Lavagem do Bonfim une católicos e povo de santo na BA: 'lição ao mundo' – Por Henrique Mendes
Festa com dois séculos de
história ocorre nesta quinta (14/01), em Salvador. Fiéis percorrem oito quilômetros entre igrejas do Comércio e Bonfim.
Entre as Igrejas Basílicas de
Nossa Senhora da Conceição da Praia e do Santuário Senhor do Bonfim, em
Salvador, um “tapete” de cor branca se estende em 8 km de caminhada. Lado a
lado, devotos do catolicismo e do candomblé vão às ruas, na manhã desta
quinta-feira (14/01), celebrar ao Senhor do Bonfim e a Oxalá.
“A Lavagem do Bonfim é um momento de
integração entre diversas religiões, devotos, turistas e políticos. Na verdade,
é um grande encontro. Em um momento de terrorismo, em que a religião é usada
como instrumento que contribui para a violência, estamos aqui dando uma lição
ao mundo”, resume o padre Edson Menezes, reitor da Igreja do Bonfim, sobre o
sincretismo que envolve a festa.
Pesquisador da afrobaianidade e
professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Gildeci Leite explica que
Senhor do Bonfim e Oxalá são entidades diferentes, que se complementam.
“Oxalá é o filho mais velho de
Olorum [Divino Criador], aquele que habita o céu. Dentro da proposta
espiritualista, entendemos que o Senhor do Bonfim é o filho de Oxalá”, detalha.
Para os católicos, o Nosso Senhor do Bonfim é a representação do Cristo
Crucificado.
Historicamente, a fé do povo de
santo e dos católicos se entrelaça. Leite detalha que um dos símbolos desse
cruzamento entre as religiões está nas vestimentas brancas usadas pelos fiéis.
“Oxalá é o Senhor do Pano
Branco”, explica sobre a absorção do ritual na festa católica. “A grande
importância vem aí. A cultura negra foi associada à Lavagem do Bonfim”,
complementa.
Gildeci Leite acredita que o
sincretismo entre as religiões, inclusive, foi responsável por eleger um novo
padroeiro para a capital baiana. “São Francisco de Xavier é o padroeiro de
Salvador, mas todo mundo jura de pé santo que é o Senhor do Bonfim. E o que é a
voz do povo?”, brinca.
Para o padre Edson Menezes,
reitor da Igreja do Bonfim, o encontro entre as religiões nos festejos da
Lavagem do Bonfim é visto com respeito pela Igreja Católica. “Como nós sabemos,
o sincretismo resultou de um momento histórico de colonização. Encaramos isso
com respeito e consideração. Achamos que é algo próprio da cultura que deve ser
valorizado e reconhecido”, afirma.
A festa do Senhor do Bonfim
ocorre desde 1750, incorporando em sua trajetória religiosidade e
características profanas. Informações da Secretaria de Turismo apontam que a
tradição da lavagem começou com os escravos, quando eles preparavam o templo
para o domingo festivo.
Mulheres vestidas com trajes brancos e de torços na
cabeça colhiam água em uma fonte do bairro do Bonfim, que era levada à Colina
Sagrada em lombo de burro. Durante o trabalho, cantava-se e dançava-se. Desde
então, as homenagens acontecem sempre no segundo domingo após o dia 6 de Janeiro, data em que a Igreja celebra a Festa de Reis.
“A Lavagem do Bonfim tem
conotação religiosa e profana. Está presente ali a religiosidade popular e
piedade. Consideramos um grande evento de fé e esperança”, atesta o padre Edson
Menezes.
Programação Religiosa
A programação em homenagem
ao Senhor do Bonfim, considerado o padroeiro de coração dos baianos, foi aberta
no dia no dia 7 de janeiro, com o início do novenário (que é interrompido no
dia a lavagem), e segue até domingo (17/01), quando se celebra o Senhor do
Bonfim.
Nesta quinta-feira, às 8h,
conforme a Secretaria de Cultura do Estado (Secult), está previsto o ato
inter-religioso na Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia. Neste
momento, representantes da Igreja Católica, da Federação Espírita e da tradição
religiosa afrobrasileira passam mensagens para os fiéis. Durante todo o ato, há
a participação do Coral Basílico da Conceição da Praia regido pelo Maestro
David Alves Tourinho.
Logo depois, começa a caminhada
saindo da Basílica Santuário Nossa Senhora da Conceição da Praia, no Comércio,
até o Bonfim. A Secult detalha que cinco pontos de fogos de artifício estão
espalhados durante o percurso: na Marina, ao lado da Escultura Mário Cravo
(Comércio); Mercado do Peixe (Águas de Menino); Praça Irmã Dulce (Largo de
Roma); Largo da Calçada; e Alto da Colina Sagrada. Uma série de entidades
civis, católicas e do povo de santo participam da caminhada. Dentre elas estão
o grupo "Devoção do Senhor do Bonfim" e o "Afoxé Carinagô".
No domingo, a programação tem
início às 4h30, com alvorada e repique dos sinos, seguido de missas às 5h, 6h e
7h30. A novidade durante a Lavagem é que os fiéis poderão passar pela
"Porta da Misericórdia", na Basílica Santuário Senhor do Bonfim, para
pedir perdão pelos pecados.
Às 12h acontece a acolhida às baianas pelos membros
da Irmandade (Devoção do Senhor do Bonfim) e entrega das vassouras para a
lavagem do adro da Basílica; após o ritual da lavagem do adro, a imagem
Peregrina do Senhor do Bonfim ficará próxima à porta principal na Basílica
Santuário para veneração pública até 18h; Já às 16h, Fiéis participam da
Procissão dos Três Pedidos, com saída da Igreja dos Mares em direção à Colina
Sagrada, onde dão três voltas em torno da Basílica, fazendo os três pedidos. A
bênção do Santíssimo Sacramento e a queima de fogos de artifício finalizam as
homenagens ao santo.
Fonte: http://g1.globo.com
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