Número de muçulmanos que se convertem ao cristianismo aumenta em Berlim


Duas vezes por mês, a Igreja da Trindade, no bairro berlinense de Steglitz, é palco de um ritual que chama a atenção.

Logo no início da liturgia de três horas e meia, a pia de batismo é cercada por adultos que recebem o sacramento do pastor Gottfried Martens. Quando batizados, os muçulmanos de Irã, Síria ou Afeganistão têm atrás de si uma odisseia de intolerância, opressão, violência ou guerra civil. 

Com a conversão ao cristianismo, eles dão um ponto final às suas biografias anteriores, nas quais a religião era mais um motivo de conflito do que do encontro da paz.

A Igreja da Trindade, evangélica luterana, não é a única da Alemanha que registra um movimento contra a corrente. Em todo o país, milhares de muçulmanos converteram-se ao cristianismo nos últimos anos. 

Segundo Gottfried Martens, de 52 anos, quanto maior é o debate sobre o fundamentalismo e o jihadismo na mídia, maior é também o interesse de jovens muçulmanos pelas religiões cristãs.

Mas o fundamentalismo religioso nos países de origem é também um fator importante na decisão da conversão. Somaye, uma iraniana convertida ao cristianismo, afirma que resolveu deixar de ser muçulmana no dia em que começou a ser perseguida pela polícia religiosa do seu país.

“Eu estava fora de casa quando fui informada por amigos que a minha casa tinha sido vasculhada pela polícia religiosa, que encontrou no meu quarto uma Bíblia, um delito grave para um muçulmano no Irã”, revela a iraniana de 29 anos.

Uma conversão ao cristianismo só é possível no exílio. Países como o Irã, que têm uma polícia religiosa com poderes ainda maiores do que a Justiça comum, classificam a conversão como um crime tão grave que deve ser punido com a pena de morte.

Para evitar a perseguição no exílio, a igreja alemã mantém sigilo sobre os convertidos, embora o batismo, que é a coroação do processo de conversão, seja aberto ao público. 

A Igreja da Trindade batiza atualmente mais adultos muçulmanos do que crianças. Dois domingos do mês são dedicados ao batismo de muçulmanos adultos, enquanto os domingos restantes, alternados, têm como centro da liturgia o batismo de crianças.

Com orações rezadas em farsi (idioma do Irã) e em árabe, a missa dos convertidos da igreja de Steglitz termina com comemorações pelos novos cristãos e um bufê com especialidades dos países de origem dos batizados.

Como não consegue mais atender à demanda de todos os interessados, o pastor Martens, que batizou 350 muçulmanos no ano passado, pediu ajuda de paróquias vizinhas, que passaram a abrir mais espaço para receber os novos cristãos.

O primeiro passo é o curso intensivo de catecismo. Para impedir que a conversão seja uma decisão pouco pensada, os padres e pastores encarregados da catequese costumam ter longas conversas com os interessados sobre os motivos que os levaram à decisão. Com isso, eles querem evitar que a opção pelo cristianismo seja uma tática para obter mais direitos como imigrantes na Alemanha. Muçulmanos convertidos ao cristianismo têm mais facilidade em obter visto de residência.

Cada um tem uma história diferente para contar, mas há um elemento em comum: uma situação de conflito extremo. O iraniano Elia Hosseini, de 20 anos, sofreu na adolescência uma "opressão dupla", da polícia religiosa e do próprio pai, um muçulmano fundamentalista que teria tentado assassinar o filho por não tolerar os contatos que este tinha com cristãos.

“Ser cristão significa para mim ter a sensação da mais profunda liberdade”, diz o iraniano, que todo domingo frequenta a igreja de Steglitz.

Em Berlim, os novos cristãos preferem a igreja luterana, que tem liturgias mais festivas, com mais músicas sacras e um sermão mais longo. Mas também igrejas católicas do Ocidente do país, como em Colônia, registram um grande interesse de muçulmanos pela conversão.

Talvez influenciado pela própria experiência, Hosseini diz que o cristianismo é a religião da alegria, enquanto o Islã é uma religião triste. “Aqui em Berlim, as pessoas sorriem quando cantam na liturgia; já nas mesquitas do Irã, eu só tinha vontade de chorar”, lembra ele.

O jovem iraniano ressalta, porém, que o problema não é a religião em si: “O problema é como a religião nos países islâmicos é instrumentalizada como parte do sistema de opressão. Uma religião que deixa as pessoas decidirem livremente se vão ou não à igreja, quais alimentos ou bebidas consomem, é um enriquecimento espiritual e não uma limitação da vida. Já o Islã é frequentemente o oposto”.


Segundo o pastor Martens, as entidades islâmicas, como o Conselho Central dos Muçulmanos da Alemanha, reagem com tolerância. Mas muitos dos convertidos são alvo de agressões de outros muçulmanos. Sobretudo os convertidos que moram no bairro de Neukölln, no Sul de Berlim, onde vivem mais muçulmanos, fundamentalistas e imãs pregadores da inimizade entre as religiões, os homens e mulheres jovens mantém sigilo absoluto de que foram batizados como medida da própria segurança.






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