Uma análise sistemática da tríade: Psicologia, Psicoterapia e Espiritualidade – Por José Geraldo Rabelo
Em tempos de crise os
consultórios de Psicologia e Psicoterapia recebem um número bastante relevante
de clientes com as mais diversas queixas ou, até mesmo, sem saber o porquê
chegaram a procurar um profissional de tal área.
A cada dia que passa percebo a
confusão que tem sido feita sobre religião e religiosidade por profissionais
que trabalham com comportamentos, emoções, sensações e afetos, psicólogos,
psicoterapeutas e psiquiatras. Alguns, chegando ao absurdo, de proibir o seu
cliente de procurar ajuda espiritual. Outros colocando que religião não deve
ser misturada ao processo psicoterápico.
Uns exigem que seu cliente se torne ou
siga a sua (profissional) religião. Eu, se me permitem, não tenho religião; mas
religiosidade, pois tenho que “religião é uma neurose coletiva” (Freud).
Portanto, a confusão por parte de clientes e profissionais parece estar criando
barreiras cada vez mais evidentes quanto à verdadeira busca do cliente e
daquilo o qual o profissional está preparado para oferecer ao seu cliente para
que o mesmo possa estar mais bem preparado para viver a própria vida junto ao
mundo que o cerca. Todos nós carregamos conflitos religiosos no self e estes
devem ser esclarecidos e trabalhados.
Não podemos negar que o homem é
um ser bio-socio-psico-espiritual sob grande influência cultural e econômica.
Assim sendo e é, não podemos deixar de levar em conta todo o contexto que o
mesmo está inserido. Falar sobre a “influência espiritual” ao paciente é
diferente de afirmar ou induzi-lo a uma religião. É mostrá-lo sob a ótica da
espiritualidade seus conflitos psicoemocionais e afetivos.
A maioria de nós nasce sob a
influência direta ou indireta de uma religião. A razão mais comum pela qual as
pessoas se voltam para a espiritualidade é lidar com o sofrimento. Elas não
tomam essa decisão por acaso, e sim porque toda religião afirma ser capaz de
aliviar a dor, que a fé transcende os sofrimentos da carne, que a alma é um
refúgio para o coração angustiado.
No entanto, quando se voltam para Deus, para
a fé ou para a alma, muitas não encontram alívio, ou deparam-se apenas com o
consolo que poderiam obter em uma conversa com um terapeuta. A terapia funciona
para aqueles que a procura, e as formas mais comuns de sofrimento, ansiedade e
depressão respondem em curto prazo aos medicamentos, mas não atinge a cura.
Quando a depressão desaparece, existe alguma razão para nos voltarmos para o
espírito?
Em primeiro lugar devemos saber
que dor e sofrimentos não são sinônimos. Se não interferirmos, o corpo elimina
espontaneamente a dor, livrando-se dela no momento em que a causa subjacente é
curada. O sofrimento é a dor à qual nos agarramos. A pessoa tem o pensamento
voltado no misterioso instinto da mente de acreditar que a dor é boa, que não
pode ser evitada ou que a pessoa a merece. Se nenhuma dessas ideias estivesse
presente, o sofrimento não existiria.
É preciso energia mental para criar o
sofrimento, uma mistura de crença e percepção sobre a qual a pessoa julga não
ter controle. Contudo, por mais inevitável que o sofrimento possa parecer, a
maneira de escapar não é atacando o sofrimento em si, e sim se dirigindo a
irrealidade que faz com que nos agarremos à dor. Viver a realidade é extinguir
o sofrimento.
A causa secreta do sofrimento é a
irrealidade em si. O início do sofrimento envolve a recusa da pessoa de
enxergar a verdadeira situação. Quando uma terrível desgraça acontece, por
exemplo, quando as pessoas são demitidas, abandonadas pelo cônjuge ou recebe um
diagnóstico de câncer, quinze por cento procuram um aconselhador, terapeuta ou
alguma igreja para obter algum tipo de ajuda. O restante assiste à televisão
(válvula de escape). Elas se recusam até mesmo a considerar a possibilidade de
examinar o problema ou de discuti-lo com alguém capaz de ajudar.
Parece
absurdo; mas escolher assistir televisão é a substituição da dor pelo prazer.
Enquanto bebemos, nos drogamos, fazemos compras, viajamos e bailamos ao som das
trombetas da ilusão; não sentiremos muita dor, mas podemos estar sofrendo
profundamente, sendo que a única saída é tomar medidas para se colocar frente a
frente com a origem do sofrimento. O primeiro passo a ser dado é estar disposta
a examinar o que realmente está acontecendo. Sair da ilusão e viver a
realidade.
A realidade é percepção e a
pessoa que sofre é dominada por percepções negativas que ela mesma cria. A
percepção mantém a dor sob controle, não por reduzi-la, e sim por evitar uma
dor ainda maior. É essa peculiaridade que a maioria das pessoas tem mais dificuldade
de entender.
O corpo elimina automaticamente a dor, mas a mente pode
neutralizar esse instinto ao transformar a dor em uma coisa “boa”, no sentido
de que ela é melhor do que outras possibilidades talvez piores. A confusão e o
conflito interior são os motivos pelos quais a mente tem tanto dificuldade em
curar a si mesma, apesar de todo o seu poder. Esse último foi lançado contra si
mesmo e, por conseguinte, a percepção, que poderia acabar instantaneamente com
o sofrimento, prefere fechar a porta. “A neurose é a fuga da dor verdade ou
real” Carl G. Jung.
Quando mostramos ao indivíduo que
seu momento atual é resultado de suas escolhas ao longo de sua vida, a maioria
não concorda; mas o ego quer ser o primeiro; por conseguinte, ele não tem
escolha, a não ser envolver-se em um interminável jogo de comparação com os
outros. Enquanto você se comparar com os outros, seu sofrimento continuará como
uma forma de você se enquadrar. Porém, tudo é fruto de nossas escolhas, e toda
ela leva a um resultado positivo ou negativo, que propiciará outras escolhas e
assim sucessivamente.
Diante da escolha, a maioria das
pessoas prefere preservar seus relacionamentos a parar de sofrer. O
relacionamento saudável baseia-se na percepção consciente; nele, os dois
parceiros procuram romper antigos hábitos que promovem o sofrimento. Eles
precisam manter um equilíbrio sutil entre a compreensão e o desapego. Ninguém
sofre sozinho, e mesmo que você faça todo esforço para sofrer em silencio, vai
afetar os outros que estão à sua volta.
O sofrimento é uma condição humana. A
razão pela qual as pessoas têm tanta dificuldade em conseguir um relacionamento
saudável é o fato de a vida na família de origem ter exigido uma boa dose de
inconsciência. Fazemos vista grossa ao que não queremos ver; permanecemos em
silêncio com relação a coisas difíceis demais para discutir; respeitamos os
limites mesmo quando eles colocam alguém em uma situação difícil. Em resumo, é
na família que aprendemos a rejeitar a dor, e a dor repelida é apenas outro
nome para o sofrimento.
Finalmente, não conseguimos ver
um bom processo psicoterápico deixando de lado explicações espiritualistas que
possam ser discutidas com o paciente sem, contudo, ferir ou interferir em sua
crença religiosa.
Religião é algo particular e escolha de cada um e temos o
dever de respeitar; espiritualidade é algo que está inserido no contexto humano
e longe de ser uma escolha, pois é uma condição sine qua non ao homem na terra;
uma condição do Ser holístico e independe de sua crença religiosa. Na verdade,
nada existe fora do Self (Eu verdadeiro ou ser espiritual). A única meta que
vale a pena alcançar é a total liberdade de ser você mesmo, sem ilusões e
falsas convicções.
(José Geraldo Rabelo, psicólogo
holístico; psicoterapeuta espiritualista; parapsicólogo; filósofo clínico;
especialista em Família, Depressão, Dependência Química e Alcoolismo; escritor;
palestrante).
Fonte: http://www.dm.com.br
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