Hector Babenco leva religião a Veneza – Por Vanessa Wohnrath
O cineasta Hector Babenco,
que estava longe das câmeras desde o lançamento do drama “O Passado” (2007),
estrelado por Gael García Bernal (“No”), voltou às telas no Festival de Veneza.
Ele é um dos diretores envolvidos na obra coletiva “Words of Gods”, antologia
de curtas, que reúne obras de cineastas de vários países, tendo como ponto em
comum a religião.
“Depois de sete anos afastado
estou de volta ao jogo”, declarou Babenco em conversa com a imprensa. “Fazia
tempo que estava fora da grande máquina que é o cinema internacional, mas ainda
sou respeitado no exterior. É o contrário do Brasil, onde eu trabalho como se
fosse um exilado que fez alguns filmes”, desabafou.
“‘O Passado’ deixou um
gosto amargo na minha boca, pois tentei exibi-lo em vários festivais, como
Cannes e Veneza… Mas o convite para integrar ‘Words with Gods’ me devolveu o
fôlego para enfrentar a maratona de novo.”
“Words with Gods” foi idealizado
pelo cineasta mexicano Guillermo Arriaga, diretor de “Vidas que se Cruzam”
(2008) e roteirista de alguns longas do diretor Alejandro González Iñárritu,
como “Amores Brutos” (2000), “21 Gramas” (2003) e “Babel” (2006). A produção
foi filmada em oito países, é falada em dez línguas e explora nove religiões.
Além de Arriaga e Babenco, a
antologia conta com curtas dirigidos pelo espanhol Álex de la Iglesia (“Balada
do Amor e do Ódio”), o iraniano Bahman Ghobadi (“Antes das Lua Cheia”), o
israelense Amos Gitai (“Ana Arabia”), o sérvio Emir Kusturica (“Zanet”), a
indiana Mira Nair (“O Relutante Fundamentalista”), o japonês Hideo Nakata
(franquia “O Chamado”) e o australiano Warwick Thornton (documentário “The
Darkside”).
Dos nove cineastas, Iglesia foi
quem preferiu contar sua história de forma cômica. Intitulada “A Confissão”,
sua participação gira em torno do catolicismo e do ato de se confessar.
“Acho o
humor uma técnica de expressão que nos ajuda a abordar a realidade de forma
mais livre, e isso foi muito importante para falar de religião”, explicou ele
em Veneza.
“Para mim, o perdão dos pecados é a parte mais importante da
religião católica, que é definida justamente pela sua preferência pelo pecador
arrependido em relação àquele que sempre faz o bem. Isso me enche de
esperança.”
Babenco entrou no projeto graças
ao diretor José Padilha (“RoboCop”). “Como ele estava ocupado filmando
‘RoboCop’, acabou me oferecendo a oportunidade de fazer ‘Words with Gods’”,
contou o diretor de “Pixote: A Lei do Mais Fraco” (1981), “O Beijo da Mulher
Aranha” (1985) e “Carandiru” (2003). “O filme traz uma discussão séria, que no
meu caso passa pela experiência da fé brasileira.”
O curta de Babenco, “O Homem que
Roubou um Pato”, gira em torno de um sem-teto (Chico Díaz, de “O Sol do Meio
Dia”) abalado com a morte de seu filho. Sofrendo muito, ele participa de um
ritual religioso em que os maus espíritos são exorcizados por meio da dança.
Arriaga comentou a trama de: “O
Homem que Roubou um Pato”. “Babenco não acredita em Umbanda, mas ele mora no
Brasil, ele tem amigos que seguem essa crença. Babenco ficou tão próximo desse
universo, que só ele mesmo poderia contar essa história.”
Babenco afirmou que quando o
diretor mexicano lhe deu detalhes do projeto, ele disse que queria evitar
qualquer tipo de exotismo sobre a religiosidade. “O contato do personagem em
sofrimento com a religiosidade lhe provoca uma catarse que o permite chorar e,
em meio às lágrimas, tenta superar sua dor.”
“Quando criei a história, havia
uma estrutura que estava neorrealista demais”, explicou o diretor. “Um dia,
passeando pelo Parque do Ibirapuera, eu vi um pato andando. Então, eu percebi
que minha contribuição ao filme poderia ter um toque de absurdo.”
A contribuição foi perfeita,
segundo Arriaga, pois sua proposta com “Words with Gods” é focar nos seres
humanos, no que eles pensam sobre religião e não em Deus. “O objetivo da
produção é despertar um diálogo para que possamos nos entender melhor e nos
tornamos seres humanos melhores”, explicou Arriaga. “É uma obra ambígua que
deixa em aberto todas as interpretações sobre quem é Deus e se ele existe ou
não.”
“Words with Gods” foi planejado
por Arriaga para ser o primeiro de uma franquia de quatro antologias. “Há
alguns temas que não temos permissão para falar à mesa, pois senão causaria
brigas. Por isso vamos fazer mais três filmes, sobre sexo, política e
substâncias.”
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