Um encontro histórico “para que as pessoas saibam que a religião é importante" – Por Filipe d'Avillez
Marcelo Rebelo de Sousa fez
história ao visitar a Mesquita de Lisboa no dia da sua inauguração. Entre as 18
religiões presentes não houve dúvidas sobre a importância do evento, nem de que
Portugal, neste campo, “é exemplar”.
Tiago Calaím tem oito anos e esta
quarta-feira esteve na Mesquita Central de Lisboa, integrado num grupo de
crianças de diferentes confissões religiosas, para saudar o novo Presidente da
República na sua chegada ao encontro inter-religioso que teve lugar no dia em
que foi empossado.
Para o jovem evangélico tratou-se
de um evento significativo “para as pessoas saberem que isto é muito
importante”. "Isto", entenda-se, é a religião.
No mesmo grupo que Tiago estavam
crianças budistas, hindus, muçulmanas e sikhs. A maioria destas palavras ele
nem as conhece, mas quando lhe perguntamos que outras religiões estavam
representadas fala nos “muçulmanos e nos indianos”.
É certo que os indianos não são
uma religião em si, mas não deixa de ser verdade que muitas das comunidades
presentes na mesquita esta tarde têm as suas raízes na Índia. É o caso dos
hindus, evidentemente, mas também dos sikhs e até dos muçulmanos, uma vez que a
espinha dorsal da comunidade islâmica de Lisboa é oriunda da Índia, por via de
Moçambique.
Se na Índia os episódios de
violência inter-religiosa são infelizmente comuns, em Portugal a realidade é
outra. “Nós trabalhamos em conjunto, ajudamo-nos uns aos outros. Aqui não há
tensões, temos um bom relacionamento entre todas as comunidades”, diz Kantilal
Vallabhdas, da comunidade hindu do Templo de Shiva, em Santo António de Cavaleiros.
O sorridente Palwinder Singh está
ao seu lado, acompanhado de outros dois membros da comunidade sikh,
impressionantes com as suas barbas e turbantes coloridos. Singh diz, num
português esforçado, que este foi um encontro “muito bom” e que um dia
gostariam que o novo Presidente visitasse o seu templo.
Ao lado de Palwinder Singh, o
sacerdote da comunidade, com uma barba que chega até ao meio do peito, mostra-nos
orgulhosamente o seu kirpan, a adaga cerimonial que todos os homens sikh devem
usar em todas as alturas.
O kirpan simboliza a prontidão para lutar pelo bem e
contra o mal, mas representa também uma dor de cabeça para os protocolos de
segurança em eventos inter-religiosos com figuras mundiais.
Quando Bento XVI
visitou os Estados Unidos, os sikhs não puderam participar num encontro
inter-religioso na Casa Branca porque se recusaram a entrar sem esta arma.
Com este evento na mesquita a
questão nem se pôs e a segurança à volta do evento estava claramente relaxada.
Sinal claro, também, de que as comunidades religiosas em Portugal não são
vistas como ameaça.
“Costumo dizer que temos a felicidade de termos aqui uma
grande harmonia religiosa e essa harmonia deriva da conjugação de duas
variáveis, por um lado uma sociedade portuguesa que recebe bem os imigrantes”,
diz Khalid Jamal, um jovem que faz parte da direcção da Comunidade Islâmica de
Lisboa.
Para este jovem muçulmano a
decisão de Marcelo Rebelo de Sousa de visitar a mesquita, logo neste dia tão
importante, “representa um sinal claro de que a nossa classe política e o
senhor Presidente da República vai, neste mandato, dar importância ao fenómeno
religioso. Sendo muçulmano, é particularmente importante no sentido de evitar a
radicalização de que tanto se tem falado, sobretudo ao nível europeu”, diz
ainda.
Cristãos de “todas as cores”
Entre as 18 religiões
representadas no encontro na mesquita encontravam-se várias confissões cristãs
diferentes. Evangélicos, presbiterianos, anglicanos, ortodoxos e católicos,
entre outros.
Da parte dos presbiterianos, D.
Sifredo Teixeira realça “o reconhecimento oficial da importância da
contribuição de cada uma das realidades religiosas" presentes em Portugal
e revela que foi uma “grande alegria de poder participar neste tempo histórico
em que é reconhecida a diversidade e também a sua riqueza”.
Com esta presença estará Marcelo
Rebelo de Sousa a indicar que vai ter uma presidência mais atenta ao fenómeno
religioso? “Essa é a nossa esperança, porque a contribuição religiosa ajudará
muito e deve ser muito valorizada para o bem do país”, diz o líder presbiteriano.
Marcelo "será sempre um
defensor da liberdade religiosa", disse o próprio. No seu discurso na
mesquita, Marcelo afirmou que "Portugal foi grande" sempre que se
abriu ao outro e a outras culturas, civilizações e religiões.
O sheikh David Munir, hoje a
jogar em casa, faz um balanço muito positivo do evento. “Foi histórico, foi
muito marcante e só demonstra que há pessoas que querem a paz, há pessoas que
querem o diálogo e há pessoas que respeitam as outras confissões e as outras
comunidades. No que diz respeito ao diálogo inter-religioso, Portugal foi
sempre exemplar”, diz.
Ivone Felix, da comunidade
baha'í, concorda. “É muito importante, porque isto é uma maneira de o senhor
Presidente demonstrar que realmente está interessado em manter esta boa relação
entre as religiões e as comunidades”.
Já à saída da mesquita um grupo de
muçulmanas guineenses, vestidas com roupa e véus coloridos, não escondem a sua
alegria por terem estado presentes, nem a sua admiração pelo Presidente. “É um
Presidente social, comum, é por isso que estamos contentes. Por ele fazemos
tudo, com chuva, frio ou de qualquer maneira”.
Fonte: http://rr.sapo.pt
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