A educação em escombros
Se ainda faltasse alguma prova da
crise educacional brasileira, o novo relatório da Confederação Nacional da
Indústria (CNI) sobre a escassez de pessoal para a construção seria mais que
suficiente.
Durante muito tempo as construtoras foram uma das principais portas
de entrada para o trabalho urbano. Absorviam enormes contingentes de mão de
obra de baixa escolaridade e ofereciam ocupação mesmo a analfabetos.
Programas
de investimento em obras de infraestrutura e em construções habitacionais
contribuíam de forma importante para a criação direta e para a manutenção de
empregos. Hoje essa porta é muito menos ampla, porque a tecnologia mudou e a
atividade requer outro tipo de trabalhador. Mas a política educacional foi
incapaz de acompanhar essa mudança e o descompasso é evidenciado, mais uma vez,
pela sondagem da CNI.
Mesmo com o ritmo de produção
abaixo do esperado, o setor da construção continua encontrando muita
dificuldade para contratar mão de obra adequada às suas necessidades. O
problema foi apontado por 74% das 424 empresas consultadas na sondagem
recém-divulgada. Há dois anos a queixa havia aparecido em 88% das respostas,
mas o nível de atividade era bem mais alto e isso se refletia na procura de
trabalhadores. Mas o detalhe mais alarmante é outro.
A falta de pessoal para as
atividades básicas, pedreiros e serventes, foi apontada por 94% das firmas
com problemas para preenchimento de quadros. Parcela pouco menor (92%) indicou
escassez de funcionários técnicos para ocupações ligadas diretamente à obra.
As indústrias consultadas
mencionaram problemas para preenchimento de postos em todos os segmentos e em
todos os níveis administrativos. Em relação à gerência, por exemplo, queixas
foram apresentadas por 69% das empresas com dificuldades de contratação.
De modo
geral, os níveis de insatisfação quanto às condições do mercado foram tanto
mais altos quanto maior o porte da companhia consultada. A falta de
trabalhadores qualificados, a questão mais genérica, foi apontada como
problema importante por 81% das empresas grandes, 77% das médias e 64% das
pequenas. A média dessas respostas ficou em 74%.
A qualificação de pessoal na
própria empresa é a solução mais comum, mas também a aplicação desse remédio
está longe de resolver o problema. Alta rotatividade, pouco interesse dos
trabalhadores e baixa qualidade da educação básica foram os principais
obstáculos apontados pelas companhias consultadas. Mas o terceiro item
apontado, a educação básica deficiente, talvez seja a explicação mais provável
tanto do desinteresse dos trabalhadores como da rotatividade.
A sondagem do setor da construção
complementa com um toque especialmente dramático o cenário mostrado, há poucos
dias, na última pesquisa sobre os demais segmentos da indústria. Também neste
caso é relevante levar em conta o baixo nível de atividade do setor: mesmo com
a lenta recuperação registrada depois de um ano de retração, as empresas
continuam com problemas para preencher seus quadros.
Praticamente dois terços das
firmas (65%) indicaram dificuldades para encontrar pessoal qualificado. Desse
grupo, 81% procuram qualificar os trabalhadores na própria empresa. Mas também
neste caso a tarefa é dificultada pela falha da escola. A baixa qualidade da
educação básica foi apontada como a maior causa de dificuldade por 49% das
empresas com problemas de preenchimento de postos.
Esses dados esclarecem facilmente
um paradoxo aparente. Por que - muitas pessoas têm perguntado - as empresas têm
evitado demitir, apesar do baixo nível de atividade a partir de 2011? A
resposta é evidente. Além dos custos da demissão, os administradores levaram em
conta as dificuldades para recompor os quadros.
Durante quase dez anos a
administração petista deu prioridade à ampliação do acesso às faculdades, para
facilitar a distribuição de diplomas. Quase nenhuma atenção foi dada aos outros
níveis. A escassez de mão de obra com a formação mínima é uma das consequências
desse erro, ao lado, é claro, da perda de competitividade.
Fonte: http://www.estadao.com.br
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