Uma guerra desnecessária - Por Francisco Ângelo Coutinho e Fábio Augusto Rodrigues e Silva

Ciência e religião são duas práticas importantes de nossa cultura. Elas orientam e organizam o mundo em que vivemos, fornecendo explicações sobre sua estrutura e seu funcionamento. 

Por se fundamentarem em bases diferentes, ou por explicarem o mundo de forma diversa, essas duas tradições, segundo se divulga, sempre estiveram em guerra e o fiel da balança deveria pesar a favor de uma ou de outra. 

Ou seja, se uma está certa, a outra deveria estar, necessariamente, errada. 

No entanto, as coisas não são tão simples. Ao longo da história, as duas tradições mantiveram relações complexas e, às vezes, dolorosas. Na tentativa de organizar o debate e suas formas de ocorrência, são apontadas diferentes categorias das relações entre ciência e religião.

A mais bem conhecida é fornecida pelo norte-americano Ian Barbour, físico e filósofo da ciência que identificou quatro grupos principais: conflito, independência, diálogo e integração.

Do conflito à integração

Segundo a tese do conflito, ciência e religião são mutuamente excludentes e inerentemente incompatíveis. Essa abordagem, que cria uma forte e espessa barreira entre ciência e religião, é defendida por aqueles que propõem que a posse da verdade encontra-se de um lado ou de outro.

São exemplos de defensores dessa postura cientistas como o inglês (nascido no Quênia) Richard Dawkins, o francês Jacques Monod (1910-1976) e o norte-americano Steven Weinberg, bem como fundamentalistas que interpretam a Bíblia literalmente.

A tese da independência também mantém uma forte separação entre ciência e religião, afirmando que essas tradições constituem esferas diferentes que não teriam nada a dizer uma sobre a outra. 

Para teólogos e filósofos como o suíço Karl Barth (1886-1968), o alemão Rudolf Bultmann (1884-1976) e o norte-americano (nascido na China) George Lindbeck, e biólogos como o norte-americano Stephen Jay Gould (1941-2002), as duas têm diferentes métodos, temas e linguagens que simplesmente não competem e, por isso, deveriam ser vistas como duas diferentes jurisdições: uma não deveria interferir nos assuntos da outra.

O diálogo, terceira categoria proposta por Barbour, delineia interações indiretas e fronteiras menos rígidas entre ciência e religião. Nesse caso, afirma-se que as descobertas científicas não necessitam de crenças religiosas, mas os avanços científicos ajudam a religião a encontrar suas respostas, e disso resulta o diálogo.

Como exemplo, pode-se citar o uso que teólogos fazem do conhecimento astronômico e cosmológico para mostrar que as condições iniciais do universo podem apontar para um ato de criação divina. São defensores do diálogo pensadores como os alemães Wolfhardt Pannenberg e Karl Rahner (1904-1984), o húngaro Michael Polanyi (1891-1976) e o espanhol, radicado nos Estados Unidos, Francisco J. Ayala.

Finalmente, existe a tese de que é possível estabelecer algum tipo de integração entre ciência e religião. Aqui os limites que separam os dois campos são muito frágeis. Um exemplo da tentativa de integração seria a chamada ‘teologia natural’, que argumenta que as evidências da existência de Deus se baseiam inteiramente na razão humana e não na revelação histórica ou na experiência religiosa.

Por exemplo, a complexidade do olho humano indicaria que ele foi planejado para exercer uma determinada função e, por tanto, apontariam para a existência de um planejador, no caso, Deus. Entre os defensores dessa tese encontramos pensadores como o filósofo cristão inglês William Paley (1743-1805), o padre francês Teilhard de Chardin (1881-1955), o reverendo inglês Arthur Pea cocke (1924-2006) e o próprio Ian Barbour.






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