Canto gregoriano: dos mosteiros às paradas de sucesso
Definido como silêncio cantado,
estilo musical sacro de origem medieval mantém-se popular. A partir do filme
"O nome da rosa", canto voltou a ser alvo de interesse, ganhando
espaço em trilhas sonoras e na música pop.
Quando Stefan Klöckner
cumprimenta seus alunos, ele costuma começar com as palavras "Pacem meam
do vobis", "Minha paz esteja convosco". Sua especialidade é o
canto gregoriano, e a cada ano seus workshops lotam mais rápido. "Já
tivemos que recusar alguns candidatos de antemão, porque a demanda pelas
oficinas está cada vez maior", comenta.
Os participantes são estudantes
de Música e Teologia, membros de ordens religiosas e músicos de igreja. Eles
vêm de vários cantos da Europa para estudar a teoria e a prática do coral
gregoriano na Escola Superior Folkwang, na cidade alemã de Essen.
O canto coral gregoriano, também
denominado cantochão, deve seu nome a Gregório, o Grande (540-604), papa desde
o ano 590 até sua morte. Essa forma de música sacra já existia muito antes,
tendo raízes nas tradições judaicas. Gregório 1º, entretanto, foi quem começou
a reunir os cantos sinagogais em latim, transmitidos oralmente.
Os primeiros manuscritos dos
corais de que se tem notícia datam de bem mais tarde. Somente a partir do
século 9º as melodias passaram a ser registradas por escrito, em forma de
neumas, precursores da notação musical moderna. Os códices que contêm as
coletâneas gregorianas, aliás, são os mais antigos registros da música
ocidental.
Descoberto pela cultura pop
"Até hoje, o canto
gregoriano nada perdeu de sua força espiritual. Praticadas durante séculos em
clausura, detrás dos espessos muros dos mosteiros, as melodias singelas, porém
penetrantes, ganharam popularidade novamente, fascinando até mesmo quem pouco
ou nada tem a ver com Igreja ou religião".
Em 1986, o lançamento da versão
cinematográfica do romance de Umberto Eco O nome da rosa, cuja trilha
sonora era composta exclusivamente de música gregoriana, desencadeou uma enorme
onda de interesse.
Nas décadas seguintes, numerosos
cineastas, sobretudo dos gêneros fantasia e ficção científica, exploraram a
força evocativa desse estilo musical. Exemplos especialmente bem sucedidos
comercialmente são Peter Jackson, em sua trilogia O senhor dos anéis, ou
George Lucas, na série Guerra nas estrelas.
Silêncio cantado
Paralelamente, desde o início da
década de 90, o "pop gregoriano" conquistava as paradas de sucesso,
temperado pelos místicos sons de sintetizador de grupos como Enigma ou
Gregoriano. Até mesmo subculturas como a gótica descobriram os sons medievais.
E o boom não parou por aí: em
2008, com o CD Chant, Music for Paradise, os monges cistercienses do seminário
de Heiligenkreuz, na Áustria, conquistaram as paradas de sucesso, sendo
aclamados quase como um popular boy group. Dois anos mais tarde, as
freiras beneditinas da Abadia de Notre-Dame de l'Annonciation, na cidade
francesa de Avignon, alcançariam um feito semelhante.
A julgar pelos comentários dos
compradores online, o maior grupo de fãs dessa nova onda gregoriana é composto
por adolescentes. "A música é belíssima. Não sei nada sobre Deus, mas os
católicos fazem uma música tão maravilhosa! Depois da escola, eu consigo
simplesmente relaxar e ficar numa boa", descreve uma menina de 15 anos.
Os jovens mergulham num mundo
misterioso para eles: em meio ao frenético quotidiano atual, eles buscam o silêncio
cantado.
Significado religioso
Oliver Sperling, regente do Coro
de Meninas da fundação DomMusik, de Colônia, também vivencia esse entusiasmo
entre suas jovens cantoras. "Para as adolescentes, o encanto dos corais
gregorianos está na unidimensionalidade dessas melodias, que soam estranhamente
exóticas."
As constatações de Klöckner vão
na mesma linha. "Muitos utilizam o canto gregoriano como tranquilizante,
uma espécie de escape do dia a dia. Eu mesmo já chamei o canto gregoriano de
'loção enxaguante para os ouvidos', pois ele realmente faz um bem incrível."
"Os tempos atuais, prossegue o
professor de Essen, são muito suscetíveis aos sons místicos do chamado
cantochão. E, em sua opinião, aí também reside um perigo. Pois, quando se reduz
essa música ao aspecto místico, deixa-se de fazer jus a seu significado religioso
e litúrgico. Não devemos esquecer que o canto
gregoriano é, em primeira instância, a palavra do livro sagrado em forma de
som. Só é possível compreender o gregoriano através da Bíblia", diz.
Apesar de tudo, o canto
gregoriano não é um modelo em via de extinção, considera Klöckner. "Os
cantos continuam sendo entoados como parte da liturgia. E muitos, sobretudo
jovens estudantes de música sacra, veem no gregoriano o futuro da música na
igreja."
Fonte: http://www.dw.de
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