religioso sempre se nutriu de fábulas ou mitos
por meio dos quais se tenta explicar diversos fenômenos para os quais o homem,
em sua ignorância, não tem resposta".
Muitas pessoas interpretaram que
a mudança de uma era que começou no ano 3.114 antes de Cristo em um ciclo do
calendário maia significa uma "profecia" sobre o fim do mundo; no entanto,
esta ideia é "completamente alheia e estranha ao pensamento maia
antigo", declarou o arqueólogo.
Este mito, detalhou, "só
pode ser compreendido no marco de nossa própria concepção apocalíptica
ocidental, de nossos próprios temores e superstições, assim como de ideologias
ecléticas pós-modernas que não carecem de interesses de lucro comercial".
López Austin, por sua parte, assinalou que a maioria das pessoas admira os
maias como uma civilização notável, mas "ignoram sua história e boa parte
de seu pensamento". "A admiração mais o desconhecimento generalizado
conduzem facilmente à fantasia. Quando algo não sabe, é mais fácil imaginar que
ir às fontes de conhecimento", advertiu.
O arqueólogo Matos lembrou que em
muitas religiões existe a gênese do mundo e de tudo que nos rodeia, mas também
prevê um final. Acrescentou que as ideias religiosas do Apocalipse estão
presentes no pensamento cristão e abriram passagem ao milenarismo ocidental que
se manifesta em muitos campos, onde o tempo se apresenta de uma maneira linear
e sem repetições.
Em outras culturas, como as mesoamericanas, se aprecia uma
visão cíclica, repetitiva do tempo, devido principalmente a sua observação da
natureza e do movimento dos astros, indicou. Matos ressaltou que a ciência
avançou muito em elucidar diversos aspectos do surgimento do universo, da vida,
da morte e outros mistérios, mas sempre permanecem crenças sem sustentação que
as religiões, em geral, mantêm.
Por sua vez, López Austin
insistiu que para os que se regem por crenças e não pelo exercício do
pensamento crítico, "as falhas de uma crença podem ser substituídas pelas
promessas de outra; as crenças velhas e inúteis são simplesmente substituídas
pelas inovadoras e promissoras". Salientou que no dia seguinte, ao comprovar
que a profecia não se cumpriu, os adeptos a este tipo de crença assegurarão que
"a profecia não foi plenamente realizada", que há "outras
explicações ou esperarão que alguém lhes sirva outro prato com uma nova
profecia".
Além disso, apontou que os
"meios de comunicação sensacionalistas não fazem mais que aproveitar a
situação para fomentá-la e lucrar". López Austin considerou que "é
falso" pensar que no século 21 o mundo vive em uma era científica, e
assinalou que não se deve confundir a ciência com a técnica. "Vivemos uma
época obscura, supersticiosa, acrítica", lamentou o historiador.
Fonte: http://www.ipcdigital.com
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