Religião e Política – Por Auremácio Carvalho
Os grupos da "bancada
evangélica" entram em confronto direto com parlamentares de tendências
mais liberais.
Temos assistido, nos últimos
tempos, um acirramento da temática religiosa no âmbito do Congresso Nacional e
também, nos meios e redes sociais, em manifestações populares, em debates
calorosos na mídia e outros foros.
A escolha da Presidência do Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal é um exemplo marcante: grupos da chamada "bancada evangélica" em confronto direto com parlamentares de tendências mais liberais, no que toca a questões como a homossexualidade, união afetiva de pessoas do mesmo sexo; aborto e outros temas. A situação é preocupante por várias razões: O Brasil é um estado "laico", ou seja, não religioso ou confessional;
A escolha da Presidência do Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal é um exemplo marcante: grupos da chamada "bancada evangélica" em confronto direto com parlamentares de tendências mais liberais, no que toca a questões como a homossexualidade, união afetiva de pessoas do mesmo sexo; aborto e outros temas. A situação é preocupante por várias razões: O Brasil é um estado "laico", ou seja, não religioso ou confessional;
A Constituição Federal garante a
liberdade de pensamento, inclusive de credos ou manifestações religiosas. E,
ainda, o Poder Público garante tais manifestações. No artigo 5º da Constituição
Brasileira (1988) está escrito:
“VI - é inviolável a liberdade de consciência e
de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e
garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;”
"Somente a tolerância e o
respeito à desigualdade de opinião e prática nesse terreno movediço pode nos
salvar de extremismos políticos e religiosos, como assistimos no atentado
francês a jornalistas ou a decapitação de 'infiéis".
Em um Estado laico, todos
cidadãos e instituições são laicas no âmbito público, quer dizer, quando se
trata do que a todos concerne, e cada cidadão tem suas próprias crenças e
preferências em seu âmbito privado.
O laicismo é precisamente a ordem
político-jurídica que garante essa identificação do público com uma opção
religiosa, protege a liberdade de pensamento no âmbito privado donde é
inviolável, assim como sua livre expressão sem mais limite que a ordem pública:
a liberdade dos demais.
E mais: em um Estado moderno, a decisão sobre o bem ou
o mal e outras questões morais estão restritas, protegidas e garantidas, ao
espaço privado da consciência individual. Desta forma se assegura a liberdade
individual para pensar e viver de acordo à própria ética e se proíbe que o
poder público possa impor uma religião ou moral particular ao conjunto da
sociedade, respeitando assim a liberdade de pensamento, eleição, decisão, ação
e crença de cada cidadão.
Respeita-se, até, a opção do
cidadão de não ter religião nenhuma: ateus, agnósticos, os "sem
religião" etc; aliás, mais de 8% da população brasileira no último censo
do IBGE. Atitudes
"fundamentalistas", ou seja, radicais, no sentido de impor ao país ou
a grupos sociais, um pensamento único, são reprováveis, pois criam um clima de
confronto direto, como temos visto.
Sendo o Brasil um Estado Laico, o
que significa que não se confunde com nenhuma religião, não adota uma religião
oficial, permite a mais ampla liberdade de crença, descrença e religião, com
igualdade de direitos entre as diversas crenças e descrenças e no qual
fundamentações religiosas não podem influir nos rumos políticos e jurídicos da
nação; penso eu.
Já bastam o caminhão de problemas políticos, éticos,
econômicos e sociais que temos. Um exemplo: a executiva nacional do PSOL
suspendeu, (26/03), o deputado federal Cabo Daciolo (RJ), encaminhando ao
diretório nacional a decisão sobre sua permanência no partido.O motivo, segundo
nota divulgada, foi a apresentação de uma proposta de emenda constitucional que
pretende mudar o artigo 1º da Constituição Federal:
“Todo poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente'', para “Todo
poder emana de Deus''. Estaríamos, assim, inaugurando um "Estado
Teocrático" nos moldes dos Aiatolás, Irã, Estado "Islâmico" e
outros.
Outro exemplo moderno: No Reino
Unido (Inglaterra), quando uma pessoa assume o cargo de chefe de governo, Primeiro Ministro, é necessário que jure fidelidade à fé anglicana. O cargo de
chefe de Estado e da igreja oficial Anglicana pertencem à mesma pessoa, a
Rainha Elizabeth II.
O estado também garante que vinte e seis membros do clero
da Igreja da Inglaterra sejam membros da câmara alta do parlamento. Por estes e
outros motivos o Reino Unido não pode ser considerado um Estado totalmente
secular.
No Brasil, o ensino religioso nas
escolas é matéria curricular, porém de matrícula e frequência facultativas-
(Art. 210,§1°- CF- "O ensino religioso, de matrícula facultativa,
constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental") e, seu conteúdo são noções gerais e de história dos grandes
grupos religiosos, filosóficos, mas, não se trata de catequese; o que, infelizmente,
ocorre muitas vezes. Os pais têm o direito de permitir ou não que seus filhos
frequentem essa disciplina.
O que difere das escolas
confessionais,católica ou evangélicas, por exemplo, onde os pais sabem o
direcionamento da escola nesse assunto. Por fim, vale ressaltar que um Estado
Secular não implica a eliminação da religião; o Estado Laico deve garantir a
liberdade religiosa, respeitando os traços religiosos culturais e da tradição
do povo.
Com bem acentua Bobbio; " O
Estado laico, quando corretamente percebido, não professa uma ideologia
laicista, se com isso entendemos uma ideologia irreligiosa ou anti-religiosa”
(BOBBIO 1986).
Creio que essa seja melhor posição; ao contrário do que
assistimos na última campanha eleitoral, ou seja, o uso e abuso das religiões
por todos os candidatos, buscando o apoio dos "caciques religiosos",
que são donos de partidos políticos ou usam seus fiéis como "curral
eleitoral".
Nas civilizações antigas a religião era majoritariamente politeísta e as pessoas não possuíam liberdade de escolha religiosa, pois adoravam os Deuses que o soberano impunha ou os Deuses da cidade em que viviam, além disso, quando um povo era dominado, eram-lhe impostos os Deuses dos conquistadores e os Deuses dos conquistados eram banidos dos cultos. Aqueles que se recusassem a adorar as deidades impostas eram condenados a pagar sua afronta com a própria vida.
Nas civilizações antigas a religião era majoritariamente politeísta e as pessoas não possuíam liberdade de escolha religiosa, pois adoravam os Deuses que o soberano impunha ou os Deuses da cidade em que viviam, além disso, quando um povo era dominado, eram-lhe impostos os Deuses dos conquistadores e os Deuses dos conquistados eram banidos dos cultos. Aqueles que se recusassem a adorar as deidades impostas eram condenados a pagar sua afronta com a própria vida.
Somente a tolerância e o respeito
à desigualdade de opinião e prática nesse terreno movediço podem nos salvar de
extremismos políticos e religiosos, como assistimos no atentado francês a
jornalistas ou a decapitação de "infiéis".
"A César o que é de César; a
Deus o que é de Deus”, já disse o Mestre nazareno, há mais de dois mil anos e
continua atual o seu recado.
Auremáco Carvalho é advogado
em Cuiabá, foi ouvidor da Polícia em Mato Grosso.
Fonte: http://www.midianews.com.br
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