Batistas abrem espaço para que as mulheres sejam pastoras – Por Ruan de Sousa Gabriel
Aos 22 anos, em 1980, Zenilda
Reggiani Cintra concluiu um curso de teologia ligado à Igreja Batista. A jovem
sentia-se vocacionada ao serviço religioso, mas se conteve.
O ambiente na
Convenção Batista Brasileira (CBB), segundo maior grupo evangélico do país, era
restrito à participação feminina. Zenilda passou a atuar em sua paróquia anos
depois, após casar-se com um pastor. Em 2004, os fiéis lhe concederam o título
de pastora.
A Ordem dos Pastores Batistas do Brasil (OPBB), porém, não
reconhecia a validade do ministério feminino. Isso restringia a atuação das
pastoras a suas comunidades de origem, já que muitas igrejas exigiam que seus
líderes fossem filiados à Ordem. De 10.356 pastores filiados, apenas dez são
mulheres. Agora, o espaço das pastoras tende a aumentar. Em 22 de janeiro, a
OPBB aprovou o ingresso de mulheres na entidade.
“A decisão da Ordem facilita o
caminho para a ordenação de outras mulheres que atendem ao chamado de Deus”,
diz Zenilda.
A abertura da CBB às mulheres é
importante em si mesma e pelo que representa no cenário religioso do país. Ela
é o segundo maior grupo evangélico do Brasil, com 12.400 igrejas filiadas e
cerca de 2,3 milhões de fiéis. Além de numerosa, a Igreja Batista exerce influência
sobre outros grupos religiosos. A história dos batistas no Brasil remonta às
missões americanas do século XIX.
Eles exercem influência sobre outras igrejas
históricas, como a presbiteriana e a metodista. Algumas práticas, como o
batismo de adultos, e a doutrina, que prega que a salvação é alcançada pela fé,
e não por uma predestinação divina, aproximam os batistas dos grupos
pentecostais e neopentecostais.
A Assembleia de Deus, maior
denominação evangélica do país, foi fundada por dissidentes da Primeira Igreja
Batista do Pará. Antes de fundar a Igreja Internacional da Graça de Deus, o
missionário R.R. Soares frequentava uma Igreja Batista.
“Hoje, as igrejas estão
em permanente diálogo. Decisões como essa têm impacto sobre todos os grupos”,
afirma Sandra Duarte de Souza, teóloga e professora da Universidade Metodista
de São Paulo.
O diretor executivo da CBB, Sócrates Oliveira de Souza, diz que,
ainda nos anos 1970, a aceitação na Igreja Batista de divorciados influenciou
outras igrejas evangélicas a fazer o mesmo.
Grande parte das religiões
monoteístas do Ocidente tem ou já teve restrições ao papel da mulher. As
igrejas evangélicas e a Igreja Católica são originárias do cristianismo
primitivo.
Acreditam que Jesus Cristo é filho de Deus e seguem a Bíblia como
livro sagrado. Jesus tinha mulheres entre seus discípulos, mas escolheu 12
homens para ser seus apóstolos. O Evangelho de São Mateus diz:
“Jesus reuniu
seus 12 discípulos. Conferiu-lhes o poder de expulsar os espíritos imundos e de
curar todo mal e toda enfermidade. Eis os nomes dos 12 apóstolos: o primeiro,
Simão, chamado Pedro; depois André, seu irmão. Tiago, filho de Zebedeu, e João,
seu irmão. Filipe e Bartolomeu. Tomé e Mateus, o publicano. Tiago, filho de
Alfeu, e Tadeu. Simão, o cananeu, e Judas Iscariotes, que foi o traidor”.
Nenhuma mulher é citada.
O efeito Francisco
O debate mundial sobre a inclusão
da mulher na alta hierarquia dos grupos religiosos só ganhou força a partir do
século XX. Foi motivado menos por discussões de teólogos, dentro de seminários,
e mais pela mobilização da mulher para ocupar espaços iguais aos do homem.
Ainda hoje o tema rende polêmicas acesas entre os cristãos de diferentes
denominações.
No artigo: “Ordenação feminina: o que o Novo Testamento tem a dizer?”, o teólogo presbiteriano Augustus Nicodemus Lopes divide as opiniões sobre a inclusão da mulher entre “diferencialistas” (contra) e “igualitaristas” (a favor).
No artigo: “Ordenação feminina: o que o Novo Testamento tem a dizer?”, o teólogo presbiteriano Augustus Nicodemus Lopes divide as opiniões sobre a inclusão da mulher entre “diferencialistas” (contra) e “igualitaristas” (a favor).
Os
diferencialistas afirmam que homens e mulheres foram criados com papéis
distintos e que cabe ao homem exercer autoridade em casa e na igreja. Buscam
argumento em trechos da Bíblia, como a recomendação de São Paulo a
Timóteo, um dos líderes do cristianismo primitivo:
“Não permito que a mulher
ensine, nem use de autoridade sobre o marido, mas que esteja em silêncio.
Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E Adão não foi enganado, mas a
mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”.
Segundo Lopes, a referência de Paulo à narrativa do Gênesis para justificar a proibição à ordenação das mulheres revela a crença de que a mulher está mais suscetível ao erro religioso. A ordenação feminina, diz Lopes, é uma violação dos princípios que Paulo percebe na narrativa da criação do gênero humano e na queda do homem.
Os igualitaristas são favoráveis à participação mais ativa da mulher nas religiões, por entender que as diferenciações resultantes do pecado original foram apagadas pelo sacrifício de Cristo. O argumento também está embasado nas palavras de São Paulo: “Não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”, disse aos gálatas.
Segundo Lopes, a referência de Paulo à narrativa do Gênesis para justificar a proibição à ordenação das mulheres revela a crença de que a mulher está mais suscetível ao erro religioso. A ordenação feminina, diz Lopes, é uma violação dos princípios que Paulo percebe na narrativa da criação do gênero humano e na queda do homem.
Os igualitaristas são favoráveis à participação mais ativa da mulher nas religiões, por entender que as diferenciações resultantes do pecado original foram apagadas pelo sacrifício de Cristo. O argumento também está embasado nas palavras de São Paulo: “Não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”, disse aos gálatas.
Além de buscar nas escrituras evidências de mulheres que ocupavam posições de
destaque na igreja primitiva, como as profetisas citadas na Bíblia ou
várias mulheres lembradas por São Paulo em suas cartas às igrejas, os
defensores da ordenação de pastoras argumentam que o texto bíblico deve ser
contextualizado. Para a teóloga Sandra Duarte de Souza, os argumentos
sociológicos atuais são legítimos, mesmo numa discussão religiosa.
“Os
argumentos contra as sacerdotisas só encontram acolhida hoje porque ainda
vivemos numa cultura patriarcal”, diz. “A localização do texto bíblico em seu
contexto histórico permite outras possibilidades de interpretação”, diz Breno
Martins Campos, professor de pós-graduação em religião da PUC de Campinas, São
Paulo.
No século XX, as mulheres
conquistaram espaços nas denominações evangélicas. Nas Assembleias de Deus dos
Estados Unidos, a presença das mulheres nos púlpitos foi oficializada em 1935.
Nas décadas seguintes, elas foram seguidas por metodistas, presbiterianos e
luteranos. A experiência internacional inspirou as igrejas Metodista,
Evangélica de Confissão Luterana e Presbiteriana Independente, no Brasil, a
aceitar mulheres como pastoras.
Nas igrejas pentecostais e neopentecostais,
foram as cantoras gospel que mais contribuíram para aceitação do ministério
feminino. A visibilidade conquistada por cantoras como Ana Paula Valadão e
Cassiane abriu espaço para que fossem nomeadas como pastoras por suas igrejas.
Depois de Cassiane, todas as mulheres de presidentes da Assembleia de Deus
Ministério Madureira passaram a ser ordenadas compulsoriamente.
Estudioso das
Assembleias de Deus, o sociólogo Gedeon Alencar diz que a prática não
representa uma inclusão real, por excluir do sacerdócio as mulheres sem laço
familiar com pastores. A teóloga Sandra discorda. Para ela, a ordenação de
mulheres de pastores ajuda a mudar as concepções sobre o papel da mulher na
igreja.
Na Igreja Católica, a perspectiva da ordenação de mulheres ainda é distante. Quando a Igreja Anglicana, denominação protestante mais próxima dos católicos, passou a ordenar mulheres, em 1994, o papa João Paulo II divulgou uma Carta Apostólica para reafirmar que o ministério é reservado aos homens.
Na Igreja Católica, a perspectiva da ordenação de mulheres ainda é distante. Quando a Igreja Anglicana, denominação protestante mais próxima dos católicos, passou a ordenar mulheres, em 1994, o papa João Paulo II divulgou uma Carta Apostólica para reafirmar que o ministério é reservado aos homens.
O papa Francisco defende mais espaço para as mulheres no catolicismo,
mas não no sacerdócio. “Devem ser valorizadas, não clericalizadas”, reafirma o
papa, em meio a todas as suas promessas de renovação da Igreja Católica.
Fonte: http://epoca.globo.com
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