'Igreja católica não tem curral eleitoral', diz CNBB

Prestes a realizar um debate entre os candidatos à Presidência da República, o evento está marcado para o próximo dia 16, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), d. Leonardo Steiner, afirma que a Igreja Católica “não tem curral eleitoral”. 

O comentário alude ao ativismo político de pastores evangélicos como Silas Malafaia e Marco Feliciano, este último deputado federal que presidiu a Comissão de Direitos Humanos da Câmara em 2013. “Toda orientação é dada para que os padres não falem dentro das igrejas sobre candidatos”, afirma.

D. Steiner diz, porém, que o fato de o País ter neste ano entre os favoritos para chegar ao Palácio do Planalto uma política evangélica que faz questão de ressaltar sua religiosidade e é apoiada por Malafaia e Feliciano, não o preocupa. 

“As instituições nunca podem deixar de dialogar, independentemente de quem seja. Independentemente da fé que essas pessoas expressam”, afirma, referindo-se à presidenciável do PSB, Marina Silva.

O secretário-geral da CNBB critica, na verdade, os políticos que se aproximam dos templos apenas em época de eleição. “Igreja não é palanque”, diz o líder católico.

O candidato a vice-presidente da Marina Silva, Beto Albuquerque, disse que “nem a política deve mandar na religião, nem a religião na política”. Como o senhor vê essas declarações?

Quando falamos de Estado laico e de o Estado cuidar da religião, estamos falando da necessidade das pessoas terem a liberdade de expressar a sua fé. Agora, as pessoas que expressam a sua fé são cidadãos. E esses cidadãos devem ser ativos na sociedade para ajudar a construir a nação brasileira. Não existe Estado sem cidadão, porque as instituições só existem enquanto existem pessoas. A grande maioria dos brasileiros são pessoas de fé. A religião tem função muito importante, na questão dos critérios, dos valores essenciais, das relações mútuas. A religião tem elementos que podem ajudar a construir a sociedade e por isso também a política.

A religião deve influenciar a política?

O exercício da política acontece com as pessoas. A fé interfere na política da pessoa, no modo de fazer a política. Se interferisse mais, provavelmente não teríamos tanta corrupção. Não teríamos alianças às vezes espúrias. Estamos esquecendo que é a pessoa que faz a política, estamos colocando como duas coisas estanques: religião e política. Só existe religião porque existem pessoas, existe política porque existem pessoas, e esse elemento de fundo não se discute. A pessoa que não tem fé expressa de maneira diferente a sua política.

Na opinião do senhor, a corrupção então está associada a uma falta de fé das pessoas?

A uma falta de valores que a religião deveria dar. É só começar a campanha eleitoral que começam a surgir alguns “milagres”, como os candidatos indo às igrejas para pedir votos, almoçando em restaurantes populares, visitando favelas. 

Isso é só marketing?

Isso, se ocorre só na eleição, não é salutar para a política. Agora, naturalmente os candidatos precisam estar presentes, se mostrar... Igreja não é palanque, mas nós sabemos que muitos candidatos têm ido a eventos, não só agora, mas em outros momentos...

O sr. comentou que a fé afeta a maneira de fazer política. A candidata do PSB, Marina Silva, por exemplo, lê a Bíblia para orientar a sua tomada de decisões. Essa é uma boa postura para um presidente da República?


É uma boa postura na medida em que (um político) não obrigue ninguém a fazer (igual). Pode ser um bom exercício, quando alimenta a grandeza da própria fé. Sem desmerecer a análise da realidade, sem deixar de levar em consideração os conflitos sociais, a questão dos direitos, dos pobres, a educação para todos.

Sem deixar de lado a racionalidade?

A racionalidade, de novo, no sentido de conseguir dar a razão, não no sentido de ser frio. A gente poderia até falar no sentido, São Pedro fala, “dar as razões da fé”, é conseguir perceber o fundo das questões.

O fato de Marina Silva ser evangélica e ter grandes chances de se eleger presidente da República não vai afetar o relacionamento entre a Igreja Católica e o Palácio do Planalto?

As instituições precisam dialogar. Como pessoas, representamos instituições. As instituições nunca podem deixar de dialogar, independentemente de quem seja. Independentemente da fé que essas pessoas expressam.

O diálogo com a Marina já existe?

Sim, como a gente tem diálogo com o Aécio (Neves), tínhamos um diálogo franco com o Eduardo Campos, como dialogamos com a presidente (Dilma Rousseff). O diálogo faz bem e principalmente porque representamos instituições que têm tarefa importante, ajudar a construir uma sociedade.

Como o sr. vê a campanha política tratar de temas como legalização de drogas, aborto e casamento civil gay? Esse é um debate enriquecedor ou serve apenas para polarizar a sociedade e dividi-la entre conservadores e progressistas?

Considero importante discutir esses temas, no sentido do cidadão saber o que os candidatos estão pensando. Seria prejudicial se, com as respostas, nós começássemos a criar determinadas imagens depreciativas, rótulos. Quando nós desejamos avaliar um candidato, nós não podemos avaliá-lo por uma proposta só, temos de avaliar pelas diversas propostas.

As declarações dos pastores Marco Feliciano e Silas Malafaia nas redes sociais sempre ganham muita repercussão. A Igreja Católica tem adotado uma postura mais discreta no debate eleitoral?

Não é tarefa nossa, nós não temos curral eleitoral. Inclusive toda orientação é dada para que os padres não falem dentro das igrejas sobre candidatos. A Igreja Católica tem posição no debate, tanto é que no dia 16 teremos debate da CNBB com os candidatos a presidente.

A CNBB é uma das maiores defensoras da reforma política. As manifestações de junho conseguiram tirar os políticos da “zona de conforto” e convencê-los da importância do tema?


Sem pressão da sociedade não acontecerá reforma política. Para a reforma política existe uma exigência muito grande: não se pode pensar em partido, é preciso ter um amor muito grande pelo Brasil. E mais: é preciso ter uma noção da grandeza da política. 



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