Greve de professores empata com a maior da história da categoria
A greve dos professores de
universidades e institutos federais completa 112 dias nesta quarta-feira,
empatando em termos de duração com a maior paralisação docente já realizada no
País, em 2005.
Atualmente, segundo o Sindicato Nacional dos Docentes das
Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), são 60 instituições paralisadas -
54 universidades, quatro institutos e dois centros tecnológicos. Os docentes
realizam assembleias até amanhã para decidir se mantêm ou não o movimento - até
lá, no entanto, a greve já terá entrado para a história como a maior
paralisação da categoria.
Desde o início da greve dos
professores, iniciada no dia 17 de maio, dois nomes vêm sendo repetidos à
exaustão: Andes e Proifes. Ambas são entidades que representam a mesma
categoria, mas que têm diferenças significativas em suas formações, atuações e
convicções ideológicas.
Dois sindicatos, uma categoria: veja diferenças entre
Andes e Proifes. Durante tudo esse tempo houve um impasse nas negociações, em
13 de julho, o governo apresentou sua primeira proposta, rejeitada pela
categoria. No dia 24 do mesmo mês, foi apresentada uma nova proposta, aceita
apenas pela Proifes, que representa a minoria dos docentes. Após assinar com a
entidade, o governo encerrou as negociações.
"Ainda há um questionamento
se é possível chamar o que houve de negociação, pois a segunda proposta do
governo apenas alterou algumas questões, sem alterar essência", critica o
1º vice-presidente do Andes, Luiz Henrique Schuch.
Segundo ele, a postura do governo
diante da greve é o que justifica a longa duração do movimento. "O governo
tem estado de costas para as universidades", diz. Em nota, o Ministério da
Educação (MEC) defende a proposta encaminhada ao Congresso, afirmando que nela
"o governo busca a valorização da dedicação exclusiva e da titulação dos
docentes".
No final de agosto, o Andes
protocolou no Ministério do Planejamento e no Planalto uma contraproposta em
que a categoria abre mão de aumento e dá preferência à reestruturação da
carreira. O documento pede que, a cada degrau de progressão, os professores
tenham ajuste de 4% - anteriormente, o percentual desejado era 5%.
O Proifes
criticou a contraproposta por acreditar que ela não valoriza a titulação do
profissional e poderia prejudicar a progressão na carreira, e o governo
reafirmou que as negociações estavam fechadas.
"Há prejuízos com a greve,
mas manter a educação como está é um prejuízo muito maior. Em boa medida, a
sociedade entendeu isso. Houve sintonia entre as demandas do movimento e da sociedade,
que pede uma educação de qualidade", avalia Schuch. Eduardo
Rolim,
presidente do Proifes, considera a greve vitoriosa por ter reaberto as
negociações. "O objetivo central, que era fazer o governo voltar à mesa,
foi atingido", diz.
Uma nota divulgada nesta semana
pelo MEC afirma que "professores de todas as universidades estão retomando
suas atividades" e que o órgão espera "o rito sindical para a volta
total das atividades acadêmicas". O informe diz, ainda, que o ministério está
recebendo e analisando o planejamento das instituições com relação à reposição
dos dias parados.
Raízes
O senador Cristovam Buarque
(PDT-DF), vê a perda da "utilidade" das universidades como um dos
fatores que estão na origem da greve docente. Para ele, as universidades não
estão adaptadas aos desafios atuais, se estruturando da mesma forma desde o
século 20.
"Antes, quem ia para a universidade tinha o emprego garantido. Hoje, as empresas formam seus próprios profissionais. A universidade não
corresponde às expectativas. A greve dura 112 dias porque o governo não vê
utilidade nessas instituições", opina o senador ao explicar o que chama de
"inversão de prioridades" do governo, que investiria em outros
setores, em detrimento da educação.
Buarque diz, ainda, que a
paralisação está perto do esgotamento. "Quando uma greve acaba, as pessoas
voltam satisfeitas, mas quando se esgota ocorre o contrário. Isso pode refletir
na redução do empenho de professores e alunos", alerta.
Para Mateus Prado, presidente do
Instituto Henfil, a expansão das universidades, iniciada no governo Lula,
também está na raiz da paralisação. De acordo com Prado, o aumento do orçamento
de cada instituição ficou condicionado à adesão ao Programa de Apoio ao Planos
de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), e quando as
universidades aderiram à iniciativa, mais de 120 campus foram abertos em todo
Brasil, nem sempre com a estrutura adequada.
"Dentro dos critérios para
aderir ao Reuni havia uma cota de números de alunos por professor. Quem cumpriu
essa cota foram os novos professores dos novos campi, que ganhavam menos que os
outros. Isso criou uma diferença entre os docentes", diz, acrescentando
que, quando esses professores conseguiram estabilidade, passaram a reivindicar
melhores condições de trabalho.
"No máximo em dois anos
teremos uma nova greve. Os professores que estão na base estão longe de casa,
da família e ganhando pouco", diz Prado, se referindo aos docentes dos
campi criados na expansão universitária.
"Isso, ao longo do tempo, faz muita
diferença. Esses docentes não têm tempo de fazer pesquisa ou se especializar.
Com isso, nós caminhamos para um cenário semelhante ao de governo FHC",
afirma.
A professora Elizabeth
Balbachevsky, do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo,
concorda com Prado ao afirmar que há perspectiva de uma nova greve em breve.
"O grande problema futuro é que os docentes saem da greve com gosto de
derrota. Se o cenário econômico seguir o mesmo, a chance de uma situação
semelhante é muito grande no próximo ano. O problema vai se tornar mais agudo,
e o grande prejudicado é o aluno", declara.
A professora identifica três
raízes para o movimento grevista atual. Primeiro, um sentimento de frustração
que teria acompanhado a tentativa do governo federal de conter os gastos no
início do novo governo, devido ao cenário econômico, algo que ela define como
catalisador do movimento.
"Nessa situação econômica, era impossível que
essa gestão seguisse fazendo o que o governo Lula fez, que foi 'pagar o sossego'
das universidades federais com aumentos, empurrando os salários dos professores
e compensando defasagens", argumenta.
Assim como Prado, ela também vê
na expansão das universidades um fator que contribuiu para a deflagração da
greve. "As universidades que aderiram ao Reuni não tiveram suas
expectativas atendidas, e o governo não bancou a infraestrutura para acompanhar
a expansão", analisa. Elizabeth aponta, ainda, uma questão que, segundo
ela, vem de mais longe - a carreira docente.
Para a professora, a carreira foi
montada tendo em vista um Brasil com poucos doutores. "Os professores que
já entram com doutorado têm poucas perspectivas de crescer", aponta.
Fonte: http://noticias.terra.com.br
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